líria porto
dos pingos da chuva
ouvia os chiados
tais quais os enxurros
riachos da alma
achou entre os seixos
um nicho de mágoa
prendeu as madeixas
os cachos da lágrima
chorou só um pouco
baixinho sem garças
tristezas são brumas
são minas sem mar
*
quinta-feira, 30 de abril de 2009
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - à amiga rina bogliolo
líria porto
estejas onde estiveres
ao contemplares a lua
(dela não arredo os olhos)
poderei ver-te
dir-me-ás
é pouco
dir-te-ei
nem tanto
aos loucos
basta-nos uma gota
e o mar virá
*
estejas onde estiveres
ao contemplares a lua
(dela não arredo os olhos)
poderei ver-te
dir-me-ás
é pouco
dir-te-ei
nem tanto
aos loucos
basta-nos uma gota
e o mar virá
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) ribeirinha
líria porto
comecei na lida cedo
ajudo a mãe no de comer
faço panelas
:
tiro o barro bato amasso moldo queimo
tudo assim
na dificuldade
igual canoa no rio
não sou de deixar rastilho
estou de passagem
tenho pele de escama
cheiro de peixe
*
*
comecei na lida cedo
ajudo a mãe no de comer
faço panelas
:
tiro o barro bato amasso moldo queimo
tudo assim
na dificuldade
igual canoa no rio
não sou de deixar rastilho
estou de passagem
tenho pele de escama
cheiro de peixe
*
*
desbunde
líria porto
olha-se ao espelho
requebra-se de lado
e o velho diabo
redunda abundância
(pra que dividir
pra que repartir
se a bunda já veio
partida ao meio?)
o espelho advoga-a
dá seu veredicto
:
olha-se ao espelho
requebra-se de lado
e o velho diabo
redunda abundância
(pra que dividir
pra que repartir
se a bunda já veio
partida ao meio?)
o espelho advoga-a
dá seu veredicto
:
minha senhora
o que abunda
não atrapalha
tire sua saia
e cinta
*
o que abunda
não atrapalha
tire sua saia
e cinta
*
quarta-feira, 29 de abril de 2009
matrioskas
líria porto
as bisavós das avós
a mãe da mãe depois nós
as filhas netas bisnetas
as crias destas daquelas
e assim uma após outra
pelos séculos dos séculos
*
as bisavós das avós
a mãe da mãe depois nós
as filhas netas bisnetas
as crias destas daquelas
e assim uma após outra
pelos séculos dos séculos
*
a_deuses
líria porto
estas mãos encarquilhadas anciãs antes do tempo
há muito já me contavam da importância dos gestos
da finitude do homem de como todas as coisas
são ilusões do momento
*
estas mãos encarquilhadas anciãs antes do tempo
há muito já me contavam da importância dos gestos
da finitude do homem de como todas as coisas
são ilusões do momento
*
terça-feira, 28 de abril de 2009
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - por quê?
líria porto
tu girassol
eu giralua
um sem o outro
e a vida dura
tão pouco
*
tu girassol
eu giralua
um sem o outro
e a vida dura
tão pouco
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - branca
líria porto
lua
pressinto-te
és a moça
que rebusca a noite
com um facho
de lanterna
*
lua
pressinto-te
és a moça
que rebusca a noite
com um facho
de lanterna
*
apito
líria porto
gosto do trem quando vai
gosto do trem quando vem
e tu vovó
do que gostas?
da manobra meu bem
da manobra
*
gosto do trem quando vai
gosto do trem quando vem
e tu vovó
do que gostas?
