líria porto
olha a lagartixa
ela pula rebola espia
espicha-se
oh
que coisa horrorosa
vovó
florinha
beleza não é tudo
*
segunda-feira, 29 de dezembro de 2008
domingo, 28 de dezembro de 2008
(para o livro sem pecado não tem salvação) ilhados
líria porto
cercados de poesia
por todos os lábios
*
cercados de poesia
por todos os lábios
*
trottoir
líria porto
tanto tato
nem tocavam no assunto
enquanto eu torcia
por um tête-à-tête
entre a puta
e o santo
*
tanto tato
nem tocavam no assunto
enquanto eu torcia
por um tête-à-tête
entre a puta
e o santo
*
travessura
líria porto
amarrar numa vara uma lata ou um balde
cutucar a mangueira no quintal do vizinho
e de alma amarela pescar o caldo
*
amarrar numa vara uma lata ou um balde
cutucar a mangueira no quintal do vizinho
e de alma amarela pescar o caldo
*
sábado, 27 de dezembro de 2008
sexta-feira, 26 de dezembro de 2008
quinta-feira, 25 de dezembro de 2008
catirina
líria porto
desta fenestra
fresta funesta
a vida não presta
bom é o meio
o seio o recheio
o veio o pomo
o povo
bumba-meu-boi
*
desta fenestra
fresta funesta
a vida não presta
bom é o meio
o seio o recheio
o veio o pomo
o povo
bumba-meu-boi
*
quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
na bacia das almas
líria porto
precisa toque retoque
uma demão de vermelho
uns afetos no recheio
:
aproveitem a pechincha
liquido meu coração
(a circunstância é propícia
e também o objetivo)
*
precisa toque retoque
uma demão de vermelho
uns afetos no recheio
:
aproveitem a pechincha
liquido meu coração
(a circunstância é propícia
e também o objetivo)
*
terça-feira, 23 de dezembro de 2008
a nuvem balofa
líria porto
vivia aluada
não tinha juízo
qualquer vento fraco
jogava-a de um lado
a outro
um dia essa fofa
tão triste tão triste
chorou um bocado
e de lágrima em lágrima
chuviscou
*
vivia aluada
não tinha juízo
qualquer vento fraco
jogava-a de um lado
a outro
um dia essa fofa
tão triste tão triste
chorou um bocado
e de lágrima em lágrima
chuviscou
*
segunda-feira, 22 de dezembro de 2008
batalhas
líria porto
cada qual com suas tralhas
bagulhos silêncios barulhos
não me deixes tua cruz
já arrasto meus pedaços
minhas penas minhas plumas
meus fracassos
*
cada qual com suas tralhas
bagulhos silêncios barulhos
não me deixes tua cruz
já arrasto meus pedaços
minhas penas minhas plumas
meus fracassos
*
ajuste
líria porto
o silêncio tece o verso
então eu te peço
não fales
deixa o galo acordar
a aurora guardar as pantufas
o sol clarear e o relógio
acertar o meu tempo
*
o silêncio tece o verso
então eu te peço
não fales
deixa o galo acordar
a aurora guardar as pantufas
o sol clarear e o relógio
acertar o meu tempo
*
domingo, 21 de dezembro de 2008
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) teatral
líria porto
vestida de renda
tirana me ronda
eu não me rendo
finjo-me estátua
ela passa e desatenta
carrega outro
fim do primeiro ato
*
vestida de renda
tirana me ronda
eu não me rendo
finjo-me estátua
ela passa e desatenta
carrega outro
fim do primeiro ato
*
sábado, 20 de dezembro de 2008
sexta-feira, 19 de dezembro de 2008
chega de chuva
líria porto
o sol chega
tímido
a pedir licença
santa paciência puxa-o
:
entra senta-te
queres pouso?
*
o sol chega
tímido
a pedir licença
santa paciência puxa-o
:
entra senta-te
queres pouso?
*
quinta-feira, 18 de dezembro de 2008
solitária
líria porto
as ruas seduzem-na
a cidade a devora
lombriga dentro das tripas
à noite tem função
*
as ruas seduzem-na
a cidade a devora
lombriga dentro das tripas
à noite tem função
*
quarta-feira, 17 de dezembro de 2008
caótico
líria porto
caos caso ocaso acaso descaso
avesso inverso inverno inferno
céu
e no meio da pedra
o caminho
*
caos caso ocaso acaso descaso
avesso inverso inverno inferno
céu
e no meio da pedra
o caminho
*
insânia
líria porto
a nuvem despenca produz cada estrago
não tem quem segure essa doida
ela passa entre os dedos dos santos dos anjos
até do capeta –– nem parece a chuva pacata
que tecla os telhados no mês de novembro
*
a nuvem despenca produz cada estrago
não tem quem segure essa doida
ela passa entre os dedos dos santos dos anjos
até do capeta –– nem parece a chuva pacata
que tecla os telhados no mês de novembro
*
terça-feira, 16 de dezembro de 2008
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - reforma
líria porto
quando a lüa tinha trema
e camões lindamente a descrevia
quisera ter nascido no fonema
da extremada lüa que o estremecia
*
quando a lüa tinha trema
e camões lindamente a descrevia
quisera ter nascido no fonema
da extremada lüa que o estremecia
*
dúbia
líria porto
a poesia me salva me serve me situa me solta me supre
mas porém me sacaneia segrega sitia solapa
subjuga
*
a poesia me salva me serve me situa me solta me supre
mas porém me sacaneia segrega sitia solapa
subjuga
*
deboche
líria porto
já fui moço
corpo firme
pele lisa
nunca tão tolo
ou com firulas
:
velho sim
jamais pacóvio
*
já fui moço
corpo firme
pele lisa
nunca tão tolo
ou com firulas
:
velho sim
jamais pacóvio
*
sol d'inverno
líria porto
chega sem aviso entra sem bater
deita sobre o corpo e como um posseiro
finca bandeira
esvai-se na hora
do gozo
*
chega sem aviso entra sem bater
deita sobre o corpo e como um posseiro
finca bandeira
esvai-se na hora
do gozo
*
estampa
líria porto
a chuva lambe a terra
arrepia-a e põe flor
nos seus cabelos verdes
: que moça moderna
*
a chuva lambe a terra
arrepia-a e põe flor
nos seus cabelos verdes
: que moça moderna
*
domingo, 14 de dezembro de 2008
vadia
líria porto
de segunda a sábado veste-se de seda
no domingo fica nua
inspiro expiro suspiro transpiro espero
e – palavra – a poesia se me nega
*
de segunda a sábado veste-se de seda
no domingo fica nua
inspiro expiro suspiro transpiro espero
e – palavra – a poesia se me nega
*
às claras
líria porto
o que arde faz alarde
(embora eu me acovarde)
é a vontade de dizer-te
vem
(não tenho coragem)
*
o que arde faz alarde
(embora eu me acovarde)
é a vontade de dizer-te
vem
(não tenho coragem)
*
sábado, 13 de dezembro de 2008
arrulhos
líria porto
o vento pede a persiana fala – para para
não podes não podes não me faças cócegas
tem cuidado com as minhas lâminas
*
o vento pede a persiana fala – para para
não podes não podes não me faças cócegas
tem cuidado com as minhas lâminas
*
(para o livro sem pecado não tem salvação) a trepadeira
líria porto
cresceu
espalhou-se
pulou o muro
foi mostrar a flor
pra deus e o mundo
*
cresceu
espalhou-se
pulou o muro
foi mostrar a flor
pra deus e o mundo
*
sexta-feira, 12 de dezembro de 2008
pé de vento
líria porto
eu nem bem piscava era sexta-feira
esta que me olha eu não sei quem sou
pois criança brinco com espelho velho
:
vida apressadinha –– tu me desesperas
puxas meu tapete no melhor
da festa
*
eu nem bem piscava era sexta-feira
esta que me olha eu não sei quem sou
pois criança brinco com espelho velho
:
vida apressadinha –– tu me desesperas
puxas meu tapete no melhor
da festa
*
quinta-feira, 11 de dezembro de 2008
vento
líria porto
não vou te esquecer
só se eu tiver alzheimer
caso aconteça
ao tocares-me
sopra as cinzas
*
não vou te esquecer
só se eu tiver alzheimer
caso aconteça
ao tocares-me
sopra as cinzas
*
nu achar das amigas
líria porto
brincadeiras
cirandas
amarelinhas
lembranças
ficamos velhas
desmanchá-las
tecê-las
manchá-las
sê-las
achá-las belas
bebê-las
(as nuances)
*
brincadeiras
cirandas
amarelinhas
lembranças
ficamos velhas
desmanchá-las
tecê-las
manchá-las
sê-las
achá-las belas
bebê-las
(as nuances)
*
quarta-feira, 10 de dezembro de 2008
perda de tempo
líria porto
quem quiser ganhar no grito vai ficar rouco
tenho ouvidos moucos para apito
*
quem quiser ganhar no grito vai ficar rouco
tenho ouvidos moucos para apito
*
conquista
líria porto
alisa do lado de lá
alisa do lado de cá
arruma as penas
sacode o corpo a cabeça
abre o bico pisca
me olha
: oh
sabiá sabe de mim?
*
alisa do lado de lá
alisa do lado de cá
arruma as penas
sacode o corpo a cabeça
abre o bico pisca
me olha
: oh
sabiá sabe de mim?
*
terça-feira, 9 de dezembro de 2008
sábado, 6 de dezembro de 2008
búuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu
líria porto
rola pro outro lado
cobre a cabeça com lençol
medo medo medo
encolhe o tronco as pernas
pesadelo pesadelo pesadelo
mais parece um feto
(defuntos
puxam-lhe
o pé)
acorda sem fôlego
ufa
ufa
*
resplendor
líria porto
a floresta de estrelas que vejo do mato
em nada se compara ao deserto
da cidade
(na roça
as noites são bordadas)
a floresta de estrelas que vejo do mato
em nada se compara ao deserto
da cidade
(na roça
as noites são bordadas)
*
sexta-feira, 5 de dezembro de 2008
meio pedra meio tijolo
líria porto
mundo estúpido
vida sem sentido
olho o espelho
vejo um velho
jeito trôpego
riso cético
busco um copo
encho a cara
:
hoje tem espetáculo?
*
mundo estúpido
vida sem sentido
olho o espelho
vejo um velho
jeito trôpego
riso cético
busco um copo
encho a cara
:
hoje tem espetáculo?
*
quinta-feira, 4 de dezembro de 2008
terça-feira, 2 de dezembro de 2008
trilhos
líria porto
a
cobra
de
ferro
vai
rente
na
estrada
carrega
no
dorso
os
rolos
de
aço
a
bosta
das
vacas
o
fardo
e
o
fado
dos
o
p
e
r
á
r
i
o
s
*
a
cobra
de
ferro
vai
rente
na
estrada
carrega
no
dorso
os
rolos
de
aço
a
bosta
das
vacas
o
fardo
e
o
fado
dos
o
p
e
r
á
r
i
o
s
*
segunda-feira, 1 de dezembro de 2008
impossíveis
líria porto
palavras não cabem em mim
despetalo-as letra a letra
incinero-as - livro-me das cinzas
não das vermelhas
e das roxas
*
palavras não cabem em mim
despetalo-as letra a letra
incinero-as - livro-me das cinzas
não das vermelhas
e das roxas
*
domingo, 30 de novembro de 2008
miserável (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
sinto a sede de um rio seco
de um vinho findo
não vieste
não virás
e as uvas estão verdes
*
sinto a sede de um rio seco
de um vinho findo
não vieste
não virás
e as uvas estão verdes
*
recreio
líria porto
passarinhos e morcegos
chupam mangas
lá no alto
a festança é nas grimpas
da árvore
*
passarinhos e morcegos
chupam mangas
lá no alto
a festança é nas grimpas
da árvore
*
sábado, 29 de novembro de 2008
sexta-feira, 28 de novembro de 2008
abominável
líria porto
não correspondido
o amor é um escalpelo
: reduz o cérebro
transforma-o em troféu
*
não correspondido
o amor é um escalpelo
: reduz o cérebro
transforma-o em troféu
*
quarta-feira, 26 de novembro de 2008
terça-feira, 25 de novembro de 2008
destaque
líria porto
galeria de obras-primas
a vida abriga meus queridos
na ala principal
(no porão amontoados
os chatos de plantão
os pobres de espírito
os ingratos)
*
galeria de obras-primas
a vida abriga meus queridos
na ala principal
(no porão amontoados
os chatos de plantão
os pobres de espírito
os ingratos)
*
entre o relativo e o absoluto
líria porto
na solidão das sextas-feiras
a impressão de que o tempo se encomprida
embora a vida se nos pareça tão breve
*
na solidão das sextas-feiras
a impressão de que o tempo se encomprida
embora a vida se nos pareça tão breve
*
segunda-feira, 24 de novembro de 2008
degelo
líria porto
tem um sujeito tímido quieto circunspecto
cujo jeito arredio causa-me arrepio
vontade de fazer-lhe cócegas beijar-lhe a boca
até que o amor o desvencilhe dos limites
e fiquemos quites
(hosana nas alturas)
*
tem um sujeito tímido quieto circunspecto
cujo jeito arredio causa-me arrepio
vontade de fazer-lhe cócegas beijar-lhe a boca
até que o amor o desvencilhe dos limites
e fiquemos quites
(hosana nas alturas)
*
domingo, 23 de novembro de 2008
precipitação
líria porto
partiste tão de repente
eu te disse eu te pedi
avisasses-me com antecedência
iríamos em nave única
o cruzeiro as três marias
tu viste a lua?
aquele cometa tem rabo quente
trancei as fitas do arco-íris
(já não tenho olhos
para este mundo)
*
partiste tão de repente
eu te disse eu te pedi
avisasses-me com antecedência
iríamos em nave única
o cruzeiro as três marias
tu viste a lua?
aquele cometa tem rabo quente
trancei as fitas do arco-íris
(já não tenho olhos
para este mundo)
*
recado pra deus
líria porto
tonico morreu
tonico morreu
:
zé carlos
completamente bêbado
beijou-lhe a testa e lhe disse
vai meu irmão
o céu é perto
mas fala com o chefe
só irei lá pra cima
beijou-lhe a testa e lhe disse
vai meu irmão
o céu é perto
mas fala com o chefe
só irei lá pra cima
se houver boteco
no paraíso
*
*
imitação
líria porto
quanto mais o tempo passa
mais se parece à avó
:
a pele
as manchas os olhos
os óculos de aros grossos
os chinelos as vestes
o jeito de caminhar
a intolerância a sapatos novos
(como fora um carbono
uma cópia xerox)
*
quanto mais o tempo passa
mais se parece à avó
:
a pele
as manchas os olhos
os óculos de aros grossos
os chinelos as vestes
o jeito de caminhar
a intolerância a sapatos novos
(como fora um carbono
uma cópia xerox)
*
angu perdido
líria porto
meu soneto é capenga e obsoleto
minhas rimas óbvias como minhas primas
minhas trovas são a prova de que nenhum poema
nenhum verso poderá salvar-me
*
meu soneto é capenga e obsoleto
minhas rimas óbvias como minhas primas
minhas trovas são a prova de que nenhum poema
nenhum verso poderá salvar-me
*
sexta-feira, 21 de novembro de 2008
olhos d'água
líria porto
implorei ao mandachuva
tivesse dó do sertão
por lá tecesse umas nuvens
não de inundação dilúvio
um chuvisqueiro molenga
que perdurasse algum tempo
preenchesse o nosso açude
amansasse-nos a sede
engordasse o nosso gado
salvasse o feijão
o milho
o azul não demudou
o sol continua a pino
a chão racha esfarinha-se
permaneço de joelhos
a insistir na ladainha
:
se este céu não tiver senso
não acudir quem precisa
será desleixo desdém
pelos bichos pelas gentes
destas terras desvalidas
*
implorei ao mandachuva
tivesse dó do sertão
por lá tecesse umas nuvens
não de inundação dilúvio
um chuvisqueiro molenga
que perdurasse algum tempo
preenchesse o nosso açude
amansasse-nos a sede
engordasse o nosso gado
salvasse o feijão
o milho
o azul não demudou
o sol continua a pino
a chão racha esfarinha-se
permaneço de joelhos
a insistir na ladainha
:
se este céu não tiver senso
não acudir quem precisa
será desleixo desdém
pelos bichos pelas gentes
destas terras desvalidas
*
quarta-feira, 19 de novembro de 2008
forasteiro
líria porto
entrar e sair - tão fácil
se lá dentro não existir
um olhar de azeviche
que sem precisar suplique
: fica
*
entrar e sair - tão fácil
se lá dentro não existir
um olhar de azeviche
que sem precisar suplique
: fica
*
terça-feira, 18 de novembro de 2008
moe(n)da
líria porto
(es)colhe teu destino
o tempo se (es)coa
(a vida não perdoa
quem se omite)
cara ou coroa?
*
(es)colhe teu destino
o tempo se (es)coa
(a vida não perdoa
quem se omite)
cara ou coroa?
