líria porto
quando o compadre se foi
de tanta tristeza
a comadre secou as lágrimas
no ombro d'outro homem
*
sexta-feira, 27 de novembro de 2015
em família
líria porto
cinzas ou ossos
(por mim tanto faz)
quando chegar a hora
joguem em qualquer lugar
ou façam sabão
cinzas ou ossos
(por mim tanto faz)
quando chegar a hora
joguem em qualquer lugar
ou façam sabão
*
quinta-feira, 26 de novembro de 2015
quarta-feira, 25 de novembro de 2015
ovelha
líria porto
tosaram-me a lã
e agora
sem meias melenas
torro os miolos
e espero
o capim crescer
tosaram-me a lã
e agora
sem meias melenas
torro os miolos
e espero
o capim crescer
*
terça-feira, 24 de novembro de 2015
sábado, 21 de novembro de 2015
conservadores
líria porto
o mofo sobre o telhados do casarão
*
talvez reflita o que vai pela cabeça dos proprietários
essa gente que conserva teias de aranha e poeira
no sótão e no porão das ideias
essa gente que conserva teias de aranha e poeira
no sótão e no porão das ideias
*
quarta-feira, 18 de novembro de 2015
mudança de hábito
líria porto
o véu branco
o manto escuro
o celular no ouvido
a freira olvidou cristo
ou o céu ficou moderno?
o véu branco
o manto escuro
o celular no ouvido
a freira olvidou cristo
ou o céu ficou moderno?
*
o crime
líria porto
cadê o rio que tava aqui? a samarco bebeu
cadê a samarco? foi pro mato
cadê o mato? a samarco comeu
cadê a samarco? foi ao povoado
cadê o povoado? a samarco engoliu
cadê a samarco? foi matar peixe
cadê o peixe? a samarco matou
cadê a samarco? tá na lama
cadê a lama?
:
tá por aí
por aí
por aí
cadê o rio que tava aqui? a samarco bebeu
cadê a samarco? foi pro mato
cadê o mato? a samarco comeu
cadê a samarco? foi ao povoado
cadê o povoado? a samarco engoliu
cadê a samarco? foi matar peixe
cadê o peixe? a samarco matou
cadê a samarco? tá na lama
cadê a lama?
:
tá por aí
por aí
por aí
*
a sorrateira
líria porto
sempre a rondar os viventes
e de repente ela zás
cata um
leva consigo
pra terra do nunca mais
sempre a rondar os viventes
e de repente ela zás
cata um
leva consigo
pra terra do nunca mais
*
persona
líria porto
aqui ali não sei onde
busco palavras pros versos
não as encontro espero
espero espero
espero-las
aqui ali não sei onde
busco palavras pros versos
não as encontro espero
espero espero
espero-las
*
o capitalista
líria porto
não era louco
era mau
trocava a vida
por lucro
não a sua
a dos outros
e punha tudo no bolso
aquele desgraçado
não era louco
era mau
trocava a vida
por lucro
não a sua
a dos outros
e punha tudo no bolso
aquele desgraçado
*
cataplasma
líria porto
pus a compressa sem pressa
o furúnculo veio a furo – o vulcão soltou a lava
aquela baba
:
que alívio
pus a compressa sem pressa
o furúnculo veio a furo – o vulcão soltou a lava
aquela baba
:
que alívio
*
terça-feira, 17 de novembro de 2015
extremos
líria porto
por amor
deu a roupa do corpo
tornou-se subalterna
pensou que era amor
e não era
:
por desamor
tornou-se uma megera
por amor
deu a roupa do corpo
tornou-se subalterna
pensou que era amor
e não era
:
por desamor
tornou-se uma megera
*
segunda-feira, 16 de novembro de 2015
bastilha
líria porto
vós paris um mundo vil
não podeis mais renegá-lo
ristes dos pobres
dos humildes
e sentis nos próprios calos
o peso dos vossos pés
e dos vossos passos
vós paris um mundo vil
não podeis mais renegá-lo
ristes dos pobres
dos humildes
e sentis nos próprios calos
o peso dos vossos pés
e dos vossos passos
*
logro
líria porto