da manobra meu bem
da manobra
*
piquenique
líria porto
catar guabiroba
no meio do mato
frutinha gostosa
de lá do cerrado
a saia de flor
o laço o sorriso
menina danada
sem véu sem juízo
igual borboleta
voar por um triz
a tarde tem asas
tem cor tem matiz
*
catar guabiroba
no meio do mato
frutinha gostosa
de lá do cerrado
a saia de flor
o laço o sorriso
menina danada
sem véu sem juízo
igual borboleta
voar por um triz
a tarde tem asas
tem cor tem matiz
*
segunda-feira, 27 de abril de 2009
(para o livro sem pecado não tem salvação) cicios
líria porto
cinco freirinhas
hábitos brancos
um só marido
rezam u'a prece
jesus querido
a lua cresce
perdão há fogo
dentro das pregas
passa uma nuvem
aguinha fresca
vê-se fumaça
perto das pernas
oh virgem santa
que coisa boa
deus abençoe
chover à toa
*
cinco freirinhas
hábitos brancos
um só marido
rezam u'a prece
jesus querido
a lua cresce
perdão há fogo
dentro das pregas
passa uma nuvem
aguinha fresca
vê-se fumaça
perto das pernas
oh virgem santa
que coisa boa
deus abençoe
chover à toa
*
mudez
líria porto
manancial de azul deserto de palavras
não entendo a secura da minha alma
nestas manhã
*
manancial de azul deserto de palavras
não entendo a secura da minha alma
nestas manhã
*
o diabo e a cruz
líria porto
o olhar - ponte pênsil
foi incapaz de (re)aproximá-los
) desconfiança - estigma
de gato escaldado (
*
o olhar - ponte pênsil
foi incapaz de (re)aproximá-los
) desconfiança - estigma
de gato escaldado (
*
ligação
líria porto
a vida é o hífen entre duas noites
a que antecede o nascimento
a que sucede a morte
*
a vida é o hífen entre duas noites
a que antecede o nascimento
a que sucede a morte
*
sábado, 25 de abril de 2009
constelação
líria porto
berenice II rainha do egipto
prometeu sua cabeleira a afrodite
se ptolomeu III seu marido
retornasse do combate
são e salvo
as tranças da soberana encantaram a deusa
que as levou para o céu e as converteu
em estrelas
*
berenice II rainha do egipto
prometeu sua cabeleira a afrodite
se ptolomeu III seu marido
retornasse do combate
são e salvo
as tranças da soberana encantaram a deusa
que as levou para o céu e as converteu
em estrelas
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - o garçom e a lua
líria porto
ele traz na bandeja
a cerveja e dois copos
estou só - bebes comigo?
:
perdão eu não posso
preciso estar sóbrio
ao servir
as estrelas
*
ele traz na bandeja
a cerveja e dois copos
estou só - bebes comigo?
:
perdão eu não posso
preciso estar sóbrio
ao servir
as estrelas
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - boca da noite
líria porto
depois de beijá-la o sol decretou
a lua é frígida – e condenou-a
à solidão das virgens
:
o sol é estrela
de quinta grandeza
*
depois de beijá-la o sol decretou
a lua é frígida – e condenou-a
à solidão das virgens
:
o sol é estrela
de quinta grandeza
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - poderosa
líria porto
a lua surge rainha
põe-se no meio do céu
o sol não suportaria
essa mulher sem cabresto
que vem e volta sozinha
sem precisar de pretexto
*
a lua surge rainha
põe-se no meio do céu
o sol não suportaria
essa mulher sem cabresto
que vem e volta sozinha
sem precisar de pretexto
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - inconstante
líria porto
eu vi a lua amuada
esquecida lá no céu
linda lua a minha lua
embrulhada numa nuvem
apareceu e sumiu
depois voltou tão bonita
sorridente olhar sem névoa
a minha lua é de lua
charme de mulher bela
às vezes sofre deveras
às vezes me manipula
*
eu vi a lua amuada
esquecida lá no céu
linda lua a minha lua
embrulhada numa nuvem
apareceu e sumiu
depois voltou tão bonita
sorridente olhar sem névoa
a minha lua é de lua
charme de mulher bela
às vezes sofre deveras
às vezes me manipula
*
tendências
líria porto
vovó zinha
quase sete décadas
pintou as unhas de azul
:
céu e mar nas
extremidades
*
vovó zinha
quase sete décadas
pintou as unhas de azul
:
céu e mar nas
extremidades
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) profissão
líria porto
tias solteironas costuravam calças masculinas
arrematavam presilhas bolsos bainhas pregavam botões
abriam / fechavam braguilhas e fantasias
sexuais
*
tias solteironas costuravam calças masculinas
arrematavam presilhas bolsos bainhas pregavam botões
abriam / fechavam braguilhas e fantasias
sexuais
*
sexta-feira, 24 de abril de 2009
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - sussurros
líria porto
nossa
olha a lua na poça
posso tocá-la?