*
entardece
líria porto
à volta da mesa
oito cadeiras
sirvo-me de ausências
e sopa de feijão
quem sabe amanhã?
*
à volta da mesa
oito cadeiras
sirvo-me de ausências
e sopa de feijão
quem sabe amanhã?
*
pia batismal
líria porto
não sei se posso
faço-o sem permissão
por um verso laço letra
qualquer palavra
se ela tiver asas
caço-a numa rede
chamo-a borboleta
e só
*
não sei se posso
faço-o sem permissão
por um verso laço letra
qualquer palavra
se ela tiver asas
caço-a numa rede
chamo-a borboleta
e só
*
segunda-feira, 17 de novembro de 2008
(publicado no livro garimpo - editora lê) - incondicional
líria porto
não me queiras bem ou mal por uma pétala
por um gesto a mais ou um deslize
quere-me pelo todo – corola miolo haste
folhas
espinhos cor pólen perfume
raízes
*
não me queiras bem ou mal por uma pétala
por um gesto a mais ou um deslize
quere-me pelo todo – corola miolo haste
folhas
espinhos cor pólen perfume
raízes
*
sem pantufas
líria porto
arredou nuvem e trovão
a chuva puxou pro lado
enxugou todo o azul
fez manhã de salto alto
*
arredou nuvem e trovão
a chuva puxou pro lado
enxugou todo o azul
fez manhã de salto alto
*
decepção
líria porto
desembaraçar nós destrinçar-nos fio a fio
é descobrir na verdade um amontoado
de mentiras
*
desembaraçar nós destrinçar-nos fio a fio
é descobrir na verdade um amontoado
de mentiras
*
domingo, 16 de novembro de 2008
vaticínio
líria porto
divagar
vestir os vestígios da alvorada
desvendar vértices voragens
vertigens
voar é vocação
*
divagar
vestir os vestígios da alvorada
desvendar vértices voragens
vertigens
voar é vocação
*
sábado, 15 de novembro de 2008
depois da tempestade
líria porto
minha mãe a grande árvore
guardou-me entre folhagens
protegeu-me do mau tempo
cresci dentro dum invólucro
sem conhecer chuva e vento
um dia caiu um raio
derrubou folhas e galhos
abalou tronco e raiz
ainda assim me agarrei
à sombra imaginária
de mamãe herdei o verde
tatuado no espírito
*
minha mãe a grande árvore
guardou-me entre folhagens
protegeu-me do mau tempo
cresci dentro dum invólucro
sem conhecer chuva e vento
um dia caiu um raio
derrubou folhas e galhos
abalou tronco e raiz
ainda assim me agarrei
à sombra imaginária
de mamãe herdei o verde
tatuado no espírito
*
desmedida
líria porto
arrombo as molduras
as retas os planos
desprezo os quadrados
prefiro as montanhas
os morros os gordos
os triângulos
*
arrombo as molduras
as retas os planos
desprezo os quadrados
prefiro as montanhas
os morros os gordos
os triângulos
*
natimorto
líria porto
o único filho
morreu enforcado
nas cordas do corpo
que homem seria
feliz infeliz
não tenho respostas
o filho varão
talvez preferisse
ser uma menina
(e fosse quem fosse
de todas as formas
seria minha cria)
*
o único filho
morreu enforcado
nas cordas do corpo
que homem seria
feliz infeliz
não tenho respostas
o filho varão
talvez preferisse
ser uma menina
(e fosse quem fosse
de todas as formas
seria minha cria)
*
sexta-feira, 14 de novembro de 2008
binò^óculos
líria porto
a insana
tir'água do joelho
espirra nos artelhos
enxuga c'os pentelhos
a bund'alvíssima
(tua'alma me pertence
caíste n'armadilha
já vi um cu.rioso
d'olho triste)
*
a insana
tir'água do joelho
espirra nos artelhos
enxuga c'os pentelhos
a bund'alvíssima
(tua'alma me pertence
caíste n'armadilha
já vi um cu.rioso
d'olho triste)
*
quinta-feira, 13 de novembro de 2008
onde cantam os bem-te-vis (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
esta terra tem um cheiro
beiro a serra sinto um bem
um ardor me atravessa
um prazer um arrepio
um desalojar das penas
um desejo singular
de morrer neste lugar
e de aqui renascer
*
meninice
líria porto
as mangas amadurecem
meus olhos não descem das galhas
o cheiro se espalha pelas lembranças
(e se eu pulasse o muro?)
*
as mangas amadurecem
meus olhos não descem das galhas
o cheiro se espalha pelas lembranças
(e se eu pulasse o muro?)
*
quarta-feira, 12 de novembro de 2008
repeteco
líria porto
a cabeça ferve
igual caldeirão
intenções
pensamentos
ideias
versos reversos
conversas
repetição
*
a cabeça ferve
igual caldeirão
intenções
pensamentos
ideias
versos reversos
conversas
repetição
*
terça-feira, 11 de novembro de 2008
pôr de solas
líria porto
a loucura dos olhos abertos
o tempo a pesar-nos as pernas
o verso apesar dos invernos
a boca amarga o chá de ervas
(se a película é tão fina
quanto bolha de sabão
por que tocá-la?)
devia haver um decreto
deixem quieto o poeta
é lindo viver
de brisa
*
a loucura dos olhos abertos
o tempo a pesar-nos as pernas
o verso apesar dos invernos
a boca amarga o chá de ervas
(se a película é tão fina
quanto bolha de sabão
por que tocá-la?)
devia haver um decreto
deixem quieto o poeta
é lindo viver
de brisa
*
boca a boca
líria porto
quando meu amor falou tenho carunchos no pulmão
não consegui nem chorar
meu peito doeu meu coração doeu minha alma doeu
e só pude dizer –– não há de ser nada
respiro por nós
*
quando meu amor falou tenho carunchos no pulmão
não consegui nem chorar
meu peito doeu meu coração doeu minha alma doeu
e só pude dizer –– não há de ser nada
respiro por nós
*
eureca
líria porto
perdeu-se o sono entre as trevas
a noite dura mil anos – não sei pedir
nem rezar
vigio o escuro
sua cara sem cabimento
sequer um sonho
ou um susto
acendo um verso
invento uma estrela
*
perdeu-se o sono entre as trevas
a noite dura mil anos – não sei pedir
nem rezar
vigio o escuro
sua cara sem cabimento
sequer um sonho
ou um susto
acendo um verso
invento uma estrela
*
contradições
líria porto
para (en)cobrir seus (esc)ombros
precisou tecer mil xales
(o corpo do pobre jazia no esquife
envolto por flores cercado de olhares
tão liso tranquilo tal qual pedra
mármore)
às vezes a morte
é mais generosa
que a vítima
*
para (en)cobrir seus (esc)ombros
precisou tecer mil xales
(o corpo do pobre jazia no esquife
envolto por flores cercado de olhares
tão liso tranquilo tal qual pedra
mármore)
às vezes a morte
é mais generosa
que a vítima
*
roda-viva
líria porto
a rotina – pata de elefante – amassa-nos a alma
precisamos sair do casulo buscar a cor
das nossas asas
quando a lida me tortura tem a dureza do jugo
cato alegria no bolso
a roda do mundo gira e nada fica parado
passam o sol o vento a chuva
a lua o rio a estrada
eu era moço outro dia
fiquei velho num piscar
:
danças comigo?
*
a rotina – pata de elefante – amassa-nos a alma
precisamos sair do casulo buscar a cor
das nossas asas
quando a lida me tortura tem a dureza do jugo
cato alegria no bolso
a roda do mundo gira e nada fica parado
passam o sol o vento a chuva
a lua o rio a estrada
eu era moço outro dia
fiquei velho num piscar
:
danças comigo?
*
indigência
líria porto
abstrato prato
maltrato concreto
a fome não tem muro
casebre quatro por quatro
tapera de pau a pique –– pobreza
a mostrar a cara
miséria em riste
*
abstrato prato
maltrato concreto
a fome não tem muro
casebre quatro por quatro
tapera de pau a pique –– pobreza
a mostrar a cara
miséria em riste
*
(para o livro sem pecado não tem salvação) pragmatismo
líria porto
eu te uso
tu me usas
não é abuso
é no máximo
o mínimo recurso
dos solitários
*
eu te uso
tu me usas
não é abuso
é no máximo
o mínimo recurso
dos solitários
*
franqueza
líria porto
coçou-se-me a ponta da língua
cuspi depressa a saliva
a dor foi junto aprendi
toda palavra engasgada
precisa encontrar destino
ou vira tumor maligno
*
coçou-se-me a ponta da língua
cuspi depressa a saliva
a dor foi junto aprendi
toda palavra engasgada
precisa encontrar destino
ou vira tumor maligno
*
(publicado no livro garimpo - editora lê) - espinhos
líria porto
vermelhas gritam
brancas se calam
amarelas omitem-se
não há rosa inofensiva
*
vermelhas gritam
brancas se calam
amarelas omitem-se
não há rosa inofensiva
*
recesso
líria porto
manhã cinzenta
vidinha mole
rimas me espetam
versos me bolem
fico na cama
olhos fechados
a chuva bate
molha o molhado
:
feriado prolongado
manhã cinzenta
vidinha mole
rimas me espetam
versos me bolem
fico na cama
olhos fechados
a chuva bate
molha o molhado
:
feriado prolongado
*
timidez
líria porto
tô fraco tô fraco tô fraco
bicho aflito
dispara do mato pro pasto
para o quintal
tô fraco tô fraco tô fraco
o corpo cinzento pintado de branco
corre dum lado pra outro
pra cima pra baixo
sem direção
tô fraco tô fraco tô fraco
galinha d’angola que graça
bota ovo no buraco
tô fraco tô fraco
tô forte?
*
tô fraco tô fraco tô fraco
bicho aflito
dispara do mato pro pasto
para o quintal
tô fraco tô fraco tô fraco
o corpo cinzento pintado de branco
corre dum lado pra outro
pra cima pra baixo
sem direção
tô fraco tô fraco tô fraco
galinha d’angola que graça
bota ovo no buraco
tô fraco tô fraco
tô forte?
*
de floração (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
apraz-me olhar as árvores
a calma com que se movimentam
parecem-se a mulheres grávidas
no aguardo do rebento
*
apraz-me olhar as árvores
a calma com que se movimentam
parecem-se a mulheres grávidas
no aguardo do rebento
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - desbandeirada
líria porto
vou-me embora pro horizonte
lá sou amigo do infante
aquele que adiante
depois da ponte da fonte
busca a nascente o poente
vou-me embora pro horizonte
não me pergunte o quadrante
nem me peça que o aponte
vou-me embora pro horizonte
(lá onde o sol alua)
*
vou-me embora pro horizonte
lá sou amigo do infante
aquele que adiante
depois da ponte da fonte
busca a nascente o poente
vou-me embora pro horizonte
não me pergunte o quadrante
nem me peça que o aponte
vou-me embora pro horizonte
(lá onde o sol alua)
*
segunda-feira, 10 de novembro de 2008
pôr de lua
líria porto
estou naquela fase
cheia de resumo
foge-me o verso
a rima escapole-me
peço a são jorge
lave-me leve-me
love me
*
estou naquela fase
cheia de resumo
foge-me o verso
a rima escapole-me
peço a são jorge
lave-me leve-me
love me
*
domingo, 9 de novembro de 2008
na mesma moenda
líria porto
encontros diários
ficaram semanais
mensais
e eu que era a outra
sei que há outra
mente para ela
para mim
ela acredita
eu finjo
(e vou dar-lhe o troco)
encontros diários
ficaram semanais
mensais
e eu que era a outra
sei que há outra
mente para ela
para mim
ela acredita
eu finjo
(e vou dar-lhe o troco)
*
sexta-feira, 7 de novembro de 2008
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) dentuça
líria porto
durante a tua ausência
deitei-me do outro lado
dormi de rosto colado
com a tua fronha
a saudade é uma doninha
a saudade é uma toupeira
ela rói dentro e fora
rói os ossos rói o peito
o corpo os sentimentos
a saudade rói os sonhos
e mostra os dentes
*
durante a tua ausência
deitei-me do outro lado
dormi de rosto colado
com a tua fronha
a saudade é uma doninha
a saudade é uma toupeira
ela rói dentro e fora
rói os ossos rói o peito
o corpo os sentimentos
a saudade rói os sonhos
e mostra os dentes
*
um mapa para vítor
líria porto
se vieres à tarde
à tua frente terás o pôr-do-sol
à esquerda mangas prestes a madurar
à direita uma parede
eu no corre_dor
(as grades ficarão para trás)
dormirás
em berço
de almo/fadas
*
se vieres à tarde
à tua frente terás o pôr-do-sol
à esquerda mangas prestes a madurar
à direita uma parede
eu no corre_dor
(as grades ficarão para trás)
dormirás
em berço
de almo/fadas
*
suflair
líria porto
ao cozer em fogo brando
certas letrinhas minúsculas
tomou-me espécie de encanto
recheá-las com borbulhas
deixá-las leves macias
iguais suspiros de açúcar
daqueles que em nossa língua
transformam-se em gostosuras
levam-nos a flutuar
em carruagens de espuma
*
ao cozer em fogo brando
certas letrinhas minúsculas
tomou-me espécie de encanto
recheá-las com borbulhas
deixá-las leves macias
iguais suspiros de açúcar
daqueles que em nossa língua
transformam-se em gostosuras
levam-nos a flutuar
em carruagens de espuma
*
anarquista
líria porto
fico a olhar a moça recolher o lixo
ajuntar o cisco com vassoura e pá
vem depois o vento está tudo limpo
espalhar as folhas bagunçar o pátio
*
fico a olhar a moça recolher o lixo
ajuntar o cisco com vassoura e pá
vem depois o vento está tudo limpo
espalhar as folhas bagunçar o pátio
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - sumidouro
líria porto
foi-se o sol
levou meu xale de lã
igual a canoa
o sonho resvala
para as águas turvas
do inconsciente
os medos as dúvidas
tudo vem à tona
depois se dissipa
dentro da sombra
*
foi-se o sol
levou meu xale de lã
igual a canoa
o sonho resvala
para as águas turvas
do inconsciente
os medos as dúvidas
tudo vem à tona
depois se dissipa
dentro da sombra
*
quinta-feira, 6 de novembro de 2008
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) cheiro verde
líria porto
em nossa casa
quando nascia menino
vovó – cozinheira de mão cheia
fazia durante o resguardo
sopa de galinha com farinha de milho
muita salsa e cebolinha
meu pai engolia o quarto
quinto sexto sétimo oitavo
nono filho
às colheradas
depois dizia
sou rico
*
em nossa casa
quando nascia menino
vovó – cozinheira de mão cheia
fazia durante o resguardo
sopa de galinha com farinha de milho
muita salsa e cebolinha
meu pai engolia o quarto
quinto sexto sétimo oitavo
nono filho
às colheradas
depois dizia
sou rico
*
quarta-feira, 5 de novembro de 2008
terça-feira, 4 de novembro de 2008
exagero
líria porto
qui-lo
pintou-se-me então um grilo
: se este for como o outro
e eu cometer a estultice
a sandice a imprudência
de elevá-lo ao altíssimo?
*
qui-lo
pintou-se-me então um grilo
: se este for como o outro
e eu cometer a estultice
a sandice a imprudência
de elevá-lo ao altíssimo?
