sábado, 30 de abril de 2011

karma

líria porto

a gente não procura e acha
dá de frente com a criatura
e o fato dura toda
                      a eternidade

*

quinta-feira, 28 de abril de 2011

é sempre assim

líria porto

acorda-se com um dia a menos
e uma longa vida cada vez
mais curta

*

para uma dona doida

líria porto

chorei quando vi adélia
ela disse - não carece

perguntei-lhe como não
a emoção obedece-nos?

*

fundão

líria porto

dentro da noite
onde moram os pesadelos
quisera bem entendê-los
livrar-me de qualquer sombra
dos medos que habitam 
                                o son(h)o

(careço fazer análise)

*

quarta-feira, 27 de abril de 2011

lisa

líria porto
nova na família
esguia esbelta
parece maneguim
na passarela

*

terça-feira, 26 de abril de 2011

gemido

líria porto

passarinho fica mudo
durante a troca das penas

as nossas penas não mudam
ficam a_penas doloridas

*

sorrateiro

líria porto

igual o envelope
que o carteiro coloca
debaixo da porta

*

noites de luana

líria porto

fios por todo o corpo
nas pernas peito virilha
axilas braços pescoço
e no rosto –– barba cerrada
bigodes
sobrancelhas grossas
:
amava-a
nu em pelo

*

para durar para sempre

líria porto

tudo é igual no começo
os beijos as juras o carinho
então meu bem eu me vou
antes do início do fim

*

abano (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)

líria porto

a moça o leque o movimento
como a imensa borboleta
que inventou de aventar
o vento

*

domingo, 24 de abril de 2011

cúmplices

líria porto

fosse quem fosse
viesse nu peito aberto
despido de preconceitos
pisasse leve nas pétalas

eu
       retirava
                     os
                           espinhos

*

relíquias

líria porto

objetos novos recém-adquiridos
não fico à vontade

prefiro sapatos surrados
roupas puídas móveis antigos
homens velhos

*

perfis

líria porto

lilica tem gatos
as irmãs têm cães
precisam de afagos
abanos de rabos
lambidas nas mãos

lilica é arisca
gosta de bichos
             à distância

*

o diabo da cruz

líria porto

nasci co'as mãos velhas
marcas de vassoura sabão enxada
d'outras encarnações
:
eu já escrevi com pena

*

sábado, 23 de abril de 2011

de_vagar

líria porto

álcool e cigarro
suicídio clássico
em câmara lenta

*

repartição

líria porto

mesas abarrotadas
papéis de um lado e doutro
e a fofoca solta
na boca dos funcionários

*

terça-feira, 19 de abril de 2011

(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - a_manhã vem depois

líria porto

a lua flutua entre o céu
e a boca de fumo

um cão uiva
uma ruiva me acena
e a cena esbanja-se
de bela

fico doido
e é doído pensar
que a ilusão
é uma bolha

(cresce e
míngua)

*

segunda-feira, 18 de abril de 2011

chá de cadeira

líria porto

tempo de quem espera
tempo de quem virá

para alguns o tempo é eterno
um estalo para outros

um piscar de olhos
um raio

*

pestana

líria porto

tarde molenga
de ócio e preguiça
nada me atiça
e eu vaga_bunda
cochilo no colo
do mundo

*

domingo, 17 de abril de 2011

em minas

líria porto

quem não mordeu vai morder
a isca é um pão de quê?

*

d'alentejo

líria porto

quem canta os males espanca
(à florbela sim senhor)
o mal d'amor decantado
tudo em versos decassílabos
duas quadras dois tercetos

(a quem gosta um prato cheio
a quem não gosta
                              um vazio)

*

sábado, 16 de abril de 2011

(publicado no livro olho nu - ed. patuá) desmerecimento

líria porto

à mulher que se disputa
o céu a terra a florada

à mulher que se diz puta
nada?

*

sexta-feira, 15 de abril de 2011

à luz da vela

líria porto



foto de fabio reis

acordos pra toda a vida
fazemos com nossa sombra
só ela nos acompanha à hora 
do desencontro

*

alarme

líria porto

nas horas em que tudo pesa
em que a carga é excessiva
podemos sair dos trilhos
:
parto ao primeiro apito

*

queda de (a)braço

líria porto

não vou deixar que mantenhas
as coisas como as decides

se aí montanhas são firmes
em minas somos de ferro

(dá-me um abraço)

*

quinta-feira, 14 de abril de 2011

mouro

líria porto

seu agasalho era o sol
com olhos de dromedário

*

quarta-feira, 13 de abril de 2011

maria dá pena

líria porto

olhos inchados
outro hematoma
torção no braço
todos os roxos
dentes quebrados
queimados graves
nova desculpa
caiu na escada
trombou na rua
passava roupa
queimou no forno
todos sabemos
existem monstros
dentro das casas
e nas escolas
e nas cadeias