cala-te
se acordas são jorge
ele foge a cavalo
leva a lua
e o fosso?
vou cavá-lo depois
não agora
que a lua mergulha
em meu olho
*
nossa
olha a lua na poça
posso tocá-la?
cala-te
se acordas são jorge
ele foge a cavalo
leva a lua
e o fosso?
vou cavá-lo depois
não agora
que a lua mergulha
em meu olho
*
paixão (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
um cão vadio
disse ao girassol
vem comigo
vou levar-te ao polo norte
onde o sol brilha
seis meses consecutivos
:
morreu de overdose
oh pobre flor
*
um cão vadio
disse ao girassol
vem comigo
vou levar-te ao polo norte
onde o sol brilha
seis meses consecutivos
:
morreu de overdose
oh pobre flor
*
defloração (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
a terra molhada
exala um perfume
tão próprio das fêmeas
um cheiro de coito
e dentro em pouco
estará inundada
de verdes de brotos
de intumescências
*
a terra molhada
exala um perfume
tão próprio das fêmeas
um cheiro de coito
e dentro em pouco
estará inundada
de verdes de brotos
de intumescências
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - minguante
líria porto
lua
o rato roeu
sua cara de hóstia
caíram uns farelos
que gato lambeu
com os olhos
cão pobre vadio
uivou no vazio
tristeza de morte
a vida é o quê
senão o aguardo
da hora
*
lua
o rato roeu
sua cara de hóstia
caíram uns farelos
que gato lambeu
com os olhos
cão pobre vadio
uivou no vazio
tristeza de morte
a vida é o quê
senão o aguardo
da hora
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) avô
líria porto
quando vem a brisa toca-me de leve
e o amor desliza pela minha pele
a paz é tão grande tem bigodes brancos
chega no sorriso de um homem brando
eu não sei se sonho ou se imagino
volto a ser menina boca de morango
pés de bailarina olhos de avelã
suas mãos macias roçam-me os cabelos
levam-me à trilha do gostar ameno
surgem as lembranças lá de outras terras
onde as oliveiras entre as coisas belas
compõem nosso berço
*
quando vem a brisa toca-me de leve
e o amor desliza pela minha pele
a paz é tão grande tem bigodes brancos
chega no sorriso de um homem brando
eu não sei se sonho ou se imagino
volto a ser menina boca de morango
pés de bailarina olhos de avelã
suas mãos macias roçam-me os cabelos
levam-me à trilha do gostar ameno
surgem as lembranças lá de outras terras
onde as oliveiras entre as coisas belas
compõem nosso berço
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) à francesa
líria porto
arrumou amá-la
depois desistiu
munique é fria
e ele não tem
sobretudo
*
arrumou amá-la
depois desistiu
munique é fria
e ele não tem
sobretudo
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - la luna llena
líria porto
peguei a lua no pulo
um lobo lambia-lhe o leite
havia elo entre eles
o halo dela luzia
ela feliz – aos lampejos
*
peguei a lua no pulo
um lobo lambia-lhe o leite
havia elo entre eles
o halo dela luzia
ela feliz – aos lampejos
*
pré-menstrual
líria porto
barulho de chuva
arrulho de água e serra
mato seco se enverdece
primavera insinua-se
e a lua surta
no cais
*
barulho de chuva
arrulho de água e serra
mato seco se enverdece
primavera insinua-se
e a lua surta
no cais
*
quinta-feira, 23 de abril de 2009
(des)crença
líria porto
atiraste longe o sonho
ele vagou alheio
pendurou-se em galho seco
mas depois a chuva veio
brotaram folhas e flores
alma é terreno fértil
*
atiraste longe o sonho
ele vagou alheio
pendurou-se em galho seco
mas depois a chuva veio