*
crepúsculo
líria porto
um sino corta a pracinha
hora do ângelus
naquela conversa mole
de céu de mar de azul
enquanto o sol extrapola
bebe cerveja no bar
a lua fica lá fora
a caminhar pela areia
com sua saia de roda
e sandália rasteira
*
um sino corta a pracinha
hora do ângelus
naquela conversa mole
de céu de mar de azul
enquanto o sol extrapola
bebe cerveja no bar
a lua fica lá fora
a caminhar pela areia
com sua saia de roda
e sandália rasteira
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) retorno
líria porto
chegar de viagem
entrar sem vacilo pela porta da frente
deitar a bagagem na sala
percorrer a casa
cômodo por cômodo
de canto a canto
e concluir
aqui é o paraíso
*
chegar de viagem
entrar sem vacilo pela porta da frente
deitar a bagagem na sala
percorrer a casa
cômodo por cômodo
de canto a canto
e concluir
aqui é o paraíso
*
segunda-feira, 3 de novembro de 2008
vigia
líria porto
enquanto dormem
fico eu alerta
quando despertam
voo pra cama
e sem um toque
nenhum fonema
vidas se escorrem
(s)em segurança
(merde)
*
enquanto dormem
fico eu alerta
quando despertam
voo pra cama
e sem um toque
nenhum fonema
vidas se escorrem
(s)em segurança
(merde)
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - perdição
líria porto
não sei o que fazer
em noites como esta
estou à flor da pétala
é essa lua portenha
a infiltrar-se nas brenhas
eu finjo não a desejo
invento sono bocejo
ela me roça
entrego-me
*
não sei o que fazer
em noites como esta
estou à flor da pétala
é essa lua portenha
a infiltrar-se nas brenhas
eu finjo não a desejo
invento sono bocejo
ela me roça
entrego-me
*
domingo, 2 de novembro de 2008
promessa
líria porto
juro pela língua que esta língua há de lamber
pelo cale-se do vinho cuja cor reduz-me o verso
pelos cravos e espinhos arrancados destas pétalas
pelos passos que caminham nestes caminhos de pedra
hei de me entoar poeta
*
juro pela língua que esta língua há de lamber
pelo cale-se do vinho cuja cor reduz-me o verso
pelos cravos e espinhos arrancados destas pétalas
pelos passos que caminham nestes caminhos de pedra
hei de me entoar poeta
*
sábado, 1 de novembro de 2008
cantoria
líria porto
enquanto o velho poeta
em seu cansaço abissal
arrisca um verso abstrato
a poesia concreta-se
no bico do pássaro
*
enquanto o velho poeta
em seu cansaço abissal
arrisca um verso abstrato
a poesia concreta-se
no bico do pássaro
*
fora do trilho
líria porto
trombada de nuvem dá cada estrondo
pior que trombada de trem
tem gente que afirma
nuvem é vapor
: eu não acredito
*
trombada de nuvem dá cada estrondo
pior que trombada de trem
tem gente que afirma
nuvem é vapor
: eu não acredito
*
sexta-feira, 31 de outubro de 2008
manivela
líria porto
olhos vagos passos trôpegos
dedos trêmulos
quis voltar atrás
estrada sem retorno
caminho percorrido
foz de rio
*
olhos vagos passos trôpegos
dedos trêmulos
quis voltar atrás
estrada sem retorno
caminho percorrido
foz de rio
*
quinta-feira, 30 de outubro de 2008
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) filosofia
líria porto
frida foi à feira à fábrica à farmácia
enfrentou fila
fartou-se de feijão farofa frango frito
anfetamina fenilefrina fenilanina
frustrou-se
ficou frágil e infeliz
falei-lhe –– frida faz-me o favor
afrouxa a face flauteia flui
afirma-te
viver é outra coisa
*
frida foi à feira à fábrica à farmácia
enfrentou fila
fartou-se de feijão farofa frango frito
anfetamina fenilefrina fenilanina
frustrou-se
ficou frágil e infeliz
falei-lhe –– frida faz-me o favor
afrouxa a face flauteia flui
afirma-te
viver é outra coisa
*
quarta-feira, 29 de outubro de 2008
oxalá
líria porto
nuv'encorpada
igual uma barca
vagueia no ar
o bafo de fogo
mormaço quentura
quem atura?
ô mandachuva
manda brasa
manda água
água
á
g
u
a
*
nuv'encorpada
igual uma barca
vagueia no ar
o bafo de fogo
mormaço quentura
quem atura?
ô mandachuva
manda brasa
manda água
água
á
g
u
a
*
sexta-feira, 24 de outubro de 2008
culpa
líria porto
aquela mulher miserável
a remexer o lixo
fez-me sentir vergonha
do nosso estilo
de vítima
*
aquela mulher miserável
a remexer o lixo
fez-me sentir vergonha
do nosso estilo
de vítima
*
quinta-feira, 23 de outubro de 2008
escaravelho
líria porto
anda a vida por aqui a passos largos
não consigo alcançar as próprias pernas
em tempo tão curto paguei muito caro
finaram-se cinco sextos da minha espécie
*
anda a vida por aqui a passos largos
não consigo alcançar as próprias pernas
em tempo tão curto paguei muito caro
finaram-se cinco sextos da minha espécie
*
recesso
líria porto
comer dormir e sonhar
usar chinelo de pano
roupa larga leque de abano
rir da morte das desgraças
andar de cara lavada
deixar que a vida te faça
afagos de vez em quando
*
comer dormir e sonhar
usar chinelo de pano
roupa larga leque de abano
rir da morte das desgraças
andar de cara lavada
deixar que a vida te faça
afagos de vez em quando
*
sobrevivente
líria porto
levei um tiro
entrou no ouvido
foi por um triz
bebi veneno
agora quero
dropes de anis
eu sou não muito
um quase tanto
porém feliz
a missa é omissa
mas meu pecado
é só preguiça
chega domingo
voo ao mercado
pinga e linguiça
ao fim the end
au revoir c'est fini
(tanto faz dar na cabeça
quanto na cabeça dar)
*
levei um tiro
entrou no ouvido
foi por um triz
bebi veneno
agora quero
dropes de anis
eu sou não muito
um quase tanto
porém feliz
a missa é omissa
mas meu pecado
é só preguiça
chega domingo
voo ao mercado
pinga e linguiça
ao fim the end
au revoir c'est fini
(tanto faz dar na cabeça
quanto na cabeça dar)
*
contorno
líria porto
seus braços
a exata medida
do meu manequim
:
não sobra nem falta
um milímetro
*
seus braços
a exata medida
do meu manequim
:
não sobra nem falta
um milímetro
*
a poesia
líria porto
acaricio-a
ela finge me querer
mas dorme com uns
com outras
:
puta com cara
de santa
*
acaricio-a
ela finge me querer
mas dorme com uns
com outras
:
puta com cara
de santa
*
quarta-feira, 22 de outubro de 2008
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - altar
líria porto
tal como o padre ergue a hóstia entre os dedos
o sol se levanta atrás da montanha
e consagra a manhã
*
tal como o padre ergue a hóstia entre os dedos
o sol se levanta atrás da montanha
e consagra a manhã
*
preocupação
líria porto
persigo um cisco preto
não sei se ponto ou se letra
fecho o olho ele aparece
abr'olho ele se esguelha
ninguém dorme sossegado
com a pulga atrás d'orelha
*
persigo um cisco preto
não sei se ponto ou se letra
fecho o olho ele aparece
abr'olho ele se esguelha
ninguém dorme sossegado
com a pulga atrás d'orelha
*
arrepio de morte
líria porto
afastou-se de mim
afastei-me dele
e aquela história de pele
foi para o espaço
sorte nefasta que afasta de nós
o prazer
*
afastou-se de mim
afastei-me dele
e aquela história de pele
foi para o espaço
sorte nefasta que afasta de nós
o prazer
*
segunda-feira, 20 de outubro de 2008
divisão de tarefas
líria porto
amor
limpa por favor a geladeira
não me sobrou um queijinho
cerveja laranja pudim tomate
ou pedaço de pizza
*
amor
limpa por favor a geladeira
não me sobrou um queijinho
cerveja laranja pudim tomate
ou pedaço de pizza
*
domingo, 19 de outubro de 2008
viúva negra
líria porto
a aranha ruiva
contrasta com luto
combina com lágrima
atiça os marmanjos
remexe com_padre
*
a aranha ruiva
contrasta com luto
combina com lágrima
atiça os marmanjos
remexe com_padre
*
rede
líria porto
(versos para lui)
o corpo balança ao sabor do vento
apascento as tristezas as preocupações
durmo ao relento releio drummond
(o sonho passeia
na praia de santos)
*
(versos para lui)
o corpo balança ao sabor do vento
apascento as tristezas as preocupações
durmo ao relento releio drummond
(o sonho passeia
na praia de santos)
*
sábado, 18 de outubro de 2008
ai meu pai
líria porto
(para fátima queiroz)
na pedra
dentro da sua couraça
a dor mais antiga da terra
a dor de existir
no rio
a pedra deitada em seu leito
chora e soluça calada
é dor resistir
*
(para fátima queiroz)
na pedra
dentro da sua couraça
a dor mais antiga da terra
a dor de existir
no rio
a pedra deitada em seu leito
chora e soluça calada
é dor resistir
*
terça-feira, 14 de outubro de 2008
domingo, 12 de outubro de 2008
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) estupefata
líria porto
traíste-me partiste parti-me
puta que pariu fiquei tão triste
devia ter ficado indignada
*
traíste-me partiste parti-me
puta que pariu fiquei tão triste
devia ter ficado indignada
*
sábado, 11 de outubro de 2008
(peguei o sol no pulo) surto
líria porto
a mim não me importa
se o verso é curto se a rima é torta
se a morte furta o calor do corpo
o sangue o suor
prossigo absorto a tirar da aorta
o ardor a força e persigo a sorte
por sentir que a vida tem norte
e tem cor
a mim não me importa
se o verso é curto se a rima é torta
se a morte furta o calor do corpo
o sangue o suor
prossigo absorto a tirar da aorta
o ardor a força e persigo a sorte
por sentir que a vida tem norte
e tem cor
*
traição
líria porto
a ferida jorra
chaga aberta em minhas costas
suja o chão de vinho
bebo o sangue do barril
à pura que te pariu
*
a ferida jorra
chaga aberta em minhas costas
suja o chão de vinho
bebo o sangue do barril
à pura que te pariu
*
quarta-feira, 8 de outubro de 2008
(peguei o sol no pulo) bisturi
líria porto
poeta
nau frágil
mar de emoção
navegar é preciosismo
escrever é precisão
*
poeta
nau frágil
mar de emoção
navegar é preciosismo
escrever é precisão
*
terça-feira, 7 de outubro de 2008
rouquidão
líria porto
se a pena emudecer
quero um bico um gorjeio um assobio
um rio pra rimar remar mudar de rumo
um amor roma romã
avessos e direitos
*
se a pena emudecer
quero um bico um gorjeio um assobio
um rio pra rimar remar mudar de rumo
um amor roma romã
avessos e direitos
*
segunda-feira, 6 de outubro de 2008
fumaça
líria porto
queimou-se como vel(h)a
perdeu cera forma pavio
a c(h)ama ficou pouca
e agora
na penumbra
não deslumbra
nem son(h)a
fuma
*
queimou-se como vel(h)a
perdeu cera forma pavio
a c(h)ama ficou pouca
e agora
na penumbra
não deslumbra
nem son(h)a
fuma
*
domingo, 5 de outubro de 2008
sexta-feira, 3 de outubro de 2008
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - botequim
líria porto
na quina da rua
a tonta da lua
fazia ponto
igual uma puta
naquela disputa
de homens
*
na quina da rua
a tonta da lua
fazia ponto
igual uma puta
naquela disputa
de homens
*
quinta-feira, 2 de outubro de 2008
segunda-feira, 29 de setembro de 2008
pressa
líria porto
o uivo do vento
assim sem palavras
parece o lamento
do homem que corre
e sente que a vida
esvai-se
*
o uivo do vento
assim sem palavras
parece o lamento
do homem que corre
e sente que a vida
esvai-se
*
sexta-feira, 26 de setembro de 2008
indiferença
líria porto
da porta pra fora a doçura da cana
da porta pra dentro a secura
do canavial
*
da porta pra fora a doçura da cana
da porta pra dentro a secura
do canavial
*
poema para zita
líria porto
noites e noites sozinha
mas não abre mão da pensão
alimentícia
a lua depende do sol
*
noites e noites sozinha
mas não abre mão da pensão
alimentícia
a lua depende do sol
*
quinta-feira, 25 de setembro de 2008
quarta-feira, 24 de setembro de 2008
(para o livro sem pecado não tem salvação) stop
líria porto
da missa não sabes a metade
nenhum quarto
vemo-nos por aí
e nunca mais nus
*
da missa não sabes a metade
nenhum quarto
vemo-nos por aí
e nunca mais nus
*
terça-feira, 23 de setembro de 2008
cortes
líria porto
andarilho sobre versos
dilacero os pés
firo-me em cacos de vírgulas
sangro-me sobre as rimas
perco a seiva
*
andarilho sobre versos
dilacero os pés
firo-me em cacos de vírgulas
sangro-me sobre as rimas
perco a seiva
*
segunda-feira, 22 de setembro de 2008
estações
líria porto
terno e bengala
o inverno fechou as pálpebras
prima_vera acordou ranzinza
e o céu se cobriu
terno e bengala
o inverno fechou as pálpebras
prima_vera acordou ranzinza
e o céu se cobriu
de cinza
*
*
quinta-feira, 18 de setembro de 2008
quarta-feira, 17 de setembro de 2008
avoada
líria porto
pentear-me para quê
se pentes não ordenam pensamentos
se nada está quieto
fora ou dentro
*
pentear-me para quê
se pentes não ordenam pensamentos
se nada está quieto
fora ou dentro
*
asas abertas
líria porto
a paz que eu quero
não é a paz das pombas brancas
nem dos cemitérios
a paz que preciso
é a das crianças negras pardas índias amarelas
felizes como todas as crianças
a paz que necessito é de oportunidades
não de balelas
*
a paz que eu quero
não é a paz das pombas brancas
nem dos cemitérios
a paz que preciso
é a das crianças negras pardas índias amarelas
felizes como todas as crianças
a paz que necessito é de oportunidades
não de balelas
*
domingo, 14 de setembro de 2008
adiante
líria porto
parto sem dor sem contração
levo no colo o amor franzino
o ectoplasma do natimorto
não quero flores a dor é minha
vou carregá-la como troféu
deixo-te só – salgo as feridas
rasgo as mentiras
a_deus
*
parto sem dor sem contração
levo no colo o amor franzino
o ectoplasma do natimorto
não quero flores a dor é minha
vou carregá-la como troféu
deixo-te só – salgo as feridas
rasgo as mentiras
a_deus
*
sexta-feira, 12 de setembro de 2008
rio das velhas
líria porto
há muito deixou a nascente
atravessou campos lonjuras
aproxima-se da foz
já não teme desaguar
teve medo nas montanhas
saltava-as trêmulo
segue seu curso
mistura-se ao são francisco
que o levará ao mar
(ao merecido descanso)
há muito deixou a nascente
atravessou campos lonjuras
aproxima-se da foz
já não teme desaguar
teve medo nas montanhas
saltava-as trêmulo
segue seu curso
mistura-se ao são francisco
que o levará ao mar
(ao merecido descanso)
*
quinta-feira, 11 de setembro de 2008
agressividade
líria porto
prendeu o amor entre os medos
sentiu o sangue ferver
amor é fogo e preso
estoura bolhas nos gestos
*
prendeu o amor entre os medos
sentiu o sangue ferver
amor é fogo e preso
estoura bolhas nos gestos
*
lixo atômico
líria porto
se a lua cair do céu
além dos cacos quebrados
aonde vamos guardar
olhares enamorados?
e se as estrelas em greve
não quiserem mais piscar
será que vais resistir
voltaremos a brincar?
se o sol apagar o facho
e tornar-se um astro frio
eu vou aguentar viver
como vel(h)a sem pavio?
se a terra onde moramos
depois da judiação
quiser se vingar dos homens
nós mulheres – escapamos?
sei não
*
se a lua cair do céu
além dos cacos quebrados
aonde vamos guardar
olhares enamorados?
e se as estrelas em greve
não quiserem mais piscar
será que vais resistir
voltaremos a brincar?
se o sol apagar o facho
e tornar-se um astro frio
eu vou aguentar viver
como vel(h)a sem pavio?
se a terra onde moramos
depois da judiação
quiser se vingar dos homens
nós mulheres – escapamos?