(não tenhas medo
e nem te cales
não fiquem impunes
babá marido
pais professores
cabos soldados
que violentam
que te agridem
:
não sejas cúmplice
põe a boca no mundo
denuncia-os)

*

terça-feira, 12 de abril de 2011

cri-cris

líria porto

coisas pequeninas
que não incomodam
quaisquer circunstâncias
para os picuinhas
são muito maiores
que as relevantes

*

vigília

líria porto

já faz algum tempo
o sol dos seus olhos
ficou embaçado

não vai à varanda
não abre as cortinas
e nem cantarola

preciso ajudá-la
conversar um pouco
sua dor é tão triste

sinto-me impotente
porém passarinhos
também trocam penas

sofrimentos passam
fecham-se as feridas
ficam as cicatrizes

então calo o bico
e daqui de fora
monto sentinela

*

segunda-feira, 11 de abril de 2011

desumanidades

líria porto

uma vai e nem é bem tratada
a outra  mantida a pão-de-ló
faz cu doce

*

(à sombra da torre eiffel)

líria porto

falamos a mesma língua
lambemos o mesmo doce
cuspimos o mesmo sal
quase igual um casal
mas somos só um caso
                        
e casual

*

urgências

líria porto

a vida ruge batom
minissaia e salto
plataforma

*

domingo, 10 de abril de 2011

gueixa

líria porto

acaso tu queiras
um amor adotivo
manda-me chamar
estou disponível

tu deitas no canto
afago-te a pele
enxugo teu pranto
cuido dos teus pés

então tu me falas
das tuas fraquezas
ouço-te em silêncio
resguardo segredos

enquanto precises
eu fico a teu lado
depois venho embora
e caso encerrado

(se é que tu deixas)

*

sábado, 9 de abril de 2011

cobertor

líria porto

sem nuvem urubu avião
um azul nuzinho cobria
meu corpo

*

crudelíssimo

líria porto

o tempo me cega
põe-me espora freio arreio
e berra sem compaixão
sossega sua égua velha
o teu passo mudou
o teu corpo está frouxo
é bom que te lembres
o teu macho é um
                   pangaré
:
(sim - senhor)

*

sexta-feira, 8 de abril de 2011

perfilados

líria porto

eucaliptos  exército de soldados rasos
imposição de fardas
:
verde a qualquer preço

*

quinta-feira, 7 de abril de 2011

sofrimento

líria porto

a dor de uma ausência não cabe no infinito
porisso se aninha na alma da gente
ali faz morada até que nos mata
esmaga sem pena
:
com o salto de um sapato luís xv

*

quarta-feira, 6 de abril de 2011

agonia

líria porto

como estarás a estas horas
o escuro se estira e ainda espero
a aurora

*

terça-feira, 5 de abril de 2011

decibéis

líria porto

sonoras sirenes
serenas senhoras

palavras se encaixam
sentidos se chocam

*

extrassístole

líria porto

coração para dispara
há muito não me obedece
faz hora co'a minha cara
parece samba de breque

*

no reino da dinamarca

líria porto

há algo que sobra
no prato da nora

a sogra

*

ímã

líria porto

passarinho atraído pela cobra cascavel
precipito-me no abismo dos teus olhos
:
voo em queda

*

segunda-feira, 4 de abril de 2011

estêvão

líria porto

não me estendeste uma estaca um esteio
não expressaste um gesto - a mim
gestante de um filho teu

*

a um osso duro de roer

líria porto

na verdade
o que eu preciso
é que tu tenhas siso
para não me amolares
com pedidos incisivos
e caninos

*

pés de moleque

líria porto

o pai pagava as contas
a mãe varria os cantos

(farinha e rapadura)

os filhos
nem sei quantos

*

por amor

líria porto

rasgar-se na carne
depois emendar-se
com ponto paris

*

cale-se

líria porto


em momentos difíceis
a queda acontece
e ninguém contém os estilhaços
do (res)sentimento

*

domingo, 3 de abril de 2011

bem querer

líria porto

leite afeto
cheiro de criança
servir-me-ão de alento
no rigor do inverno
na proximidade
da velhice

*

sexta-feira, 1 de abril de 2011

na beirada do telhado

líria porto

maritaca acorda ataca
faz barulho canta grita
maritaca come coco
quebra a casca
com o bico

*

dedicatória

nus descampados (im)puros
fiamos o plenilúnio

(líria porto)



*















quem tem pena de passarinho
é passarinho

(líria porto)

Arquivo do blog