brotaram folhas e flores
alma é terreno fértil
*
desalento
líria porto
mãos espalmadas no rosto
cotovelos na janela
olhos de cais do porto
a mulher sempre à espera
afunda a barca dos sonhos
e naufraga dentro dela
*
mãos espalmadas no rosto
cotovelos na janela
olhos de cais do porto
a mulher sempre à espera
afunda a barca dos sonhos
e naufraga dentro dela
*
quarta-feira, 22 de abril de 2009
(des)arrumação
líria porto
na gaveta nenhuma novidade
até encontrarmos no compartimento dos garfos
algumas conchas grávidas
*
na gaveta nenhuma novidade
até encontrarmos no compartimento dos garfos
algumas conchas grávidas
*
per secula seculorum
líria porto
giácomo jacobina meu amado meu amante
escrevia em papiros papéis pardos pergaminhos
poemas mensagens bilhetes cartas de amor
dormia em meu sono sonhávamos
sussurrava-me ao ouvido
palavras obscenas
enviuvei-me
chorei sofri chamei-o de volta
reencarnou-se reencontrei-o
e tudo se mantém
*
giácomo jacobina meu amado meu amante
escrevia em papiros papéis pardos pergaminhos
poemas mensagens bilhetes cartas de amor
dormia em meu sono sonhávamos
sussurrava-me ao ouvido
palavras obscenas
enviuvei-me
chorei sofri chamei-o de volta
reencarnou-se reencontrei-o
e tudo se mantém
*
terça-feira, 21 de abril de 2009
crítica
líria porto
o amor saiu de cena
encerrou o espetáculo
fechou as cortinas
ninguém lhe pediu autógrafo
não houve aplauso
nem flor
*
o amor saiu de cena
encerrou o espetáculo
fechou as cortinas
ninguém lhe pediu autógrafo
não houve aplauso
nem flor
*
alojamento
líria porto
vou beber da lua cheia
(cachaça de minas)
e quando me embriagar
dormirei na tua rede
ou na cama do bordel
sinto frio sinto sede
quero colo aconchego
e cafuné
*
vou beber da lua cheia
(cachaça de minas)
e quando me embriagar
dormirei na tua rede
ou na cama do bordel
sinto frio sinto sede
quero colo aconchego
e cafuné
*
temperamental
líria porto
necessito-te com a força da explosão
porém se tu não me queres
a vida te seja breve
vai pro inferno
*
necessito-te com a força da explosão
porém se tu não me queres
a vida te seja breve
vai pro inferno
*
camuflagem
líria porto
entre quatro paredes
teias cama rede
minha flor meu amor
pernas pele
desejo
carícias
confidências
lá fora
bom dia boa tarde
meu senhor minha senhora
estão todos bem
sim obrigada
vou-me até logo
lembrança aos parentes
*
entre quatro paredes
teias cama rede
minha flor meu amor
pernas pele
desejo
carícias
confidências
lá fora
bom dia boa tarde
meu senhor minha senhora
estão todos bem
sim obrigada
vou-me até logo
lembrança aos parentes
*
leve
líria porto
flutuo plano desmaio
pouso numa flor
num galho
:
o vento me leva
o orvalho me prende
tenho corpo d'alma
flutuo plano desmaio
pouso numa flor
num galho
:
o vento me leva
o orvalho me prende
tenho corpo d'alma
p
l
u
m
a
*
l
u
m
a
*
outonais
líria porto
despem-se as árvores
a tarde pinta-se de batom
veste-se de festa
os dias desmaiam
em meus olhos
*
despem-se as árvores
a tarde pinta-se de batom
veste-se de festa
os dias desmaiam
em meus olhos
*
segunda-feira, 20 de abril de 2009
autoestima
líria porto
gostar de mim é do jeito que voo
polegadas a mais pesares a menos
e no extremo do gozo
*
gostar de mim é do jeito que voo
polegadas a mais pesares a menos
e no extremo do gozo
*
caminho
líria porto
longo ou curto
estreito ou largo
reto ou sinuoso
a vida é o atalho
entre o berço
e o fosso
*
longo ou curto
estreito ou largo
reto ou sinuoso
a vida é o atalho