sei não
*
terça-feira, 9 de setembro de 2008
escotilha virada para o (a)mar
líria porto
a vida
jogo de carta de_mar_cada
deu-me zape sete-copas
espadilha
quatro ases de ouro
(minhas filhas)
e ainda me deu em poesia
o poder de blefar
*
a vida
jogo de carta de_mar_cada
deu-me zape sete-copas
espadilha
quatro ases de ouro
(minhas filhas)
e ainda me deu em poesia
o poder de blefar
*
segunda-feira, 8 de setembro de 2008
em_barco
líria porto
o rio é que anda
faz curvas na mata
cócegas na pedra
alarga as beiradas
afasta obstáculos
serve-me de estrada
e me lava os pecados
*
o rio é que anda
faz curvas na mata
cócegas na pedra
alarga as beiradas
afasta obstáculos
serve-me de estrada
e me lava os pecados
*
nos braços de morfeu
líria porto
o bom desta cama
além do macio
é sentir nosso corpo
canoa no rio
deslizar pelo sono
margeado de sonhos
em calmaria
*
o bom desta cama
além do macio
é sentir nosso corpo
canoa no rio
deslizar pelo sono
margeado de sonhos
em calmaria
*
domingo, 7 de setembro de 2008
sábado, 6 de setembro de 2008
chibatadas
líria porto
rastejo atrás das palavras
maltratam-me dos donos da pena
os que condenam a língua portuguesa
aos salões dos palácios
e da academia
*
rastejo atrás das palavras
maltratam-me dos donos da pena
os que condenam a língua portuguesa
aos salões dos palácios
e da academia
*
sexta-feira, 5 de setembro de 2008
margens
líria porto
a infância
água à procura de leito
tanto pode se tornar
rio a caminho do mar
quanto brejo
lamaceira
*
a infância
água à procura de leito
tanto pode se tornar
rio a caminho do mar
quanto brejo
lamaceira
*
quinta-feira, 4 de setembro de 2008
papel
líria porto
poetas têm língua bipartida
veneno chocalho rastejo
silvo
(areias movediças
tragam a nossa alma)
*
poetas têm língua bipartida
veneno chocalho rastejo
silvo
(areias movediças
tragam a nossa alma)
*
quarta-feira, 3 de setembro de 2008
esfinges
líria porto
olho o homem bigodudo a mulher de cara séria
a menina de veludo o velhinho irrequieto
cada cabeça é um mundo
:
o pensamento
um mistério
*
olho o homem bigodudo a mulher de cara séria
a menina de veludo o velhinho irrequieto
cada cabeça é um mundo
:
o pensamento
um mistério
*
rima ruim
líria porto
acende um pito no outro
não esconde a agonia
o filho que vai nascer
da pança da conceição
vai achar um mundo roto
o pai sem teto sem trampo
a mãe sem registro civil
:
sina de verme e lombriga
pior que vida de cão
*
acende um pito no outro
não esconde a agonia
o filho que vai nascer
da pança da conceição
vai achar um mundo roto
o pai sem teto sem trampo
a mãe sem registro civil
:
sina de verme e lombriga
pior que vida de cão
*
domingo, 31 de agosto de 2008
revisão
líria porto
eu me livre da inútil exposição
cale a minha boca baixe o meu facho
resguarde-me dos arroubos verborrágicos
afaste-me dos risinhos e ironias
tenha um dia a sensatez
dos sábios
eu me livre da inútil exposição
cale a minha boca baixe o meu facho
resguarde-me dos arroubos verborrágicos
afaste-me dos risinhos e ironias
tenha um dia a sensatez
dos sábios
*
sábado, 30 de agosto de 2008
terrena
líria porto
qual fosse um pião
girava em seu eixo
o que não a impedia de rodar
bailar
valsar
ao redor de um tal sol
*
qual fosse um pião
girava em seu eixo
o que não a impedia de rodar
bailar
valsar
ao redor de um tal sol
*
sexta-feira, 29 de agosto de 2008
a esperar o sol
líria porto
nu'a madrugada
morrer durante o sono
:
carcaça no horizonte
alma alvoroçada
*
nu'a madrugada
morrer durante o sono
:
carcaça no horizonte
alma alvoroçada
*
quinta-feira, 28 de agosto de 2008
quarta-feira, 27 de agosto de 2008
terça-feira, 26 de agosto de 2008
assim somos
líria porto
nossa humanidade consiste
em nos sentirmos fortes como o tronco das árvores
capazes de resistir às intempéries
e estarmos tão vulneráveis quanto a folha
que a qualquer momento
pode se desprender
*
nossa humanidade consiste
em nos sentirmos fortes como o tronco das árvores
capazes de resistir às intempéries
e estarmos tão vulneráveis quanto a folha
que a qualquer momento
pode se desprender
*
segunda-feira, 25 de agosto de 2008
destino
líria porto
a vida vai como o rio
míngua turva-se clareia
enche transborda faz curvas
tem leito margens peixes
areia pedras canoas
mas não tem retorno
*
a vida vai como o rio
míngua turva-se clareia
enche transborda faz curvas
tem leito margens peixes
areia pedras canoas
mas não tem retorno
*
domingo, 24 de agosto de 2008
sábado, 23 de agosto de 2008
madaminha
líria porto
corpo disforme
não pensa mais em amante novo
prefere o velho amor de guerra
meio cego meio coxo
*
corpo disforme
não pensa mais em amante novo
prefere o velho amor de guerra
meio cego meio coxo
*
sexta-feira, 22 de agosto de 2008
palavras de quem não merece arrimo
líria porto
grato pelo verso que me deste
pelas letras que brincam entre meus dedos
pelo gesto que permite a um ateu
poema tão singelo quanto o gelo
derreter-se ao sol
grato pela musa que voa até mim
com asas de andorinha
*
grato pelo verso que me deste
pelas letras que brincam entre meus dedos
pelo gesto que permite a um ateu
poema tão singelo quanto o gelo
derreter-se ao sol
grato pela musa que voa até mim
com asas de andorinha
*
quarta-feira, 20 de agosto de 2008
enfim
líria porto
do mundo nada se leva
bem nos diziam os antigos
então brinquemos de roda
dancemos cantemos alto
ou fiquemos em silêncio
tais como velhos amigos
daqueles que se entendem
a cada lágrima
ou suspiro
(eu sinto a morte me chama
pois me espere –– e sentada)
*
do mundo nada se leva
bem nos diziam os antigos
então brinquemos de roda
dancemos cantemos alto
ou fiquemos em silêncio
tais como velhos amigos
daqueles que se entendem
a cada lágrima
ou suspiro
(eu sinto a morte me chama
pois me espere –– e sentada)
*
perplexidade
líria porto
noite de chuva tu trazes
mistérios da natureza
decifra comigo o enigma
que induz o bicho-homem
a destruir o planeta
ajuda-me a entender
se embrenhado em si mesmo
razão há para este homem
exterminar as florestas
poluir o ar os rios
diz-me noite friorenta
sem lua e sem estrelas
o homem a matar o homem
qual o motivo das guerras
*
noite de chuva tu trazes
mistérios da natureza
decifra comigo o enigma
que induz o bicho-homem
a destruir o planeta
ajuda-me a entender
se embrenhado em si mesmo
razão há para este homem
exterminar as florestas
poluir o ar os rios
diz-me noite friorenta
sem lua e sem estrelas
o homem a matar o homem
qual o motivo das guerras
*
andrógino
líria porto
bonito bonita
o porte delgado
às vezes pavão
uma corça um cisne
outra vez um corcel
uma garça
(elegância não falta)
os olhos são tristes
a boca sorri
e um colibri
desprende-se d'alma
esbelta figura
presença agradável
isola-se afasta-se
bom cheiro bons modos
donzela não é
também não é macho
(um pouco de cada)
bonito bonita
é obra de arte
capricho de deus
em dia de graça
*
bonito bonita
o porte delgado
às vezes pavão
uma corça um cisne
outra vez um corcel
uma garça
(elegância não falta)
os olhos são tristes
a boca sorri
e um colibri
desprende-se d'alma
esbelta figura
presença agradável
isola-se afasta-se
bom cheiro bons modos
donzela não é
também não é macho
(um pouco de cada)
bonito bonita
é obra de arte
capricho de deus
em dia de graça
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - safo
líria porto
eu amo essa dona
testemunha ocular
ponto de apoio
eu amo essa dama
seu cheiro sua maciez
eu amo essa cama
lençóis fronhas travesseiros
colchas cobertas
eu amo essa fama
de sem-vergonha
*
eu amo essa dona
testemunha ocular
ponto de apoio
eu amo essa dama
seu cheiro sua maciez
eu amo essa cama
lençóis fronhas travesseiros
colchas cobertas
eu amo essa fama
de sem-vergonha
*
terça-feira, 19 de agosto de 2008
sol_tei_rão
líria porto
enquanto a lua sobe
o sol desce
nunca ficam lado a lado
como namorados
a lua decidiu
vai casar com marte
e deixar ab_soluto
o rei dos astros
*
enquanto a lua sobe
o sol desce
nunca ficam lado a lado
como namorados
a lua decidiu
vai casar com marte
e deixar ab_soluto
o rei dos astros
*
domingo, 17 de agosto de 2008
gramática
líria porto
muita vez meu verso some
foge daqui vai pra longe
eu acho – ele se esconde
na profundeza das regras
eu fico triste sem graça
perco o jeito de escrever
meu verso volta e me abraça
devolve-me a minha essência
*
muita vez meu verso some
foge daqui vai pra longe
eu acho – ele se esconde
na profundeza das regras
eu fico triste sem graça
perco o jeito de escrever
meu verso volta e me abraça
devolve-me a minha essência
*
sábado, 16 de agosto de 2008
de xale
líria porto
no inverno o sol alua
é de manhã e anoitece
a tristeza me visita
ponho mesa para duas
e espero a primavera
*
no inverno o sol alua
é de manhã e anoitece
a tristeza me visita
ponho mesa para duas
e espero a primavera
*
quarta-feira, 13 de agosto de 2008
chaga
líria porto
a punhalada nas costas
provocou-lhe um furo fundo
a alma ficou exposta
quem olha sabe – ainda gosta
daquele filho da prússia
*
a punhalada nas costas
provocou-lhe um furo fundo
a alma ficou exposta
quem olha sabe – ainda gosta
daquele filho da prússia
*
segunda-feira, 11 de agosto de 2008
a fotografia
líria porto
quando alguém afirma
ela se foi para sempre
ele tira o retrato do bolso
pisca-lhe o olho esquerdo
dá-lhe um sorriso e murmura
:
todos eles são tolos
não sabem que estás aqui
ela ri
linda como antes
*
quando alguém afirma
ela se foi para sempre
ele tira o retrato do bolso
pisca-lhe o olho esquerdo
dá-lhe um sorriso e murmura
:
todos eles são tolos
não sabem que estás aqui
ela ri
linda como antes
*
terça-feira, 5 de agosto de 2008
dio santo
líria porto
um moreno tão bonito
ao fitar o seu semblante
toda a pele se eriça
bate um frio baixo-ventre
logo acende um pisca-pisca
deus do céu o que são issos
premências?
*
um moreno tão bonito
ao fitar o seu semblante
toda a pele se eriça
bate um frio baixo-ventre
logo acende um pisca-pisca
deus do céu o que são issos
premências?
*
domingo, 3 de agosto de 2008
sábado, 2 de agosto de 2008
(e)vidências
líria porto
algo me diz tem cuidado
sigo a intuição
o coração dispara
eu paro
ouço o alarme
são raios relâmpagos
trovões tempestade
o diabo
(o coração não me engana)
*
algo me diz tem cuidado
sigo a intuição
o coração dispara
eu paro
ouço o alarme
são raios relâmpagos
trovões tempestade
o diabo
(o coração não me engana)
*
sexta-feira, 1 de agosto de 2008
rameira
líria porto
havia um buraco
um homem a cavá-lo
um homem a cavalo
um pouso
(vi-me em cama de vime)
*
havia um buraco
um homem a cavá-lo
um homem a cavalo
um pouso
(vi-me em cama de vime)
*
terça-feira, 29 de julho de 2008
despeito
líria porto
pavão tem pé feio
dizia o invejoso
enquanto a ave
abria a plumagem
e exibia sua cauda
impecável
e tu
és perfeito?
*
pavão tem pé feio
dizia o invejoso
enquanto a ave
abria a plumagem
e exibia sua cauda
impecável
e tu
és perfeito?
*
mineira
líria porto
nasci no triângulo
e a instável figura
impôs-me uns espasmos
de terras tão planas
um vento aprumado
jogou-me às montanhas
senti na viagem
de sonhos loucuras
vertigens desmaios
perdidas instâncias
cavalgo sem rédeas
montada em palavras
*
nasci no triângulo
e a instável figura
impôs-me uns espasmos
de terras tão planas
um vento aprumado
jogou-me às montanhas
senti na viagem
de sonhos loucuras
vertigens desmaios
perdidas instâncias
cavalgo sem rédeas
montada em palavras
*
segunda-feira, 28 de julho de 2008
domingo, 27 de julho de 2008
sábado, 26 de julho de 2008
a um bravo
líria porto
ao balançar suas lâminas
a persiana me lembra
o barulho das orelhas
dum cachorrinho branco
morreu faz algum tempo
mas su'alma me visita
ele era meu amigo
mais do que muita gente
sinto saudades do tiu
seu focinho cor-de-rosa
a roçar a minha porta
minha alegria
*
ao balançar suas lâminas
a persiana me lembra
o barulho das orelhas
dum cachorrinho branco
morreu faz algum tempo
mas su'alma me visita
ele era meu amigo
mais do que muita gente
sinto saudades do tiu
seu focinho cor-de-rosa
a roçar a minha porta
minha alegria
*
quinta-feira, 24 de julho de 2008
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) agenda
líria porto
domingo ia à missa
segunda rezava o terço
na quinta
maria das quantas
limpava o quarto
e punha o lixo
na cesta
no sábado
(aleluia)
vinha um soldado
tirar-lhe as teias
da aranha
(nu
tempo
restante)
*
domingo ia à missa
segunda rezava o terço
na quinta
maria das quantas
limpava o quarto
e punha o lixo
na cesta
no sábado
(aleluia)
vinha um soldado
tirar-lhe as teias
da aranha
(nu
tempo
restante)
*
quarta-feira, 23 de julho de 2008
tentação
líria porto
eu ouço um rugido
e vem da cidade
a fera noturna
acende mil olhos
estende os tentáculos
aperta o boêmio
em seus braços
*
eu ouço um rugido
e vem da cidade
a fera noturna
acende mil olhos
estende os tentáculos
aperta o boêmio
em seus braços
*
se conselho fosse bom
líria porto
precisas mudar daqui
esta casa é muito grande
: também sou
não vou me mudar de mim
*
precisas mudar daqui
esta casa é muito grande
: também sou
não vou me mudar de mim
*
segunda-feira, 21 de julho de 2008
idas e vindas
líria porto
o nosso caminho
de espinhos e pétalas
bifurca-se
adeus ó amado
não vou te esquecer
um dia quem sabe
os braços do rio
misturem nossas águas
*
o nosso caminho
de espinhos e pétalas
bifurca-se
adeus ó amado
não vou te esquecer
um dia quem sabe
os braços do rio
misturem nossas águas
*
sábado, 19 de julho de 2008
sexta-feira, 18 de julho de 2008
anúncio
líria porto
vivo comigo faz décadas
durmo e também desperto
almoço janto e me banho
penteio-me enxergo-me
completo-me
quem quiser morar aqui
por certo terá problemas
porém se permanecer
saberá dos sabiás
das andorinhas gorjeios
dos sóis das luas estrelas
das janelas sem tramela
dos temperos arrepios
e dos desmaios no leito
*
vivo comigo faz décadas
durmo e também desperto
almoço janto e me banho
penteio-me enxergo-me
completo-me
quem quiser morar aqui
por certo terá problemas
porém se permanecer
saberá dos sabiás
das andorinhas gorjeios
dos sóis das luas estrelas
das janelas sem tramela
dos temperos arrepios
e dos desmaios no leito
*
balançam haicais
líria porto
noite de luar
as flores da laranjeira
grinalda de pétalas
*
barcos de papel
sobre as águas da piscina
arrepiam-lhe a pele
*
avião no espaço
urubu gira faminto
procura carniça
*
ratos e morcegos
entre as sombras do quintal
pela noite adentro
*
dia ensolarado
sabiás catam gravetos
nos jardins da praça
*
restos na lixeira
em caixas de papelão
cascas de bananas
*
noite de luar
as flores da laranjeira
grinalda de pétalas
*
barcos de papel
sobre as águas da piscina
arrepiam-lhe a pele
*
avião no espaço
urubu gira faminto
procura carniça
*
ratos e morcegos
entre as sombras do quintal
pela noite adentro
*
dia ensolarado
sabiás catam gravetos
nos jardins da praça
*
restos na lixeira
em caixas de papelão
cascas de bananas
*
varal
líria porto
quando chega a madrugada
e a manhã não veio ainda
o sol que maneja as cores
põe a noite no estaleiro
entre o azul e os olhos
tudo pode acontecer
*
quando chega a madrugada
e a manhã não veio ainda
o sol que maneja as cores
põe a noite no estaleiro
entre o azul e os olhos
tudo pode acontecer
*
ressentimento
líria porto
tua raiva agarra-se à garganta
a minha
entre a língua e os dentes
mistura-se à saliva
cuspo-a na pia
*
tua raiva agarra-se à garganta
a minha
entre a língua e os dentes
mistura-se à saliva
cuspo-a na pia
*
descanso
líria porto
a vida como onda
sempre em movimento
atravessa o tempo
acalma-se na praia
éter namorada
*
a vida como onda
sempre em movimento
atravessa o tempo
acalma-se na praia
éter namorada
*
quinta-feira, 17 de julho de 2008
versinhos tirânicos
líria porto
levo relevo
carrego pra todo canto
dou de mamar acalento
mas quando morde meu peito
saio de mim
*
levo relevo
carrego pra todo canto
dou de mamar acalento
mas quando morde meu peito
saio de mim
*
pote de ouro
líria porto
a amizade é bonita
parece água de bica
nela se bebe à vontade
lava-se mágoa
tristeza
se acaso faz tempestade
e a água se embacia
o mau tempo logo passa
e jorra límpido
o riso
onde mora a amizade
nasce o arco-íris
a amizade é bonita
parece água de bica
nela se bebe à vontade
lava-se mágoa
tristeza
se acaso faz tempestade
e a água se embacia
o mau tempo logo passa
e jorra límpido
o riso
onde mora a amizade
nasce o arco-íris
*
quarta-feira, 16 de julho de 2008
onde estão as chaves?
líria porto
eu nunca vou te esquecer
(não sei quem sabe
e se eu tiver alzheimer)
*
eu nunca vou te esquecer
(não sei quem sabe
e se eu tiver alzheimer)
*
segunda-feira, 14 de julho de 2008
análise
líria porto
cavoucar profundo lá no âmago
revirar nossos monstros e conceitos
é revelar-nos o que temos nos porões
é refazermos a imagem do espelho
*
cavoucar profundo lá no âmago
revirar nossos monstros e conceitos
é revelar-nos o que temos nos porões
é refazermos a imagem do espelho
*
foi-se
líria porto
morre um dia morre outro
morre um e morre o outro
e mais dia menos dia
sou o novo morto
amanhã pode ser tarde
ontem era hoje
*
morre um dia morre outro
morre um e morre o outro
e mais dia menos dia
sou o novo morto
amanhã pode ser tarde
ontem era hoje
*
invisível
líria porto
nem a grande nem a pequena - a do meio
a que não manda nem obedece
aquela de quem se lembra
vagamente
*
nem a grande nem a pequena - a do meio
a que não manda nem obedece
aquela de quem se lembra
vagamente
*
intrincado
líria porto
sem respostas às perguntas
sem remédio para os males
valerá estar num mundo
de penas e de pesares?
