domingo, 30 de setembro de 2007

nota de falecimento

líria porto

o limoeiro morreu
e com ele as floradas
as limonadas os chás
as noites perfumadas

*

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

contatos

líria porto

surgimos d'outras galáxias
ficamos nus nas estrelas
nos anéis de luz

se não vieres vieste
onde eu não for estarei
assim foi assim será

sempre

*

voragem

líria porto

no avesso das vísceras
vinho vertigem vagidos vômito
vácuos

*

terça-feira, 25 de setembro de 2007

refúgio

líria porto

onde se possa ouvir os grilos
o vento brinque com as folhas
verdes farfalhem cochichem
haja chuva lua sol 
brisa
água fresca

um lugar 
um labirinto
com passarinhos 
travesseiros de penas
lençóis e braços macios

*

jeito

líria porto

sem pontos nem reticências
d_estilo letras minúsculas

*

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

relâmpagos de uma noite atormentada

líria porto

ao ver a barata
a ponta do sapato
cometeu assassinato
isto é o pé direito
pois que o esquerdo
saiu para enterrá-la

terremoto
maremoto
motosserra
motoboy
mato contínuo
enxada
machado

não importa o que pensem
somos donos da nossa loucura
e da nossa lucidez

faladeiras e serpentes 
dão no mesmo

freiras mudam de hábito

*

galáxias

líria porto

tantas janelas
a minha é uma fresta
uma greta um furo
a mostrar-me o mundo
a ensinar-me que todos
formamos conjuntos
e embora pequenos
nós somos imensos
tais como a floresta
o mar
o deserto
o planeta

o i.n.f.i.n.i.t.o

*

versos para lavínia

líria porto

vou aquecer teus pezinhos
calçá-los com minhas mãos
tricotar tanto carinho
em cada ponto da meia
vou tecer uma estrelinha
com varinha de condão

pés quentes dão sorte
princesinha

*

libertação

líria porto

bom-dia seu chico
bom-dia seu chico
canta o pássaro cativo
na varanda de eliana
:
abro a porta da gaiola

*

sortilégio

líria porto

o caminho aos dias findos
quando o inverno nos chega
alva neve nossos pelos
nuvem solta o pensamento
galhos frágeis nossos braços
folhas soltas nosso tempo
haja sopa uma coberta
muito amor
              nenhum espelho

*

domingo, 23 de setembro de 2007

(para o livro sem pecado não tem salvação) dilemas

líria porto

entre a cruz e a espada
inda que mal comparando
um violão atuava
tangia a batina do padre
e a farda do soldado

maria é nome de santa
e rosa é nome de flor
maria rosa mundana
seguia assim sua sina
dois amores na surdina

gostava o padre do acorde
o soldado do compasso
e entre um altar e um catre
as cordas daquele corpo
emitiam belos sons

os bemóis na sacristia
sustenidos no quartel
dois fortes a moça invadia
o céu queria de um
ao outro impunha a guerra

o padre deixou a igreja
o soldado desertou
rosa perdeu o interesse
foi fincar os seus espinhos
no evangelho do pastor

*

índole

líria porto

as línguas lambem é certo
porém se tantas alisam
outras degradam e ferem
proferem sentenças perversas
malignas indignas ferinas
malévolas línguas de víboras
de venenosas serpentes

*

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

artista é aquele que cria belezas
como se respirasse

*

terça-feira, 18 de setembro de 2007

prenúncio

líria porto

foi um sonho de paz
meu amor te curava
teu amor me fazia bem
caminhávamos
a terra era fértil
a água limpa
havia pássaros
gente feliz

*

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

aurora

líria porto



a janela – esta tela mágica
o pintor dá asas a pincéis errantes
azul roxo lilás amarelo
branco
a cada novo olhar
mesclam-se as nuances

*

vazio

líria porto

não quero a mim
não quero a ti
não quero ninguém

direi não ao sol
não quero a morte
não quero a vida
não quero

não há silêncio
não há barulho
não ouço
não falo
não canto
não respiro

hoje
comigo
só a solidão

*

condenação

líria porto

se um aventureiro
um desinfeliz
transbordar teus olhos
olhos de turca
reza por ele

se um desalmado
um zé ninguém
ferir teu coração
olhos de turca
pede por ele

se um homem qualquer
nobre ou plebeu
exterminar teus sonhos
ah olhos de turca
não haverá reza
não haverá súplica
não haverá milagre
que o salve da minha
maldição

*

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

alívio

líria porto

quando fico triste visto o casaco
aquele que abrigou em hora ingrata
o corpo sofredor de minha mãe

então eu me abraço e me consolo
e choro tal qual fosse
uma criança

*

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

fumo de rolo

líria porto

quantas vezes
enquanto fumavas
eu virei fumaça
entre teus dedos

*

sábado, 8 de setembro de 2007

monturo

líria porto

procuro palavras entre as pedras
vasculho o entulho
a rima intromete-se
nada de extraordinário
apenas encontros vocálicos
sem valor poético

(o canário no alto da árvore
esse é mestre)

*

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

dissimulada

líria porto

sem sal açúcar tempero
preparava com esmero
a sua vidinha insossa

queria ser como
as hóstias
:
água farinha
e bênçãos

*

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

retorno

líria porto

o caminho de volta
por mais difícil que seja
é trajeto conhecido
conduz-nos de alguma forma
às nossas raízes

*

sábado, 1 de setembro de 2007

incondicional

líria porto

precisou doer-lhe cru
sentir-se em carne viva
para entender sentimentos
:
bom mesmo é amor ameno
amor fraterno materno
amor de avó e de avô

*

dedicatória

nus descampados (im)puros
fiamos o plenilúnio

(líria porto)



*















quem tem pena de passarinho
é passarinho

(líria porto)

Arquivo do blog