entre o berço
e o fosso
*
domingo, 19 de abril de 2009
cometi um soneto
líria porto
pedi socorro a hipotenusas e catetos
falei comigo e também com os meus botões
amasso versos sou assim aos borbotões
porém insisto em processar alguns sonetos
conversa vai conversa vem eu vou tentar
busco o luar a luz do sol amarro-os bem
ou largo tudo num papel em qualquer trem
trago co'as mãos as ilusões lá de além-mar
batuco os dedos a contar sílabas tortas
e veja só velho camões se não te importas
sempre fui doida e fico mais tenho certeza
falo sozinha a cavoucar rimas avessas
sou assassina criminosa ré confessa
deste soneto atordoada eu me fiz presa
*
pedi socorro a hipotenusas e catetos
falei comigo e também com os meus botões
amasso versos sou assim aos borbotões
porém insisto em processar alguns sonetos
conversa vai conversa vem eu vou tentar
busco o luar a luz do sol amarro-os bem
ou largo tudo num papel em qualquer trem
trago co'as mãos as ilusões lá de além-mar
batuco os dedos a contar sílabas tortas
e veja só velho camões se não te importas
sempre fui doida e fico mais tenho certeza
falo sozinha a cavoucar rimas avessas
sou assassina criminosa ré confessa
deste soneto atordoada eu me fiz presa
*
ao pé da serra
líria porto
nas tardes molengas
pão de queijo café
mingau e pamonha
coalhada broa de fubá
milho assado ou cozido
biscoito de polvilho
um dedo de prosa
u'a moça formosa
um beijo
um chamego
nas noites de lua
seresta cachaça
caipirinha torresmo
cerveja gelada
farofa linguiça
tutu à mineira
um causo animado
um pito um violão
um fogão de rabo
um amor fagueiro
*
nas tardes molengas
pão de queijo café
mingau e pamonha
coalhada broa de fubá
milho assado ou cozido
biscoito de polvilho
um dedo de prosa
u'a moça formosa
um beijo
um chamego
nas noites de lua
seresta cachaça
caipirinha torresmo
cerveja gelada
farofa linguiça
tutu à mineira
um causo animado
um pito um violão
um fogão de rabo
um amor fagueiro
*
espelho
líria porto
sonhei sonhar e o sonho
tanto quanto o pesadelo
não disfarçava a idade
não se vive impunemente
ficamos todos velhos
*
sonhei sonhar e o sonho
tanto quanto o pesadelo
não disfarçava a idade
não se vive impunemente
ficamos todos velhos
*
sábado, 18 de abril de 2009
arritmia
líria porto
manhãs loiras tardes ruivas
noites morenas – o sol endoidece e a lua
rói as unhas
*
manhãs loiras tardes ruivas
noites morenas – o sol endoidece e a lua
rói as unhas
*
cegueira
líria porto
sem lentes microscópios
as linhas se embaraçam
as bordas se desfazem
desacordo míope
sem saber do sonho
o que é realidade
*
sem lentes microscópios
as linhas se embaraçam
as bordas se desfazem
desacordo míope
sem saber do sonho
o que é realidade
*
boca limpa
líria porto
pimenta malagueta era tiro e queda
contra palavrões
(proparoxítonas
sentimentalismos
inconstitucionalidades)
*
pimenta malagueta era tiro e queda
contra palavrões
(proparoxítonas
sentimentalismos
inconstitucionalidades)
*
sexta-feira, 17 de abril de 2009
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - rapto
líria porto
o vento cavalga a nuvem
leva a lua na garupa
sabe-se lá para onde
*
o vento cavalga a nuvem
leva a lua na garupa
sabe-se lá para onde
*
quinta-feira, 16 de abril de 2009
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) bodas de osso
líria porto
mentiras não houve
apenas silêncios omissão de fatos
ausências
insônias
para dourar a pílula
mudávamos as vírgulas
de comum acordo
durou uma vida
vida?