*
sem respostas às perguntas
sem remédio para os males
valerá estar num mundo
de penas e de pesares?
*
rompante
líria porto
emoções acumulam-se
represam-se as atitudes
um dia o dique rebenta
quem segurava não aguenta
põe a perder quase tudo
*
emoções acumulam-se
represam-se as atitudes
um dia o dique rebenta
quem segurava não aguenta
põe a perder quase tudo
*
indiferentes
líria porto
tal como eu me atirava em teus braços
o mar se joga sobre os rochedos
iguais a ti
as pedras permanecem impassíveis
*
tal como eu me atirava em teus braços
o mar se joga sobre os rochedos
iguais a ti
as pedras permanecem impassíveis
*
passo atrás
líria porto
a minha cara de lua
a tua cara-metade
ficamos lá cara a cara
eu te olhava de frente
tu me olhavas de lado
cara ou coroa pergunto-te
tu não respondes
acovarda-te
*
a minha cara de lua
a tua cara-metade
ficamos lá cara a cara
eu te olhava de frente
tu me olhavas de lado
cara ou coroa pergunto-te
tu não respondes
acovarda-te
*
de carruagem
líria porto
névoas rugas nuvens cãibras dores ferrugem
mesmo assim a vida é breve e a velhice
névoas rugas nuvens cãibras dores ferrugem
mesmo assim a vida é breve e a velhice
um luxo
*
*
domingo, 13 de julho de 2008
abracadabra
líria porto
escrevo
afio a pena
um dia quem sabe
num rasgo relâmpago
raio ou milagre
eu encontre
a mágica
*
escrevo
afio a pena
um dia quem sabe
num rasgo relâmpago
raio ou milagre
eu encontre
a mágica
*
quinta-feira, 10 de julho de 2008
agonia
líria porto
tem um poema calado
a desprender-se do lado
onde o grito se afigura
um poema de silêncio
sem palavras e sem fala
entranhado de estranhezas
sua cor a cor do sangue
seu teor o horror à guerra
a maldição do mundo
*
tem um poema calado
a desprender-se do lado
onde o grito se afigura
um poema de silêncio
sem palavras e sem fala
entranhado de estranhezas
sua cor a cor do sangue
seu teor o horror à guerra
a maldição do mundo
*
de passagem
líria porto
lua rola bole olha-me
cola-se em minha janela
brinca brilha mostra-se beija-me
gosta cora encolhe-se peço-lhe
fica um pouco mais
espera-me
lua míngua
vai-se embora
*
lua rola bole olha-me
cola-se em minha janela
brinca brilha mostra-se beija-me
gosta cora encolhe-se peço-lhe
fica um pouco mais
espera-me
lua míngua
vai-se embora
*
quarta-feira, 9 de julho de 2008
deserto
líria porto
palavras me exaurem
quando penso morrer à míngua
brotam-me versos como margaridas
depois da chuva
mares de areia
viram jardim
*
palavras me exaurem
quando penso morrer à míngua
brotam-me versos como margaridas
depois da chuva
mares de areia
viram jardim
*
prece
líria porto
ó deus
acaso existas
antes faço uma troca não um pedido
se a dor destinar-se a meu filho
seja-a a mim –– e seja
ao triplo
(nenhuma fêmea suporta
o sofrimento da cria)
*
ó deus
acaso existas
antes faço uma troca não um pedido
se a dor destinar-se a meu filho
seja-a a mim –– e seja
ao triplo
(nenhuma fêmea suporta
o sofrimento da cria)
*
domingo, 6 de julho de 2008
recuerdos
líria porto
os nossos braços cansados
já não apontam estrelas
quem as tem cravadas n'alma
em sonho é capaz de vê-las
tais e quais uma lanterna
a clarear as lembranças
dos tempos bons da infância
quando a gente tinha medo
de ter verruga no dedo
*
os nossos braços cansados
já não apontam estrelas
quem as tem cravadas n'alma
em sonho é capaz de vê-las
tais e quais uma lanterna
a clarear as lembranças
dos tempos bons da infância
quando a gente tinha medo
de ter verruga no dedo
*
pensamento
líria porto
havana lisboa londres madri
santiago beirute viena bagdá
istambul tóquio roma paris
moscou méxico nova york
são paulo toronto luxemburgo
cabul brasília pretória pequim
jerusalém damasco luanda jacarta
sófia buenos aires
em pouco mais de um minuto
revirou mundos e fundos
e não saiu do lugar
*
havana lisboa londres madri
santiago beirute viena bagdá
istambul tóquio roma paris
moscou méxico nova york
são paulo toronto luxemburgo
cabul brasília pretória pequim
jerusalém damasco luanda jacarta
sófia buenos aires
em pouco mais de um minuto
revirou mundos e fundos
e não saiu do lugar
*
(publicado no livro asa de passarinho - editora lê) - militância
líria porto
passarinho insiste
quer liberdade
e alpiste
*
passarinho insiste
quer liberdade
e alpiste
*
dona doida
líria porto
abrir os braços
beirar o horizonte
rodear a montanha
ir à espanha colher flores vermelhas
levá-las para maria seixas
em portugal
sonhar fingir-nos mágicos
fazer o que se nos der na telha
voar sem asas
*
abrir os braços
beirar o horizonte
rodear a montanha
ir à espanha colher flores vermelhas
levá-las para maria seixas
em portugal
sonhar fingir-nos mágicos
fazer o que se nos der na telha
voar sem asas
*
amorzinho
líria porto
pra dizer-te ai loviú
adoro teus bigodes
pintei as unhas de azul
vamos a são roque comer alcachofras
amanheceu tão bonito
tenho carne de sol
comigo ninguém pode
odeio tuas amigas
comprei um mimo pra ti
voo no domingo
vou de vassoura
não vejo a hora
vamos beijar juntos?
*
pra dizer-te ai loviú
adoro teus bigodes
pintei as unhas de azul
vamos a são roque comer alcachofras
amanheceu tão bonito
tenho carne de sol
comigo ninguém pode
odeio tuas amigas
comprei um mimo pra ti
voo no domingo
vou de vassoura
não vejo a hora
vamos beijar juntos?
*
sábado, 5 de julho de 2008
avó
líria porto
um carneirinho
perdeu-se no céu
:
não chores meu bem não chores
mamãezinha foi chover
e não demora
*
um carneirinho
perdeu-se no céu
:
não chores meu bem não chores
mamãezinha foi chover
e não demora
*
fatídico
líria porto
a vida nos trata conforme a tratamos
a morte nos mata em quaisquer
circunstâncias
*
a vida nos trata conforme a tratamos
a morte nos mata em quaisquer
circunstâncias
*
avessos
líria porto
eu sou minha tu és teu
sem caras-metades sem meias verdades
e seguimos felizes até a crise
(ou a crase)
*
eu sou minha tu és teu
sem caras-metades sem meias verdades
e seguimos felizes até a crise
(ou a crase)
*
sexta-feira, 4 de julho de 2008
marginal
líria porto
acalento versos
como se fossem bebês
cuido deles alimento-os
dou-lhes as melhores letras
nem sempre consigo
cada verso tem sua própria
índole
*
acalento versos
como se fossem bebês
cuido deles alimento-os
dou-lhes as melhores letras
nem sempre consigo
cada verso tem sua própria
índole
*
quinta-feira, 3 de julho de 2008
quarta-feira, 2 de julho de 2008
caríssima
líria porto
vou juntar num só buquê lírios e flores do campo
amarrar laço de seda enfeitar com pirilampo
e mandá-lo para mim
*
vou juntar num só buquê lírios e flores do campo
amarrar laço de seda enfeitar com pirilampo
e mandá-lo para mim
*
íngua de sogra
líria porto
lua-de-mel minha linda
só lhe adoça o céu-da-boca
pois depois a vida a dois
pode amargar a língua
*
lua-de-mel minha linda
só lhe adoça o céu-da-boca
pois depois a vida a dois
pode amargar a língua
*
orgulho
líria porto
quando as tias disseram
em tom muito humilde
ele é bom para nós
dá-nos o arroz
num pulo reagi
: não devam tão pouco
a homem tão rico
eu tinha dez anos
*
quando as tias disseram
em tom muito humilde
ele é bom para nós
dá-nos o arroz
num pulo reagi
: não devam tão pouco
a homem tão rico
eu tinha dez anos
*
segunda-feira, 30 de junho de 2008
cismas
líria porto
entre o dia e a noite
mesclam-se retalhos de sombras
corro para casa e me escondo
dos monstros e dos fantasmas
*
entre o dia e a noite
mesclam-se retalhos de sombras
corro para casa e me escondo
dos monstros e dos fantasmas
*
domingo, 29 de junho de 2008
parelha
líria porto
a pequena morte
dá-nos corpos
inocentes
estrelas se desfazem
e nus nesse oásis
quedamo-nos
entre as frestas
o caldo da entrega
sal do amor
roupas largadas
pegadas
suor
*
a pequena morte
dá-nos corpos
inocentes
estrelas se desfazem
e nus nesse oásis
quedamo-nos
entre as frestas
o caldo da entrega
sal do amor
roupas largadas
pegadas
suor
*
quinta-feira, 26 de junho de 2008
ainda
líria porto
não vou me deixar morrer por um sonho arruinado
mesmo que me amargue a boca talhe-me o sangue
e eu chore um oceano
não vou me deixar morrer
por ninguém
*
não vou me deixar morrer por um sonho arruinado
mesmo que me amargue a boca talhe-me o sangue
e eu chore um oceano
não vou me deixar morrer
por ninguém
*
jaça
líria porto
saltou o sol do poleiro
acendeu o seu luzeiro
debruçou-se à janela
amanheceu azulinho
há um filhote no ninho
bico aberto para o céu
o resto da passarada
canta em louca revoada
a festejar a manhã
viver não é azinhavre
rói-me é dormir sozinho
acordar em cama larga
*
saltou o sol do poleiro
acendeu o seu luzeiro
debruçou-se à janela
amanheceu azulinho
há um filhote no ninho
bico aberto para o céu
o resto da passarada
canta em louca revoada
a festejar a manhã
viver não é azinhavre
rói-me é dormir sozinho
acordar em cama larga
*
fantasia
líria porto
bastou uma rachadura
uns pingos de chuva fina
e o cimento impassível
vestiu-se de bailarina
*
bastou uma rachadura
uns pingos de chuva fina
e o cimento impassível
vestiu-se de bailarina
*
mano a mano
líria porto
a lua branca e bela
rolou debaixo da tela
e foi brilhar no japão
do lado de cá do sol
pintaram um arrebol
da cor do seu coração
sonhei com ele essa noite
esta saudade um açoite
parece estava ao portão
ele de mim se escondeu
a vida da cor do breu
encheu-me de escuridão
este poema infantil
tão cheio de ão e til
eu fiz para meu irmão
vaca amarela
pulou a janela
quem falar primeiro
come a bosta dela
*
a lua branca e bela
rolou debaixo da tela
e foi brilhar no japão
do lado de cá do sol
pintaram um arrebol
da cor do seu coração
sonhei com ele essa noite
esta saudade um açoite
parece estava ao portão
ele de mim se escondeu
a vida da cor do breu
encheu-me de escuridão
este poema infantil
tão cheio de ão e til
eu fiz para meu irmão
vaca amarela
pulou a janela
quem falar primeiro
come a bosta dela
*
roseiras
líria porto
fora de tempo e por gosto
meninas em festa
tínhamos espinhos
espinhas
adolescíamos
*
fora de tempo e por gosto
meninas em festa
tínhamos espinhos
espinhas
adolescíamos
*
voo
líria porto
sabino fernando mineiro
marcaste encontro com deus
espera menino –– no espelho
que dentro em pouco
vou eu
*
sabino fernando mineiro
marcaste encontro com deus
espera menino –– no espelho
que dentro em pouco
vou eu
*
deslumbramento
líria porto
quando a lua fica acesa
meu olhar de folha seca
o vento leva
o luar é tão bonito
um colírio verdadeiro
a curar os olhos velhos
*
quando a lua fica acesa
meu olhar de folha seca
o vento leva
o luar é tão bonito
um colírio verdadeiro
a curar os olhos velhos
*
quarta-feira, 25 de junho de 2008
ré
líria porto
cheirava pólen
foi rechaçada
recusaram suas cores
retiraram-na da relva
recortaram-lhe as asas
morreu lagarta
*
cheirava pólen
foi rechaçada
recusaram suas cores
retiraram-na da relva
recortaram-lhe as asas
morreu lagarta
*
terça-feira, 24 de junho de 2008
libertação
líria porto
quando eu morrer não fiques triste
consola-te assim –– ela agora é pensamento
rompeu todos os limites
(e não guardes as cinzas
mandarei um mandarim
trazer notícias)
*
quando eu morrer não fiques triste
consola-te assim –– ela agora é pensamento
rompeu todos os limites
(e não guardes as cinzas
mandarei um mandarim
trazer notícias)
*
segunda-feira, 23 de junho de 2008
bem-te-vi
líria porto
ao abrirem-se as janelas
assistimos com prazer
o maior espetáculo da serra
direto de belo horizonte
*
ao abrirem-se as janelas
assistimos com prazer
o maior espetáculo da serra
direto de belo horizonte
*
domingo, 22 de junho de 2008
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) marmita
líria porto
papa de arroz
(errei a mão)
feijão ralo
tomate verde
couve amarela
falta farinha
e o preço dos ovos
pela hora da morte
(carne –– a minha)
*
papa de arroz
(errei a mão)
feijão ralo
tomate verde
couve amarela
falta farinha
e o preço dos ovos
pela hora da morte
(carne –– a minha)
*
bangalôs
líria porto
num tempo de paredes brancas
pintava a fachada das casas
com tintas de coloridas
:
fisgava olhos
e almas
*
num tempo de paredes brancas
pintava a fachada das casas
com tintas de coloridas
:
fisgava olhos
e almas
*
sexta-feira, 20 de junho de 2008
instintos
líria porto
não subestimes um vulcão extinto
toda terra tórrida tem na memória
histórias de explosão
lembras-te das brasas
cobertas de cinza?
*
não subestimes um vulcão extinto
toda terra tórrida tem na memória
histórias de explosão
lembras-te das brasas
cobertas de cinza?