três blefes regem as guerras
e o homem cai como pato –– barras de ouro
de terra e também barras
de saia
três blefes regem as guerras
e o homem cai como pato –– barras de ouro
de terra e também barras
de saia
*
amolação
líria porto
tem gente que não vive sem polêmica
tem gente que não vive sem picuinha
tem gente muito chata
insistente
igual motorzinho de dentista
tem gente que não vive sem polêmica
tem gente que não vive sem picuinha
tem gente muito chata
insistente
igual motorzinho de dentista
*
sábado, 14 de novembro de 2015
sexta-feira, 13 de novembro de 2015
ilusões
líria porto
andei
atrás
do impossível
feri
os pés
com cavacos
sangrei
até
esvair-me
deixei
no chão
os vestígios
dos sonhos
despedaçados
andei
atrás
do impossível
feri
os pés
com cavacos
sangrei
até
esvair-me
deixei
no chão
os vestígios
dos sonhos
despedaçados
*
quinta-feira, 12 de novembro de 2015
sujeira
líria porto
santa máquina maria
lava roupa muito bem
não exige quase nada
sabão água amaciante
pouquíssima energia
nenhuma manutenção
santa máquina maria
lava roupa muito bem
não exige quase nada
sabão água amaciante
pouquíssima energia
nenhuma manutenção
*
quarta-feira, 11 de novembro de 2015
terça-feira, 10 de novembro de 2015
das mediocridades
líria porto
um rio de lama –– sujeira tóxica
(crime inafiançável)
e a gente a fazer conta da poeira nos móveis
das manchinhas no lençol
*
um rio de lama –– sujeira tóxica
(crime inafiançável)
e a gente a fazer conta da poeira nos móveis
das manchinhas no lençol
*
segunda-feira, 9 de novembro de 2015
domingo, 8 de novembro de 2015
raios me partam
líria porto
a nuvem esbarrou na nuvem
ouviu-se o maior trovão
pareceu coisa maciça
pedra que virou brita
arrufos do vapor
a nuvem esbarrou na nuvem
ouviu-se o maior trovão
pareceu coisa maciça
pedra que virou brita
arrufos do vapor
*
mãos à obra
líria porto
para o projeto eu já tenho
um caderno cor de terra
(vindo de rio claro)
a estrofe de lápis verdes
e versos represados
eu vou fazer um bom livro
mesmo que demore
(assim eu adio a morte)
deixá-lo pra maricota
deixá-lo para o francisco
para o projeto eu já tenho
um caderno cor de terra
(vindo de rio claro)
a estrofe de lápis verdes
e versos represados
eu vou fazer um bom livro
mesmo que demore
(assim eu adio a morte)
deixá-lo pra maricota
deixá-lo para o francisco
*
mariana
líria porto
quem lava o estouro da lama
quem ressuscita os mortos
quem purifica o chão
quem desenterra a esperança
quem seca as lágrimas
:
quem paga?
quem lava o estouro da lama
quem ressuscita os mortos
quem purifica o chão
quem desenterra a esperança
quem seca as lágrimas
:
quem paga?
*
sexta-feira, 6 de novembro de 2015
descalços
líria porto
tapete vermelho
lava incandescente
bolhas nos pés afeitos
às derrotas
:
sol nos olhos – cegueira – e no pódio
os sadomasoquistas
tapete vermelho
lava incandescente
bolhas nos pés afeitos
às derrotas
:
sol nos olhos – cegueira – e no pódio
os sadomasoquistas
*
quarta-feira, 4 de novembro de 2015
poda
líria porto
vou podar tuas ramas
assim tu
vou podar tuas ramas
assim tu
tão mimada tão rebelde
tão parecida comigo
não derramarás sobre mim
tuas vontades
tuas manhas
tão parecida comigo
não derramarás sobre mim
tuas vontades
tuas manhas
*
inflável
líria porto
a bola rola pra lá
pra cá
parece brincar sozinha
será o vento algum anjo
alguma alma penada
um fantasminha?
a bola rola pra lá
pra cá
parece brincar sozinha
será o vento algum anjo
alguma alma penada
um fantasminha?