*
mentiras não houve
apenas silêncios omissão de fatos
ausências
insônias
para dourar a pílula
mudávamos as vírgulas
de comum acordo
durou uma vida
vida?
*
conforto (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
qualquer lugar me acomoda
um casebre uma choupana
uma tenda um barracão
não me atrapalham as paredes
de palha barro ou lona
:
há lírios do pântano
*
qualquer lugar me acomoda
um casebre uma choupana
uma tenda um barracão
não me atrapalham as paredes
de palha barro ou lona
:
há lírios do pântano
*
resignação
líria porto
existe na vizinhança
um passarinho cantor
vive preso na gaiola
e jamais se quebrantou
por um punhado de alpiste
um bocado de água fresca
canta afinado bonito
a louvar a natureza
*
existe na vizinhança
um passarinho cantor
vive preso na gaiola
e jamais se quebrantou
por um punhado de alpiste
um bocado de água fresca
canta afinado bonito
a louvar a natureza
*
quarta-feira, 15 de abril de 2009
terça-feira, 14 de abril de 2009
a_balada
líria porto
cansada da fama da casa da cama da gata
madama alcança a sacada balança a carcaça
gargalha
s
a
l
t
a
atrapalha a manhã da babá
*
cansada da fama da casa da cama da gata
madama alcança a sacada balança a carcaça
gargalha
s
a
l
t
a
atrapalha a manhã da babá
*
segunda-feira, 13 de abril de 2009
compulsório
líria porto
sem data de vencimento
o prazo pode ser grande
ou pequeno
(assunto proibido - para acontecer
basta-nos estar v i v o s)
fingir não resolve
tirana é quem cobra
a apólice
(quem de nós será
o próximo?)
*
sem data de vencimento
o prazo pode ser grande
ou pequeno
(assunto proibido - para acontecer
basta-nos estar v i v o s)
fingir não resolve
tirana é quem cobra
a apólice
(quem de nós será
o próximo?)
*
domingo, 12 de abril de 2009
o poema
líria porto
não se desprende da ponta dos dedos
fica debaixo da unha tal como farpa
ou sujeira
*
não se desprende da ponta dos dedos
fica debaixo da unha tal como farpa
ou sujeira
*
penúria
líria porto
das minhas tantas manias
das quantas várias proezas
dalgumas eu nem me lembro
muita vez imploro à chuva
disfarça tua amargura
e chora sem estridência
(poesia
é ideia
fixa)
*
das minhas tantas manias
das quantas várias proezas
dalgumas eu nem me lembro
muita vez imploro à chuva
disfarça tua amargura
e chora sem estridência
(poesia
é ideia
fixa)
*
sábado, 11 de abril de 2009
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) reme reme
líria porto
o momento congelado
preso na fotografia
um flagrante do passado
como a carta que te envio
quando a lês estou mudado
e a tristeza que havia
poderá não existir
:
o tempo é rio
*
o momento congelado
preso na fotografia
um flagrante do passado
como a carta que te envio
quando a lês estou mudado
e a tristeza que havia
poderá não existir
:
o tempo é rio
*
enigma
líria porto
se eu me chamasse dolores
esquecesse minhas dores
vestisse todas as cores
tivesse muitos amores
nem que fosse pra rimar
a vida seria mais doce
(fosse o que fosse)
ou amarga?
*
se eu me chamasse dolores
esquecesse minhas dores
vestisse todas as cores
tivesse muitos amores
nem que fosse pra rimar
a vida seria mais doce
(fosse o que fosse)
ou amarga?