*
quinta-feira, 19 de junho de 2008
blá blá blá
líria porto
parlendas empolam as pérolas
embolam falácias à língua
pelejas entubam a prosa
e a impelem à berlinda
*
parlendas empolam as pérolas
embolam falácias à língua
pelejas entubam a prosa
e a impelem à berlinda
*
enfiada
líria porto
lá no fundo da bacia
passarim largou a pena
para mim serviu de guia
vou escrever um poema
uma pena tão pequena
com a ponta amarelinha
grandes são as minhas penas
eu as carrego sozinha
afundei a vida assim
bem dentro desse balaio
criei entraves raízes
mais pareço um para-raios
meu coração bate bate
pirulito quem me deu
desta vida quis melado
foi o pau que me comeu
chorei dentro da peneira
coei dor e muita mágoa
soçobrei pedra de sal
vou beber a caixa dágua
meu amor saiu de cena
fiquei assim puro enjoo
aproveito a porta aberta
vou tentar não sei se voo
quem quiser seguir comigo
vem depressa vem ligeiro
já perdi o meu cabaço
nunca mais tive conserto
canta comigo a cantiga
canta agora nesse instante
pois além de tua amiga
posso ser também amante
saiu água da mangueira
num esguicho decidido
quase igual namoradeira
com vontade de marido
encontrou terra sedenta
entrou logo sem bater
ponho-me a pensar lá dentro
no que pode acontecer
apareceram três brotos
os dias passam corridos
mesmo assim com essa seca
o meu chão ficou macio
esta vida é traiçoeira
arapuca gigantesca
se não fores muito esperto
levas pancada na nuca
vou parar com a loucura
desse verso compulsivo
ele não me leva a nada
de ser doida eu não me livro
*
lá no fundo da bacia
passarim largou a pena
para mim serviu de guia
vou escrever um poema
uma pena tão pequena
com a ponta amarelinha
grandes são as minhas penas
eu as carrego sozinha
afundei a vida assim
bem dentro desse balaio
criei entraves raízes
mais pareço um para-raios
meu coração bate bate
pirulito quem me deu
desta vida quis melado
foi o pau que me comeu
chorei dentro da peneira
coei dor e muita mágoa
soçobrei pedra de sal
vou beber a caixa dágua
meu amor saiu de cena
fiquei assim puro enjoo
aproveito a porta aberta
vou tentar não sei se voo
quem quiser seguir comigo
vem depressa vem ligeiro
já perdi o meu cabaço
nunca mais tive conserto
canta comigo a cantiga
canta agora nesse instante
pois além de tua amiga
posso ser também amante
saiu água da mangueira
num esguicho decidido
quase igual namoradeira
com vontade de marido
encontrou terra sedenta
entrou logo sem bater
ponho-me a pensar lá dentro
no que pode acontecer
apareceram três brotos
os dias passam corridos
mesmo assim com essa seca
o meu chão ficou macio
esta vida é traiçoeira
arapuca gigantesca
se não fores muito esperto
levas pancada na nuca
vou parar com a loucura
desse verso compulsivo
ele não me leva a nada
de ser doida eu não me livro
*
grávidos
líria porto
vou te falar a respeito
talvez me possas entender
minhas letras pequeninas
um enigma para mim
navegam das águas limpas
para o centro das tormentas
eu as queria serenas
elas nunca se contentam
agitam-se por qualquer sopro
sacrificam-me os dedos
roem-me as unhas e cospem
versos inversos esquerdos
por vezes só inquietas
outras cruéis ciumentas
minhas letras miudinhas
estejam tristes ou não
aparecem-me assaltam-me
em horas inusitadas
difíceis choram chateiam
escondem bocas de lixo
são letras sem cabimento
trêmulas tímidas implícitas
borradas sujas de medo
quais letras recém-nascidas
a sua essência é em sumo
o resumo das vivências
experiências e sonhos
não somos papel em branco
onde tem versos há fetos
poemas prematuros
talvez me possas entender
minhas letras pequeninas
um enigma para mim
navegam das águas limpas
para o centro das tormentas
eu as queria serenas
elas nunca se contentam
agitam-se por qualquer sopro
sacrificam-me os dedos
roem-me as unhas e cospem
versos inversos esquerdos
por vezes só inquietas
outras cruéis ciumentas
minhas letras miudinhas
estejam tristes ou não
aparecem-me assaltam-me
em horas inusitadas
difíceis choram chateiam
escondem bocas de lixo
são letras sem cabimento
trêmulas tímidas implícitas
borradas sujas de medo
quais letras recém-nascidas
a sua essência é em sumo
o resumo das vivências
experiências e sonhos
não somos papel em branco
onde tem versos há fetos
poemas prematuros
*
muita esmola
líria porto
supõe que eu me resolva
de mim afaste os entraves
arranque a pedra do rim
retire espinhos e cacos
apague a sombra
os fantasmas
encontre o pote de mel
implante um sorriso largo
acerte na loteria
e ao final eu me case
:
seria bom
e ruim
*
supõe que eu me resolva
de mim afaste os entraves
arranque a pedra do rim
retire espinhos e cacos
apague a sombra
os fantasmas
encontre o pote de mel
implante um sorriso largo
acerte na loteria
e ao final eu me case
:
seria bom
e ruim
*
nas franjas do horizonte
líria porto
a minha história de hoje
enlaçada de bonina
pingada de água de cheiro
é a história duma rosa
dum beija-flor todo prosa
e das tramas do destino
no corredor que é a vida
lá pelas bandas de lá
não sei se sorte ou azar
ou se já estava escrito
uma rosa perfumosa
entreabriu mui dengosa
lindas pétalas de seda
voava nos arredores
um beija-flor aprumado
de colarinho azul claro
querendo comprar bolinhos
e ao ver tão rubra rosa
assanhou-se chegou perto
gostou da cor e do estilo
bons dias bela menina
posso ficar por aqui?
:
tu que sabes beija-flor
não te posso fazer sala
tu já és comprometido
além do mais és metido
e estou muito ocupada
ele insistiu implorou
beija-flor é bom de bico
a rosa não resistiu
é doce rosa amorosa
os dois logo se entenderam
e teceram num instante
aquele romance ilícito
ao despencar o astro rei
na hora de ir-se embora
o beija-flor apressado
limpa o bico alisa as asas
pisca os olhos miudinhos
observa um lado e outro
depois bate em retirada
toda semana é assim
o beija-flor tem desejos
e finge comprar bolinhos
a rosa gosta dos beijos
desabrocha sem recato
e se repetem os fatos
(esta história não tem fim)
*
a minha história de hoje
enlaçada de bonina
pingada de água de cheiro
é a história duma rosa
dum beija-flor todo prosa
e das tramas do destino
no corredor que é a vida
lá pelas bandas de lá
não sei se sorte ou azar
ou se já estava escrito
uma rosa perfumosa
entreabriu mui dengosa
lindas pétalas de seda
voava nos arredores
um beija-flor aprumado
de colarinho azul claro
querendo comprar bolinhos
e ao ver tão rubra rosa
assanhou-se chegou perto
gostou da cor e do estilo
bons dias bela menina
posso ficar por aqui?
:
tu que sabes beija-flor
não te posso fazer sala
tu já és comprometido
além do mais és metido
e estou muito ocupada
ele insistiu implorou
beija-flor é bom de bico
a rosa não resistiu
é doce rosa amorosa
os dois logo se entenderam
e teceram num instante
aquele romance ilícito
ao despencar o astro rei
na hora de ir-se embora
o beija-flor apressado
limpa o bico alisa as asas
pisca os olhos miudinhos
observa um lado e outro
depois bate em retirada
toda semana é assim
o beija-flor tem desejos
e finge comprar bolinhos
a rosa gosta dos beijos
desabrocha sem recato
e se repetem os fatos
(esta história não tem fim)
*
quarta-feira, 18 de junho de 2008
insensível
líria porto
quarto crescente indiferente
ao quarto minguante das nossas paredes
chorosas do tempo do amor fremente
entre os dormentes da nossa cama
*
quarto crescente indiferente
ao quarto minguante das nossas paredes
chorosas do tempo do amor fremente
entre os dormentes da nossa cama
*
trovadiagem
líria porto
vento norte que vem vindo
destramela meu portão
fome de amor estou indo
vou comer na tua mão
*
vaga nuvem vagabunda
nave vaga navegava
vaga-lume vala funda
era a vela que velava
*
lá no alto existe um moço
cheio de olhares pra mim
fui comprar jiló pro almoço
trouxe rosas e jasmins
*
tua gaiola é dourada
sou livre no meu poleiro
tu tens as grades mais nada
eu tenho meu mundo inteiro
*
as distâncias comprovadas
não são distantes assim
se eu viajo é nos sonhos
não há lonjura nem fim
*
ninguém me chama pra dentro
ninguém me bota pra fora
sou eu quem sabe se entro
ou se preciso ir embora
*
vento norte que vem vindo
destramela meu portão
fome de amor estou indo
vou comer na tua mão
*
vaga nuvem vagabunda
nave vaga navegava
vaga-lume vala funda
era a vela que velava
*
lá no alto existe um moço
cheio de olhares pra mim
fui comprar jiló pro almoço
trouxe rosas e jasmins
*
tua gaiola é dourada
sou livre no meu poleiro
tu tens as grades mais nada
eu tenho meu mundo inteiro
*
as distâncias comprovadas
não são distantes assim
se eu viajo é nos sonhos
não há lonjura nem fim
*
ninguém me chama pra dentro
ninguém me bota pra fora
sou eu quem sabe se entro
ou se preciso ir embora
*
providências
líria porto
preciso limar as pontas
arredondar as arestas
perfumar minhas cobertas
colher morangos silvestres
o meu amor vai chegar
que venha tal como é
e traga tudo que queira
chinelos discos tristezas
as portas já estão abertas
*
preciso limar as pontas
arredondar as arestas
perfumar minhas cobertas
colher morangos silvestres
o meu amor vai chegar
que venha tal como é
e traga tudo que queira
chinelos discos tristezas
as portas já estão abertas
*
pequenininha
líria porto
vitória é coisa grande
virada de jogo euforia
no entanto
a vitória mais bonita
sequer tem um metro de altura
sapateia dança sorri
e me prende
à sua teia
seus olhos são pretos
*
mãe áfrica
líria porto
ouvi os lamentos
açoites gemidos
nas minas igrejas
nos tanques das casas
cozinhas cadeias
barracos cortiços
espinhos no coração
do brasil
*
ouvi os lamentos
açoites gemidos
nas minas igrejas
nos tanques das casas
cozinhas cadeias
barracos cortiços
espinhos no coração
do brasil
*
tarde da noite
líria porto
enquanto a lua e a nuvem
brincavam de esconde-esconde
estrelinhas piscavam
tontas de sono
*
enquanto a lua e a nuvem
brincavam de esconde-esconde
estrelinhas piscavam
tontas de sono
*
domingo, 15 de junho de 2008
medo de defunto
líria porto
irmã ilza - professora de religião - afirmou solenemente
apenas os escolhidos os abençoados os muito santos
verão almas doutro mundo
(ufa - podia dormir sossegada)
*
irmã ilza - professora de religião - afirmou solenemente
apenas os escolhidos os abençoados os muito santos
verão almas doutro mundo
(ufa - podia dormir sossegada)
*
sexta-feira, 13 de junho de 2008
quinta-feira, 12 de junho de 2008
principesca
líria porto
no alto da serra
assistir os crepúsculos
olhar o sol nos olhos
a lua as estrelas as nuvens
dançar na chuva
viver de asas abertas
azul no topo e verde
ao sopé
:
isto sim é que é poder
*
no alto da serra
assistir os crepúsculos
olhar o sol nos olhos
a lua as estrelas as nuvens
dançar na chuva
viver de asas abertas
azul no topo e verde
ao sopé
:
isto sim é que é poder
*
terça-feira, 10 de junho de 2008
domingo, 8 de junho de 2008
(publicado no livro asa de passarinho - editora lê) - corpo mole
líria porto
no firmamento
tinha uma nuvem
dentro da nuvem
chuva encravada
em terra seca
muita penúria
e a pirracenta
não desaguava
não libertava
uma lágrima
não tinha dó
piedade
*
no firmamento
tinha uma nuvem
dentro da nuvem
chuva encravada
em terra seca
muita penúria
e a pirracenta
não desaguava
não libertava
uma lágrima
não tinha dó
piedade
*
quinta-feira, 5 de junho de 2008
quarta-feira, 4 de junho de 2008
par de vasos
líria porto
para o meu vestido de bolero
quero o azul cheio de noite
que antecede as manhãs
:
vai combinar com teu terno
e o batom vermelho
com as tuas
bravatas
*
para o meu vestido de bolero
quero o azul cheio de noite
que antecede as manhãs
:
vai combinar com teu terno
e o batom vermelho
com as tuas
bravatas
*
terça-feira, 3 de junho de 2008
desorientação
líria porto
abateram o abacateiro
e os passarinhos
cujos filhotes pereceram
e perderam os ninhos
parecem-se àqueles órfãos
cujos olhos tão imensos
cheios de interrogação
sentem o coração vazio
como um rio seco
*
abateram o abacateiro
e os passarinhos
cujos filhotes pereceram
e perderam os ninhos
parecem-se àqueles órfãos
cujos olhos tão imensos
cheios de interrogação
sentem o coração vazio
como um rio seco
*
segunda-feira, 2 de junho de 2008
rame-rame
líria porto
inquieta no meu canto
não perdia uma letrinha
tal e qual um pirilampo
queria a luz que alumia
eu teci diversos versos
uma tiara um destino
então veio uma andorinha
desfiou o meu tecido
hoje é segunda-feira
dia de limpar a casa
pôr a sujeira no lixo
asa é coisa de domingo
ô vida ingrata
*
inquieta no meu canto
não perdia uma letrinha
tal e qual um pirilampo
queria a luz que alumia
eu teci diversos versos
uma tiara um destino
então veio uma andorinha
desfiou o meu tecido
hoje é segunda-feira
dia de limpar a casa
pôr a sujeira no lixo
asa é coisa de domingo
ô vida ingrata
*
quinta-feira, 29 de maio de 2008
retalhos
líria porto
parecia qualq
uer coisa que
brada e ao mes
mo tempo int
eira embora não
passasse de ped
aços de pap
éis rasg
ados por men
ino desalmad
o antes do te
mpo
*
parecia qualq
uer coisa que
brada e ao mes
mo tempo int
eira embora não
passasse de ped
aços de pap
éis rasg
ados por men
ino desalmad
o antes do te
mpo
*
domingo, 25 de maio de 2008
troca-troca
líria porto
sou vira-folha amor
maria vai com as outras
por quaisquer olhos verdes
caio em tentação
*
sou vira-folha amor
maria vai com as outras
por quaisquer olhos verdes
caio em tentação
*
lapsos
líria porto
nesgas importantes
somem da memória
e saias de roda
viram saias justas
só a velha lua
fica nova
*
nesgas importantes
somem da memória
e saias de roda
viram saias justas
só a velha lua
fica nova
*
vendaval
líria porto
o vento
vai
vem
volta
vira
revolta-se
revira-se
e vertical
varre
devassa
vilipendia
devasta
devora
o vale
a vila
o verde
a vontade
de
v
i
v
e
r
*
o vento
vai
vem
volta
vira
revolta-se
revira-se
e vertical
varre
devassa
vilipendia
devasta
devora
o vale
a vila
o verde
a vontade
de
v
i
v
e
r
*
sábado, 24 de maio de 2008
quinta-feira, 22 de maio de 2008
ambiental
líria porto
as pedras deitadas no leito do rio
cobrem-se com lençóis d'água
o frio não entra e os peixes
amam-se à vontade
*
as pedras deitadas no leito do rio
cobrem-se com lençóis d'água
o frio não entra e os peixes
amam-se à vontade
*
terça-feira, 20 de maio de 2008
derrapagem
líria porto
depois da curva uma cruz
e outra depois de outra
assim se fazem as tristezas
as lágrimas copiosas
há tanta coisa bonita
ao longo da vida
ao canto
dos olhos
pra que pressa?
*
depois da curva uma cruz
e outra depois de outra
assim se fazem as tristezas
as lágrimas copiosas
há tanta coisa bonita
ao longo da vida
ao canto
dos olhos
pra que pressa?
*
quinta-feira, 15 de maio de 2008
da última vez
líria porto
meu coração sorrateiro
faz canção de bem-te-vi
e ao som de um bolero
no laço do teu abraço
vira flor de sabugueiro
cheiro de mato
capim bravo
com a sede do deserto
pede água chega perto
rodopia tem vertigem
tem inocência de virgem
recebe a ti todo
inteiro
(não desmaiei
eu morri)
*
meu coração sorrateiro
faz canção de bem-te-vi
e ao som de um bolero
no laço do teu abraço
vira flor de sabugueiro
cheiro de mato
capim bravo
com a sede do deserto
pede água chega perto
rodopia tem vertigem
tem inocência de virgem
recebe a ti todo
inteiro
(não desmaiei
eu morri)
*
cadeia
líria porto
a borboleta tão linda
tinha a ilusão de voar
cheirava pólen
disseram que traficava
acharam traço evidente
nas cores das suas asas
condenaram-na – és lagarta
de hoje em diante rastejas
esta é a justiça dos homens
:
arrasta a sentença
*
a borboleta tão linda
tinha a ilusão de voar
cheirava pólen
disseram que traficava
acharam traço evidente
nas cores das suas asas
condenaram-na – és lagarta
de hoje em diante rastejas
esta é a justiça dos homens
:
arrasta a sentença
*
sexta-feira, 2 de maio de 2008
desencontros
líria porto
a tua pele e a minha
assim como nossas almas
fazem um tal encaixe
que às vezes eu me pergunto
porque o céu nos nega
a eternidade
desta engrenagem
quando não vens
quando me faltas
fico a vasculhar segredos
a entrelaçar meus medos
nos teus recados
*
a tua pele e a minha
assim como nossas almas
fazem um tal encaixe
que às vezes eu me pergunto
porque o céu nos nega
a eternidade
desta engrenagem
quando não vens
quando me faltas
fico a vasculhar segredos
a entrelaçar meus medos
nos teus recados
*
terça-feira, 22 de abril de 2008
jornal
líria porto
palavras vagas escorregadias
melhor deixassem o papel sem nada
ele próprio a se fazer destino
sem o amontoado
de bobagens
*
palavras vagas escorregadias
melhor deixassem o papel sem nada
ele próprio a se fazer destino
sem o amontoado
de bobagens
*
labuta
líria porto
coar nuvem co'a peneira
encharcar inteira a terra
pra depois secar o barro
viver não é um folguedo
às vezes dá um cansaço
o dia-a-dia tem peso
*
coar nuvem co'a peneira
encharcar inteira a terra
pra depois secar o barro
viver não é um folguedo
às vezes dá um cansaço
o dia-a-dia tem peso
*
vazamento
líria porto
existe um furo percebo
por onde nos desfazemos
perdemos nossa energia
esse orifício é o medo
medo da morte da vida
das dores cismas tristezas
das incertezas velhice
dos sofrimentos
das perdas
*
existe um furo percebo
por onde nos desfazemos
perdemos nossa energia
esse orifício é o medo
medo da morte da vida
das dores cismas tristezas
das incertezas velhice
dos sofrimentos
das perdas
*
na fila
líria porto
igual a lagarta em cima da folha
a moça deitada na beira do poço
o sol a banhava envolvia-lhe o corpo
a água esperasse tocasse-a depois
*
igual a lagarta em cima da folha
a moça deitada na beira do poço
o sol a banhava envolvia-lhe o corpo
a água esperasse tocasse-a depois
*
arrogância
líria porto
seu orgulho sua pose
em nada vão lhe ajudar
o nariz sempre empinado
impede-o de olhar abaixo
onde se encontram buracos
armadilhas vãos
e fossos
quem tem o rei na barriga
sabe a fezes e lombrigas
seja rico ou indigente
feito de lata ou de ouro
e a morte –– a tal fulana
esta não poupa ninguém
*
seu orgulho sua pose
em nada vão lhe ajudar
o nariz sempre empinado
impede-o de olhar abaixo
onde se encontram buracos
armadilhas vãos
e fossos
quem tem o rei na barriga
sabe a fezes e lombrigas
seja rico ou indigente
feito de lata ou de ouro
e a morte –– a tal fulana
esta não poupa ninguém
*
ao tom da pele
líria porto
o meu verso ganha cor
cheiro bom sabor tempero
toda vez que um forasteiro
abre as portas do meu corpo
e deixo que ele entre
depois quando vai embora
o versinho se descora
fica assim
tolo
sem jeito
*
o meu verso ganha cor
cheiro bom sabor tempero
toda vez que um forasteiro
abre as portas do meu corpo
e deixo que ele entre
depois quando vai embora
o versinho se descora
fica assim
tolo
sem jeito
*
de_terminado
líria porto
engoliu pus e coágulo
fecharam-se-lhe as narinas
a febre vinha voltava
cansou-o viver sem sentido
então a grande guinada
um lâmina na artéria
*
engoliu pus e coágulo
fecharam-se-lhe as narinas
a febre vinha voltava
cansou-o viver sem sentido
então a grande guinada
um lâmina na artéria
*
espaço ermo
líria porto
sentiu o amor arder sem endereço
procurou astros príncipes mendigos
não houve correspondência
desistiu evaporou-se
sumiu lentamente
seu nome?