*
ah é?
líria porto
perguntas tolas nocauteiam a conversa
perguntas sábias revigoram-na – mesmo que não tenhamos
as respostas
perguntas tolas nocauteiam a conversa
perguntas sábias revigoram-na – mesmo que não tenhamos
as respostas
*
treta
líria porto
chamava as concorrentes de bodinhas
ela própria uma cabra velha do rebanho
do coronel
chamava as concorrentes de bodinhas
ela própria uma cabra velha do rebanho
do coronel
*
terça-feira, 3 de novembro de 2015
água com açúcar e uma gota de fel
líria porto
conheci-o em novembro
em dezembro mandou flores
mas eu tinha compromisso
com outro homem
trocamos cartas bilhetes
durante meses e meses
espalhou-se o nosso amor
como hera na parede
durante o chove não molha
apareceu julieta
foi assim que aconteceu
o romance do milênio
conheci-o em novembro
em dezembro mandou flores
mas eu tinha compromisso
com outro homem
trocamos cartas bilhetes
durante meses e meses
espalhou-se o nosso amor
como hera na parede
durante o chove não molha
apareceu julieta
foi assim que aconteceu
o romance do milênio
*
ao poeta
líria porto
quando eu me flor
despetala-me
guarda-me dentro do livro
e eu me seque às palavras
que me escreveste
e que li
quando eu me flor
despetala-me
guarda-me dentro do livro
e eu me seque às palavras
que me escreveste
e que li
*
lágrimas de crocodilo
líria porto
de que lhe adiantam
o caixão de luxo as coroas de flores
a música póstuma
se jamais lhe fizeste serenatas
enviaste-lhe bombons ou buquês
de rosas
(só se foi para aliviar
a culpa)
de que lhe adiantam
o caixão de luxo as coroas de flores
a música póstuma
se jamais lhe fizeste serenatas
enviaste-lhe bombons ou buquês
de rosas
(só se foi para aliviar
a culpa)
*
segunda-feira, 2 de novembro de 2015
da obesidade
líria porto
um grande peso nas coxas
nos braços glúteos e mamas
tudo aumenta com o tempo
só a memória descamba
(nem me falem de ginástica
no máximo a caminhada
em torno do quarteirão)
um grande peso nas coxas
nos braços glúteos e mamas
tudo aumenta com o tempo
só a memória descamba
(nem me falem de ginástica
no máximo a caminhada
em torno do quarteirão)
*
centelha
líria porto
alinhei-me pela esquerda
primeira letra do verso
jamais em cima do muro
melhor margear o abismo
que rolar para a direita
silenciar-me omitir-me
ou bater panelas
alinhei-me pela esquerda
primeira letra do verso
jamais em cima do muro
melhor margear o abismo
que rolar para a direita
silenciar-me omitir-me
ou bater panelas
*
(sem) escolha
líria porto
eu que não tenho
certeza de nada
afirmo com segurança
ainda neste século
seremos cinzas
ou ossos
o que preferes
cemitério ou crematório?
eu que não tenho
certeza de nada
afirmo com segurança
ainda neste século
seremos cinzas
ou ossos
o que preferes
cemitério ou crematório?
*
domingo, 1 de novembro de 2015
cremação
líria porto
façam sabão co'as as cinzas
lavem chão lençóis fronhas
que o corpo não exista em vãos
limpe a sujeira que fez
façam sabão co'as as cinzas
lavem chão lençóis fronhas
que o corpo não exista em vãos
limpe a sujeira que fez
*
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