*
valores
líria porto
lagarta vira borboleta
gente não
troca cores asas voos
por paredes
arrasta casa e solidão
como os caracóis
*
lagarta vira borboleta
gente não
troca cores asas voos
por paredes
arrasta casa e solidão
como os caracóis
*
e tenho dito
líria porto
proibo-te de me proibires
eu fiz tu fizeste
nós dois faremos sempre
:
são tão minhas quanto tuas
as (in)consequências
eu fiz tu fizeste
nós dois faremos sempre
:
são tão minhas quanto tuas
as (in)consequências
*
incréu
líria porto
não vejo a hora de chegar ao paraíso
para ouvir são pedro carimbar os passaportes
esse pode esse pode esse pode esse não pode
(e eu ficar de fora)
não vejo a hora de chegar ao paraíso
para ouvir são pedro carimbar os passaportes
esse pode esse pode esse pode esse não pode
(e eu ficar de fora)
*
sexta-feira, 10 de abril de 2009
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - sábado
líria porto
é dia de comer a aurora
lamber o sol a lua
sujar o colarinho de nuvem
arrotar brilho de estrela
*
é dia de comer a aurora
lamber o sol a lua
sujar o colarinho de nuvem
arrotar brilho de estrela
*
quinta-feira, 9 de abril de 2009
choro
líria porto
eu não tenho mar não tenho ri(s)o
e não tenho lago riacho cisterna chuva enxurrada
poça ou copo d'água
eu só tenho pó e esse jeito de ser
tão
*
eu não tenho mar não tenho ri(s)o
e não tenho lago riacho cisterna chuva enxurrada
poça ou copo d'água
eu só tenho pó e esse jeito de ser
tão
*
sangre
líria porto
num dia de domingo ao som de um belo tango
nasceu uma menina boca de morango
cabelos purpurina olhos de quebranto
chamava-se marina e usava um manto
morava numa esquina telhado de amianto
cresceu muito sozinha casou-se com um santo
foi tão infeliz ninguém sabe o quanto
e de tanto tanto e de espanto e sangue
mandou-o sem pesar
pros quintos do inferno
*
num dia de domingo ao som de um belo tango
nasceu uma menina boca de morango
cabelos purpurina olhos de quebranto
chamava-se marina e usava um manto
morava numa esquina telhado de amianto
cresceu muito sozinha casou-se com um santo
foi tão infeliz ninguém sabe o quanto
e de tanto tanto e de espanto e sangue
mandou-o sem pesar
pros quintos do inferno
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) lealdade
líria porto
por ti eu faço
seguro a onda no braço
e se o mar te der rasteira
amarro-o numa coleira
arrasto-o para as areias
do deserto de saara
*
por ti eu faço
seguro a onda no braço
e se o mar te der rasteira
amarro-o numa coleira
arrasto-o para as areias
do deserto de saara
*
quarta-feira, 8 de abril de 2009
íntimo
líria porto
em seu regaço eu me aninho
e escorro e escorrego sento juntinho dos pés
igual água da bica quando cai na bacia
*
em seu regaço eu me aninho
e escorro e escorrego sento juntinho dos pés
igual água da bica quando cai na bacia
*
(b)isca
líria porto
uma bolha uma folha uma rolha uma escolha
uma tola uma tonta uma sonsa
que inventa intenta imagina improvisa
para chamar-te à tensão
(à tentação)
*
uma bolha uma folha uma rolha uma escolha
uma tola uma tonta uma sonsa
que inventa intenta imagina improvisa
para chamar-te à tensão
(à tentação)
*
morta
líria porto
a alma enclausurada
fechada dentro da dor
às vezes tudo se acaba
sem precisar sepultura
*
a alma enclausurada
fechada dentro da dor
às vezes tudo se acaba
sem precisar sepultura
*
terça-feira, 7 de abril de 2009
costume
líria porto
amar amou não foi pouco
deixou de amar - tudo bem
se separar foi alívio
por que o ciúme?
*
amar amou não foi pouco
deixou de amar - tudo bem
se separar foi alívio
por que o ciúme?