poema
*
sentiu o amor arder sem endereço
procurou astros príncipes mendigos
não houve correspondência
desistiu evaporou-se
sumiu lentamente
seu nome?
poema
*
repescagem
líria porto
vida estranha
mudou de cima pra baixo
ou seriam os meus olhos
o jeito meu cabisbaixo?
filhos partem amores somem
as cores perdem seus tons
vermelhos ficam marrons
os azuis acinzentados
ainda bem à manhã
restou-me o canto
do pássaro
frio aumenta lua míngua
navegar tristeza é sina
não há saída
coragem
*
vida estranha
mudou de cima pra baixo
ou seriam os meus olhos
o jeito meu cabisbaixo?
filhos partem amores somem
as cores perdem seus tons
vermelhos ficam marrons
os azuis acinzentados
ainda bem à manhã
restou-me o canto
do pássaro
frio aumenta lua míngua
navegar tristeza é sina
não há saída
coragem
*
segunda-feira, 21 de abril de 2008
flagrante (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
o grilo quieto no teto
parece grilado com algum pensamento
parado no meio do pulo
não vou estragar-lhe a sesta
só mato em legítima defesa
*
o grilo quieto no teto
parece grilado com algum pensamento
parado no meio do pulo
não vou estragar-lhe a sesta
só mato em legítima defesa
*
fantástico
líria porto
leio deitada e o sono
leva-me ao inimaginável
sonho com mundos mágicos
seres alados
príncipes cascatas delícias
e nas ondas do absurdo
ultrapasso tudo
cubro-me com lençóis d'água
*
leio deitada e o sono
leva-me ao inimaginável
sonho com mundos mágicos
seres alados
príncipes cascatas delícias
e nas ondas do absurdo
ultrapasso tudo
cubro-me com lençóis d'água
*
a implacável
líria porto
mais ágeis que os pássaros ou o vento
pensamentos transportam-nos
fabricam deuses demônios asas
só não conseguem driblar
a indigitada dos tempos
*
mais ágeis que os pássaros ou o vento
pensamentos transportam-nos
fabricam deuses demônios asas
só não conseguem driblar
a indigitada dos tempos
*
revisão
líria porto
seguro com firmeza as rédeas do coração
retiro-lhe as reticências – imponho um ponto final
ao amor que agoniza
*
seguro com firmeza as rédeas do coração
retiro-lhe as reticências – imponho um ponto final
ao amor que agoniza
*
domingo, 20 de abril de 2008
minhas rimas
líria porto
não têm rumo
não se arrimam
não se arrumam
não se arredam
não se arriscam
não se arranjam
não se arrulham
não se arrepiam
mas se arrastam
arruinam-me
*
não têm rumo
não se arrimam
não se arrumam
não se arredam
não se arriscam
não se arranjam
não se arrulham
não se arrepiam
mas se arrastam
arruinam-me
*
vergonha
líria porto
escondo a timidez barulho
arrulho embrulho entulho
encalho falho empalho
atrapalho-me
e tenho um filho azul
*
escondo a timidez barulho
arrulho embrulho entulho
encalho falho empalho
atrapalho-me
e tenho um filho azul
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) líder
líria porto
peito pra frente
bunda pra trás
e o batalhão
peito pra frente
bunda pra trás
e o batalhão
atrás
*
*
plenitude
líria porto
gosto de um tanto muito tão demais tão sem cabimento
tal como um gatilho a disparar intenso extenso imenso
completamente
*
gosto de um tanto muito tão demais tão sem cabimento
tal como um gatilho a disparar intenso extenso imenso
completamente
*
lazuli
líria porto
não olhou não viu
o anil do céu abril
parece o criador
fez amor e o azul
surgiu
*
não olhou não viu
o anil do céu abril
parece o criador
fez amor e o azul
surgiu
*
sábado, 19 de abril de 2008
mirante
líria porto
soltei o corpo no mato
destravei o pensamento
pude voar ver as coisas
a montanha a terra o vento
as nuvens o verde as sementes
as flores as galhas tenras
e a ausência de gente
devolveu-me a paz
agradeci ao bom espírito
à mão invisível que me guiou
além da civilização
*
soltei o corpo no mato
destravei o pensamento
pude voar ver as coisas
a montanha a terra o vento
as nuvens o verde as sementes
as flores as galhas tenras
e a ausência de gente
devolveu-me a paz
agradeci ao bom espírito
à mão invisível que me guiou
além da civilização
*
ultimatum
líria porto
nem mas nem meio mais
menos ainda aliás
sequer desculpas poréns
ou encerramos o caso
não sem tempo
ao acaso
outros virão
nulos somenos
sem rumo
nenhuns
chegarão apesar de ti
*
nem mas nem meio mais
menos ainda aliás
sequer desculpas poréns
ou encerramos o caso
não sem tempo
ao acaso
outros virão
nulos somenos
sem rumo
nenhuns
chegarão apesar de ti
*
coleira apertada
líria porto
plantou vento - colheu nada
nem passatempo
no banco de trás igual vira-lata
sem ração e sem torrão
nem rosnava
*
plantou vento - colheu nada
nem passatempo
no banco de trás igual vira-lata
sem ração e sem torrão
nem rosnava
*
desatenções
líria porto
coloca água no fogo
separa e lava os feijões
os feios deixa-os de lado
os murchos os carunchados
bate os bifes amassa o alho
corta a cebola em rodelas
frita o torresmo as batatas
refoga arroz faz farofa
enquanto espera trabalha
prepara a mesa pra todos
:
não te demores seu moço
se se cansar faz tua mala
*
coloca água no fogo
separa e lava os feijões
os feios deixa-os de lado
os murchos os carunchados
bate os bifes amassa o alho
corta a cebola em rodelas
frita o torresmo as batatas
refoga arroz faz farofa
enquanto espera trabalha
prepara a mesa pra todos
:
não te demores seu moço
se se cansar faz tua mala
*
apagão
líria porto
não lhe deixou lembrança
fiapo cisco poeira sombra traço
risco nada
era o que havia a ser feito
pelos beijos que lhe negara
pelas grosserias proferidas
pelas noites mal dormidas
pela intensidade do bocejo
*
não lhe deixou lembrança
fiapo cisco poeira sombra traço
risco nada
era o que havia a ser feito
pelos beijos que lhe negara
pelas grosserias proferidas
pelas noites mal dormidas
pela intensidade do bocejo
*
segunda-feira, 14 de abril de 2008
sábado, 12 de abril de 2008
perfídia
líria porto
olhos de vidro
chocalho no rabo
língua bipartida
chega-nos de través
com muito veneno
igual cascavel
(o couro - cuidado
precisa ser grosso
imune às víboras)
*
olhos de vidro
chocalho no rabo
língua bipartida
chega-nos de través
com muito veneno
igual cascavel
(o couro - cuidado
precisa ser grosso
imune às víboras)
*
sexta-feira, 11 de abril de 2008
os amores de lúcio
líria porto
a água treme arrepia-se
é toda ela emoção
a pedra mantém-se firme
bem agarrada à montanha
a água desce desliza
a pedra cuida ampara-a
águas maria luiza
pedras maria eduarda
*
a água treme arrepia-se
é toda ela emoção
a pedra mantém-se firme
bem agarrada à montanha
a água desce desliza
a pedra cuida ampara-a
águas maria luiza
pedras maria eduarda
*
conclusão
líria porto
tal como a corda ruiu
sem que ninguém percebesse
por desamor ou descuido
rompeu-se o elo entre eles
ficaram sem se falar
um no quarto um no sofá
até que à porta da casa
a tabuleta – aluga-se
*
tal como a corda ruiu
sem que ninguém percebesse
por desamor ou descuido
rompeu-se o elo entre eles
ficaram sem se falar
um no quarto um no sofá
até que à porta da casa
a tabuleta – aluga-se
*
debaixo do tapete
líria porto
não gostas quando me queijo
luscofusco-me tu não vês
se agente não vale transporte
então – para quê?
*
não gostas quando me queijo
luscofusco-me tu não vês
se agente não vale transporte
então – para quê?
*
mosqueteira
líria porto
decidi ser feliz
escrevi em toda parte
eu por mim hoje e sempre
quem me quiser então venha
quem não quiser siga em frente
e nem sinta culpa
estou
mais que nunca
sob minha responsabilidade
*
decidi ser feliz
escrevi em toda parte
eu por mim hoje e sempre
quem me quiser então venha
quem não quiser siga em frente
e nem sinta culpa
estou
mais que nunca
sob minha responsabilidade
*
retalhos
líria porto
procuro-te entre as pessoas
encontro-te ora numa ora noutra
(um sorriso um olhar um dar de ombros)
apavora-me perder tuas migalhas
*
procuro-te entre as pessoas
encontro-te ora numa ora noutra
(um sorriso um olhar um dar de ombros)
apavora-me perder tuas migalhas
*
comandante
líria porto
não crês em deus e nem eu
no entanto –– fidel –– protejam-te o céu
e as estrelas
*
não crês em deus e nem eu
no entanto –– fidel –– protejam-te o céu
e as estrelas
*
vovô
líria porto
bigodes cabelos brancos
mãos postas cara inocente
posava na fotografia
como um deus brincalhão
*
bigodes cabelos brancos
mãos postas cara inocente
posava na fotografia
como um deus brincalhão
*
adolescente
líria porto
aquele amor panfletário
bem-humorado gozoso
foi perdendo a alegria
ficando desanimado
não quero não podes não vais
fez muxoxo cena birra
e por coisas pequeninas
transformou-se em sacrifício
eu desisti desististe
arranjei um namorado
partiste não mais te vi
nunca mais tive notícia
*
aquele amor panfletário
bem-humorado gozoso
foi perdendo a alegria
ficando desanimado
não quero não podes não vais
fez muxoxo cena birra
e por coisas pequeninas
transformou-se em sacrifício
eu desisti desististe
arranjei um namorado
partiste não mais te vi
nunca mais tive notícia
*
papelão
líria porto
manobra suas carências
tal como deus poderoso
ela ali – em seu regaço
entrega-se de alma e corpo
toma posse toma conta
suga-lhe o caldo o sabor
e ela vira bagaço
e ele some no mundo
*
tal como deus poderoso
ela ali – em seu regaço
entrega-se de alma e corpo
toma posse toma conta
suga-lhe o caldo o sabor
e ela vira bagaço
e ele some no mundo
*
quinta-feira, 10 de abril de 2008
folie
líria porto
o sol dormia
sonhava com as estrelas
a lua cheia e grávida
chamou o sol às falas
*
o sol dormia
sonhava com as estrelas
a lua cheia e grávida
chamou o sol às falas
*
passarinhando
líria porto
ando vôo
no pensamento
nas asas do vento
sonho
do beiral da alma
ao colo do moço
coração à boca
cúmplices
*
ando vôo
no pensamento
nas asas do vento
sonho
do beiral da alma
ao colo do moço
coração à boca
cúmplices
*
quarta-feira, 9 de abril de 2008
desnorteio
líria porto
cabeça transtornada
ideias obtusas
falo descalabros
rabisco garatujas
qual um marujo
em primeira
viagem
*
cabeça transtornada
ideias obtusas
falo descalabros
rabisco garatujas
qual um marujo
em primeira
viagem
*
maria bonita
líria porto
acendia lampião
sabia da sua força
e mesmo que tropeçasse
não levava tombos
caminhava
a soprar feridas a sonhar
seus sonhos
*
acendia lampião
sabia da sua força
e mesmo que tropeçasse
não levava tombos
caminhava
a soprar feridas a sonhar
seus sonhos
*
flor da pele
líria porto
a palma da minha mão parece seda da china
azar o teu não tocá-la deixá-la roçar o teu corpo
nas noites findas
*
a palma da minha mão parece seda da china
azar o teu não tocá-la deixá-la roçar o teu corpo
nas noites findas
*
terça-feira, 8 de abril de 2008
nostalgia
líria porto
ao me haver triste
sem razão determinada
fico a pensar em minh'alma
tão cheia de cicatrizes
em quantas foram as feridas
lá de longe doutras vidas
quem as fez
como sangraram
dá-me então um tal vazio
igual se as águas de um rio
em plena enchente
secassem
*
ao me haver triste
sem razão determinada
fico a pensar em minh'alma
tão cheia de cicatrizes
em quantas foram as feridas
lá de longe doutras vidas
quem as fez
como sangraram
dá-me então um tal vazio
igual se as águas de um rio
em plena enchente
secassem
*
mau-tempo
líria porto
madrugada carrancuda
não quis acender o sol
manchou o arrebol de cinza
fez cara brava ranzinza
mandou-o dormir de volta
*
madrugada carrancuda
não quis acender o sol
manchou o arrebol de cinza
fez cara brava ranzinza
mandou-o dormir de volta
*
lusco-fusco
líria porto
as madrugadas os crepúsculos
a beleza entranhada na penumbra
os filhos mestiços da noite e do dia
são lindos
*
as madrugadas os crepúsculos
a beleza entranhada na penumbra
os filhos mestiços da noite e do dia
são lindos
*
a prole
líria porto
empurradoa de mau jeito
uns brutamontes machões
grudada à nossa saia
dependentes e frágeis
:
os nossos filhos e filhas
melhor deixá-los crescer
respeitar-lhes as tendências
as vontades os talentos
(e amá-los)
*
empurradoa de mau jeito
uns brutamontes machões
grudada à nossa saia
dependentes e frágeis
:
os nossos filhos e filhas
melhor deixá-los crescer
respeitar-lhes as tendências
as vontades os talentos
(e amá-los)
*
sexta-feira, 4 de abril de 2008
quinta-feira, 3 de abril de 2008
ofensa
líria porto
jamais diga a verdade aos vaidosos
mesmo que insistam – eles preferem bajulação e lisonja
à sinceridade dos amigos
*
jamais diga a verdade aos vaidosos
mesmo que insistam – eles preferem bajulação e lisonja
à sinceridade dos amigos
*
terça-feira, 1 de abril de 2008
quarta-feira, 26 de março de 2008
sexta-feira, 21 de março de 2008
sem rumo
líria porto
lá no lugar onde vive
os seres entram em conflito
por qualquer coisa-me-dá
deixou de ler os jornais
não vê o noticiário
em busca de alguma paz
parece bicho-do-mato
acuado sem saída
em meio às balas perdidas
o corpo barco à deriva
enquanto a morte não chega
fica assim - ao deus-dará
*
lá no lugar onde vive
os seres entram em conflito
por qualquer coisa-me-dá
deixou de ler os jornais
não vê o noticiário
em busca de alguma paz
parece bicho-do-mato
acuado sem saída
em meio às balas perdidas
o corpo barco à deriva
enquanto a morte não chega
fica assim - ao deus-dará
*
carne de pescoço
líria porto
megera era bela nariz empinado
o rei na barriga
quisera vê-la velha a levar no dorso
fardos de remorso
como peso morto
*
megera era bela nariz empinado
o rei na barriga
quisera vê-la velha a levar no dorso
fardos de remorso
como peso morto
*
quinta-feira, 20 de março de 2008
madalena
líria porto
tal e qual mulher da vida
das que trocam os seus corpos por vinténs
auscultou as almas loucas desvalidas
fez-se roupa maltrapilha de ninguéns
mitigou a fome a sede dos mendigos
afogou-se em tristeza sofrimento
muitos bêbados vomitaram em seu colo
foi abrigo de leprosos de bandidos
copulou com viciados assassinos
mas não pode nem consegue
ser feliz
*
tal e qual mulher da vida
das que trocam os seus corpos por vinténs
auscultou as almas loucas desvalidas
fez-se roupa maltrapilha de ninguéns
mitigou a fome a sede dos mendigos
afogou-se em tristeza sofrimento
muitos bêbados vomitaram em seu colo
foi abrigo de leprosos de bandidos
copulou com viciados assassinos
mas não pode nem consegue
ser feliz
*
terça-feira, 18 de março de 2008
partida
líria porto
meia-noite
meia-lua
meia-idade
meia calça
meia taça
meia boca
meia sola
meia hora
meia entrada
:
metades
de noz
*
meia-noite
meia-lua
meia-idade
meia calça
meia taça
meia boca
meia sola
meia hora
meia entrada
:
metades
de noz
*
completude
líria porto
vulcões em erupção
a lava incandescente
as chamas as encostas
as grutas
depois o sono
o amor saciado
as águas serenas
a quietude
*
vulcões em erupção
a lava incandescente
as chamas as encostas
as grutas
depois o sono
o amor saciado
as águas serenas
a quietude
*
perdição
líria porto
se eu for a tua amiga
vou te dar mais do que beijo
vou te entregar a montanha
de minas terás o queijo
vou te segurar a mão
engomar tua camisa
refrescar a tua água
fazer o teu doce diet
vou te dar meu travesseiro
o meu colchão a coberta
deixar contigo meu lenço
cantar para a tua festa
mas se eu for a namorada
vais ter tanto prejuízo
perderás o teu juízo
no teu colo eu vou sentar
vou querer da tua boca
beijos beijos e mais beijos
vou deitar na tua cama
roubar o teu coração
vasculhar tuas gavetas
usar teu pente o perfume
provocar o teu ciúme
deixar-te desesperado
*
se eu for a tua amiga
vou te dar mais do que beijo
vou te entregar a montanha
de minas terás o queijo
vou te segurar a mão
engomar tua camisa
refrescar a tua água
fazer o teu doce diet
vou te dar meu travesseiro
o meu colchão a coberta
deixar contigo meu lenço
cantar para a tua festa
mas se eu for a namorada
vais ter tanto prejuízo
perderás o teu juízo
no teu colo eu vou sentar
vou querer da tua boca
beijos beijos e mais beijos
vou deitar na tua cama
roubar o teu coração
vasculhar tuas gavetas
usar teu pente o perfume
provocar o teu ciúme
deixar-te desesperado
*
contradições
líria porto
não há correntes que me prendam
muros que me cerquem
homens que me oprimam
não tenho fronteiras –– sou liberta
no entanto
enraízo-me na montanha que me soterra
um rio me inunda deixa-me submersa
e da poesia sou escrava
prisioneira
*
não há correntes que me prendam
muros que me cerquem
homens que me oprimam
não tenho fronteiras –– sou liberta
no entanto
enraízo-me na montanha que me soterra
um rio me inunda deixa-me submersa
e da poesia sou escrava
prisioneira
*
terça-feira, 11 de março de 2008
viciados
líria porto
os mesmos passos caminhos gestos atitudes
e permanecem o sarro o borrão o tremor
de sempre
e ficamos cegos
e continuamos escravos
*
os mesmos passos caminhos gestos atitudes
e permanecem o sarro o borrão o tremor
de sempre
e ficamos cegos
e continuamos escravos
*
segunda-feira, 10 de março de 2008
livre-arbítrio
líria porto
não pedi tua partida
não pedirei teu regresso
cada qual sabe de si
todos seus erros e esses
*
não pedi tua partida
não pedirei teu regresso
cada qual sabe de si
todos seus erros e esses
*
quinta-feira, 6 de março de 2008
identificação
líria porto
entre amigos não há constrangimentos
sempre se retoma o momento anterior
é uma alegria receber e enviar notícias
e nada se iguala ao prazer à felicidade
do reencontro
*
entre amigos não há constrangimentos
sempre se retoma o momento anterior
é uma alegria receber e enviar notícias
e nada se iguala ao prazer à felicidade
do reencontro
*
tiro de letra
líria porto
não quer não quer
se vier será bem-vindo
se faltar tem o direito
não nasceu grudado em mim
corpo caminha
sem lamento sem rancor
coração é porta-joias
bugiganga é noutro pouso
(a vida sem trambolho)
*
não quer não quer
se vier será bem-vindo
se faltar tem o direito
não nasceu grudado em mim
corpo caminha
sem lamento sem rancor
coração é porta-joias
bugiganga é noutro pouso
(a vida sem trambolho)
*
quarta-feira, 5 de março de 2008
é simples
líria porto
batatinha quando nasce
espalha ramas no chão
meu amor não vás embora
estou cheio de vazio
não me peças um soneto
não sei pintar aquarelas
a minha alma devaneia
andarilha pela terra
as palavras me embaraçam
eu tropeço aos pés da letra
quisera escrever bonito
dar-te o verso mais perfeito
fica
*
batatinha quando nasce
espalha ramas no chão
meu amor não vás embora
estou cheio de vazio
não me peças um soneto
não sei pintar aquarelas
a minha alma devaneia
andarilha pela terra
as palavras me embaraçam
eu tropeço aos pés da letra
quisera escrever bonito
dar-te o verso mais perfeito
fica
*
compreensão
líria porto
passa o tempo
passa a idade
nosso corpo se acomoda
o espírito no entanto
aprimora-se cria luz
rompe as barras da matéria
entende a miséria
dos homens
*
passa o tempo
passa a idade
nosso corpo se acomoda
o espírito no entanto
aprimora-se cria luz
rompe as barras da matéria
entende a miséria
dos homens
*
à moda antiga
líria porto
se eu pudesse ah se eu pudesse
como aquela ave ter um par de asas
ia para as grimpas do ipê amarelo
e jogava as flores
sobre o teu telhado
se eu soubesse ah se eu soubesse
cantar tão bonito quanto o sabiá
afiava o bico na tua janela
gorjeava alto
para te encantar
se tu quisesses ah se tu quisesses
eu faria um ninho bem no teu jardim
rezava uma prece para o azul celeste
que felicidade
viver junto a ti
*
se eu pudesse ah se eu pudesse
como aquela ave ter um par de asas
ia para as grimpas do ipê amarelo
e jogava as flores
sobre o teu telhado
se eu soubesse ah se eu soubesse
cantar tão bonito quanto o sabiá
afiava o bico na tua janela
gorjeava alto
para te encantar
se tu quisesses ah se tu quisesses
eu faria um ninho bem no teu jardim
rezava uma prece para o azul celeste
que felicidade
viver junto a ti
*
sórdidos
líria porto
como se fora um escarro um cuspe
arrastaram o corpo do pequeno anjo
deixaram rastros de sangue e martírio
na alma de pedra da metrópole
diante da barbárie da maldade explícita
diz-me eu te peço o que fazer agora
a terra tão bonita rica maravilhas
é palco de torturas
homens-feras rosnam
*
como se fora um escarro um cuspe
arrastaram o corpo do pequeno anjo
deixaram rastros de sangue e martírio
na alma de pedra da metrópole
diante da barbárie da maldade explícita
diz-me eu te peço o que fazer agora
a terra tão bonita rica maravilhas
é palco de torturas
homens-feras rosnam
*
passarinho
líria porto
no azul a liberdade
de voar como se queira
mudar de forma lugar
recortar bordas e beiras
trovejar soltar faísca
permitir-se o arco-íris
o sol as nuvens as pipas
os aviões pára-quedas
asas-deltas devaneios
mergulhos sonhos
delícias
no azul a liberdade
de voar como se queira
mudar de forma lugar
recortar bordas e beiras
trovejar soltar faísca
permitir-se o arco-íris
o sol as nuvens as pipas
os aviões pára-quedas
asas-deltas devaneios
mergulhos sonhos
delícias
(minhas penas são gaiolas)
*
*
desbandeirada
líria porto
não quero nada
nem ir para pasárgada
passei da idade
de seguir viagem
aqui – sozinha
sou rainha
*
não quero nada
nem ir para pasárgada
passei da idade
de seguir viagem
aqui – sozinha
sou rainha
*
humanização
líria porto
aquecer as pedras
colocá-las ao sol
abraçar os velhos
são eles o sol
quarar nossos versos
deixá-los ao sol
enluarar
*
aquecer as pedras
colocá-las ao sol
abraçar os velhos
são eles o sol
quarar nossos versos
deixá-los ao sol
enluarar
*
faróis
líria porto
não deixem que a luz se apague
acendam velas e velas
permitam que elas propaguem
o fogo que agora é delas
de lá de onde estiverem
perceberão o clarão
daqueles homens mulheres
que levam tochas nas mãos
*
não deixem que a luz se apague
acendam velas e velas
permitam que elas propaguem
o fogo que agora é delas
de lá de onde estiverem
perceberão o clarão
daqueles homens mulheres
que levam tochas nas mãos
*
pesquisa_dor
líria porto
pássaro no meio do mato
assim esse homem no seu habitat
deseja abarcar desvendar
entender tudo
sons letras palavras
metáforas significados
*
pássaro no meio do mato
assim esse homem no seu habitat
deseja abarcar desvendar
entender tudo
sons letras palavras
metáforas significados
*
grafite
líria porto
letras palavras versos
podem causar o avesso
daquilo que pretendíamos
(risco)
é preciso estar atento
treinar bastante a contento
conferir fim e começo
(rabisco)
acaso não dominemos
as rachaduras as frinchas
cobri-las com tinta fresca
(borrão)
*
letras palavras versos
podem causar o avesso
daquilo que pretendíamos
(risco)
é preciso estar atento
treinar bastante a contento
conferir fim e começo
(rabisco)
acaso não dominemos
as rachaduras as frinchas
cobri-las com tinta fresca
(borrão)
*
segunda-feira, 3 de março de 2008
retrato de família
líria porto
a mulher vestida de preto
com bordados de strass
o marido de terno azul claro
e sol na lapela
são pais das crianças mestiças
aurora e crepúsculo
*
a mulher vestida de preto
com bordados de strass
o marido de terno azul claro
e sol na lapela
são pais das crianças mestiças
aurora e crepúsculo
*
impassível
líria porto
viu-me grávida
com filhos ao colo
gorda
magra
nua
vestida
descalça
de saltos
chinelos
sandálias
triste
alegre
doente
saudável
apressada
(in)feliz
risonha
chorosa
exausta
grisalha
o que espera
um corredor
ver-nos
mortos?
*
viu-me grávida
com filhos ao colo
gorda
magra
nua
vestida
descalça
de saltos
chinelos
sandálias
triste
alegre
doente
saudável
apressada
(in)feliz
risonha
chorosa
exausta
grisalha
o que espera
um corredor
ver-nos
mortos?
*
sabedoria
líria porto
toda palavra
precisa ser lapidada
esmerilada polida
lavada com muita água
pra depois ser engolida
*
toda palavra
precisa ser lapidada
esmerilada polida
lavada com muita água
pra depois ser engolida
*
autômato
líria porto
sem calor nem frio
sem amar ou odiar ninguém
sem se importar com nada
ou procurar saída
está morto
vivo
*
sem calor nem frio
sem amar ou odiar ninguém
sem se importar com nada
ou procurar saída
está morto
vivo
*
a idade encolhe o son(h)o
líria porto
um azul cheio de noite
o cheiro bom da aurora
começam a encantar os galos
a despertar os cachorros
assanhar os passarinhos
ouve-se algum motor
postes apagam-se aos poucos
eu dou um pulo
da cama
*
um azul cheio de noite
o cheiro bom da aurora
começam a encantar os galos
a despertar os cachorros
assanhar os passarinhos
ouve-se algum motor
postes apagam-se aos poucos
eu dou um pulo
da cama
*
benfeitor
líria porto
igual água estagnada
imprópria para consumo
estava a lua sem alma
sem alegria e sem lume
um vento soprou a nuvem
vestiu-a com roupa rendada
linda guirlanda de flores
espalhou sua claridade
pelos campos
e colinas
*
igual água estagnada
imprópria para consumo
estava a lua sem alma
sem alegria e sem lume
um vento soprou a nuvem
vestiu-a com roupa rendada
linda guirlanda de flores
espalhou sua claridade
pelos campos
e colinas
*
horizontes
líria porto
a roupa no cabide
espera um corpo
um convite
a roupa na mala
tem outra expectativa
:
seguir viagem
a roupa no cesto está dentro
ou fora do contexto?
*
a roupa no cabide
espera um corpo
um convite
a roupa na mala
tem outra expectativa
:
seguir viagem
a roupa no cesto está dentro
ou fora do contexto?
*
roda
líria porto
tais como passos de dança
vem um verso outro e outro
e quando nos damos conta
eis a ciranda
*
tais como passos de dança
vem um verso outro e outro
e quando nos damos conta
eis a ciranda
*
terça-feira, 19 de fevereiro de 2008
cooper
líria porto
seguia eu sempre alerta
como manda o figurino
minh'alma qual peregrino
caminhava atrás de mim
pensei em ti passarinho
a bicares-me o umbigo
num dia frio
finquei o pé insisti
prosseguia peito aberto
na largueza da avenida
pensava na nossa vida
eu aqui tu por aí
e a saudade sem-vergonha
emparelhou-se comigo
deu vontade de chorar
perdida na turbulência
fiquei triste cabisbaixa
a matutar vida besta
eu te quero tu me queres
podia ir te buscar
não dou o braço a torcer
briga tola aquela nossa
ciúme de folha morta
coisa pouca corriqueira
e foi nesta brincadeira
que tropecei
e caí
*
seguia eu sempre alerta
como manda o figurino
minh'alma qual peregrino
caminhava atrás de mim
pensei em ti passarinho
a bicares-me o umbigo
num dia frio
finquei o pé insisti
prosseguia peito aberto
na largueza da avenida
pensava na nossa vida
eu aqui tu por aí
e a saudade sem-vergonha
emparelhou-se comigo
deu vontade de chorar
perdida na turbulência
fiquei triste cabisbaixa
a matutar vida besta
eu te quero tu me queres
podia ir te buscar
não dou o braço a torcer
briga tola aquela nossa
ciúme de folha morta
coisa pouca corriqueira
e foi nesta brincadeira
que tropecei
e caí
*
sábado, 16 de fevereiro de 2008
festejo
líria porto
no velório
estavam presentes
a viúva uma uva
alguns parentes
e mil pretendentes
muitas coroas
muita conversa
muitas saudades
muita bebida
muita paquera
*
no velório
estavam presentes
a viúva uma uva
alguns parentes
e mil pretendentes
muitas coroas
muita conversa
muitas saudades
muita bebida
muita paquera
*
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008
quebra-mar
líria porto
postou-se alguém entre nós
eu percebo sua sombra
e tu não me olhas
nos olhos
*
postou-se alguém entre nós
eu percebo sua sombra
e tu não me olhas
nos olhos
*
terça-feira, 12 de fevereiro de 2008
no jardim dos homens
líria porto
nasce uma flor
pequena
estranha o dia o calor
chora ao primeiro contato
que mundo é esse?
aqui é o útero da terra
contaminado violento
vieste ajudar-nos
a torná-lo belo
*
nasce uma flor
pequena
estranha o dia o calor
chora ao primeiro contato
que mundo é esse?
aqui é o útero da terra
contaminado violento
vieste ajudar-nos
a torná-lo belo
*
igualdade
líria porto
dispensamos dias especiais
agradecemos e recusamos homenagens
não nos contentamos com migalhas
*
dispensamos dias especiais
agradecemos e recusamos homenagens
não nos contentamos com migalhas
*
segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008
drible
líria porto
aquele perrengue
foi só arrelia
ela não o queria
estava carente
então insistiu
ele a recusou
tomou como ofensa
pediu implorou
e quando ele veio
jogou-o a escanteio
não o quis
feliz de quem foge
de miss
*
aquele perrengue
foi só arrelia
ela não o queria
estava carente
então insistiu
ele a recusou
tomou como ofensa
pediu implorou
e quando ele veio
jogou-o a escanteio
não o quis
feliz de quem foge
de miss
*