*
reação alérgica
líria porto
de fora para dentro
a imensidão o universo
de dentro para fora
a aflição o medo
no ponto de fusão - na pele
a erupção
*
de fora para dentro
a imensidão o universo
de dentro para fora
a aflição o medo
no ponto de fusão - na pele
a erupção
*
segunda-feira, 6 de abril de 2009
indícios
líria porto
quem pensa que nos conhece sabe tão raso tão pouco
se mais amar-nos soubesse encontraria o tesouro
*
quem pensa que nos conhece sabe tão raso tão pouco
se mais amar-nos soubesse encontraria o tesouro
*
(publicado no livro garimpo - editora lê) - tropeço
líria porto
rumina os versos mastiga-os
engole-o letra por letra
lambe a rima o ritmo
a métrica
então engasga e os esquece
*
rumina os versos mastiga-os
engole-o letra por letra
lambe a rima o ritmo
a métrica
então engasga e os esquece
*
caminhante
líria porto
não sei se sei se aprendi
se fico se vou-me embora
sem ver entrei nesta vida
restou-me a estrada
retorno?
*
não sei se sei se aprendi
se fico se vou-me embora
sem ver entrei nesta vida
restou-me a estrada
retorno?
*
domingo, 5 de abril de 2009
comparação
líria porto
peito amarelo
o corpo cinza
sacode as asas
reabre o bico
sobe nas galhas
canta assobia
ai quem me dera
ser passarinho
eu tenho pe(r)nas
tão doloridas
*
peito amarelo
o corpo cinza
sacode as asas
reabre o bico
sobe nas galhas
canta assobia
ai quem me dera
ser passarinho
eu tenho pe(r)nas
tão doloridas
*
de amante
líria porto
pelas montanhas eu surfo
pelas campinas eu nado
por horizontes eu surto
pelas minas eu me afundo
pelas gerais eu me acabo
*
pelas montanhas eu surfo
pelas campinas eu nado
por horizontes eu surto
pelas minas eu me afundo
pelas gerais eu me acabo
*
sábado, 4 de abril de 2009
maiores que a lua
líria porto
tristezas me assolam – bolas de neve
e em breve estarão no livro
dos records
*
tristezas me assolam – bolas de neve
e em breve estarão no livro
dos records
*
sexta-feira, 3 de abril de 2009
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) bolso furado
líria porto
a vida é (ul)traje
sob medida
o tempo passa
faz-se o remendo
vai-se vivendo
*
a vida é (ul)traje
sob medida
o tempo passa
faz-se o remendo
vai-se vivendo
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - versos d'inverno
líria porto
o sol travestido
vestido de lua de lua
e o frio o frio
senti-o na nuca
na nuca
eu velha velha
velha
tremia tremia tremia
sol filho da gruta
*
o sol travestido
vestido de lua de lua
e o frio o frio
senti-o na nuca
na nuca
eu velha velha
velha
tremia tremia tremia
sol filho da gruta
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(publicado no livro olho nu - ed. patuá) ralo
líria porto
outra arrancou fio a fio
os pelos do seu bigode
aquele colchão macio
onde deitava meus beijos
e sentia cócegas
*
outra arrancou fio a fio
os pelos do seu bigode
aquele colchão macio
onde deitava meus beijos
e sentia cócegas
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - destilados
líria porto
lua cheia de cachaça
bêbada de ti mesma
vais deixar o sol borracho
e desviar o seu facho
de paris para veneza
garçom
dá-me outro trago
com limão e gelo
*
lua cheia de cachaça
bêbada de ti mesma
vais deixar o sol borracho
e desviar o seu facho
de paris para veneza
garçom
dá-me outro trago
com limão e gelo
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quinta-feira, 2 de abril de 2009
chove e tudo me comove
líria porto
o choro da nuvem
a chuva em teus olhos
alguém me ajude
não suporto
tanto
só
l
ú
c
i
d
o
*
o choro da nuvem
a chuva em teus olhos
alguém me ajude
não suporto
tanto
só
l
ú
c
i
d
o
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quarta-feira, 1 de abril de 2009
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - fortuna
líria porto
janela abelhuda só vê vizinhança
a minha contempla o crepúsculo
*
janela abelhuda só vê vizinhança
a minha contempla o crepúsculo
*
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é passarinho
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