líria porto
costuro meu canto
com outras medidas
sou eu das palavras
limadas antigas
pois tais como as pedras
se ficam pontudas
se têm muita aresta
eu digo não prestam
estão mal cosidas
as letras redondas
quais seixos no rio
são um desafio
um cordão de pérolas
meus dedos já gastos
às vezes coletam-nas
com as pontas das unhas
que tenho esmaltadas
na cor das petúnias
*
sábado, 31 de outubro de 2009
minas
líria porto
cheiros sabores aromas
queijos doces
suspiros
pães bolos biscoitos
amores pecados prazeres
(sodoma gomorra
e fogão de rabo
quente)
*
cheiros sabores aromas
queijos doces
suspiros
pães bolos biscoitos
amores pecados prazeres
(sodoma gomorra
e fogão de rabo
quente)
*
sexta-feira, 30 de outubro de 2009
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
zelo
líria porto
sobe numa galha noutra – olha as ramas curioso
parece que o passarinho quer um canto para o ninho
e todo cuidado é pouco
*
sobe numa galha noutra – olha as ramas curioso
parece que o passarinho quer um canto para o ninho
e todo cuidado é pouco
*
freguês
líria porto
abre-lhe os colchetes
puxa-lhe os elásticos
depois se comporta
como se estivesse
à mesa
:
saboreia-lhe a carne
repete a sobremesa
e adormece
antes de partir
bebe café e deixa
a gorjeta
*
abre-lhe os colchetes
puxa-lhe os elásticos
depois se comporta
como se estivesse
à mesa
:
saboreia-lhe a carne
repete a sobremesa
e adormece
antes de partir
bebe café e deixa
a gorjeta
*
terça-feira, 27 de outubro de 2009
fragilidade
líria porto
eu não sei que mágoa é essa
eu não tenho olhos d'água
isso é coisa de mulher
homem que é homem não chora
não se queixa não se dobra
homem que é homem aguenta
(não posso mais suportar)
sou um dique um aguaçal
o meu amor foi embora
não devo dar um gemido
há um mar de sofrimento
estampado no meu riso
pobre de mim ai de mim
(sou o cinismo em pessoa)
eu não sei que dor é essa
escorrega pela cara
atravessa fura o peito
sou um cabra de respeito
sou um homem muito macho
não me agacho não me curvo
(deus do céu quero é morrer)
*
eu não sei que mágoa é essa
eu não tenho olhos d'água
isso é coisa de mulher
homem que é homem não chora
não se queixa não se dobra
homem que é homem aguenta
(não posso mais suportar)
sou um dique um aguaçal
o meu amor foi embora
não devo dar um gemido
há um mar de sofrimento
estampado no meu riso
pobre de mim ai de mim
(sou o cinismo em pessoa)
eu não sei que dor é essa
escorrega pela cara
atravessa fura o peito
sou um cabra de respeito
sou um homem muito macho
não me agacho não me curvo
(deus do céu quero é morrer)
*
segunda-feira, 26 de outubro de 2009
rigidez
líria porto
algumas palavras secas
iguais bagaço de cana
tão somente são disfarce
de quem repete eu não amo
porém sofre chora sente
e tem todas as fraquezas
desta tola raça humana
*
algumas palavras secas
iguais bagaço de cana
tão somente são disfarce
de quem repete eu não amo
porém sofre chora sente
e tem todas as fraquezas
desta tola raça humana
*
domingo, 25 de outubro de 2009
(des)equilíbrios
líria porto
paredes frias
(corredores não têm alma
no entanto me seguiam
conduziam-me aos lugares)
deixei a casa
(ampliei os meus ex-passos
corro paro rodopio
sem medo de dromedários)
tropeço em corcovas
*
paredes frias
(corredores não têm alma
no entanto me seguiam
conduziam-me aos lugares)
deixei a casa
(ampliei os meus ex-passos
corro paro rodopio
sem medo de dromedários)
tropeço em corcovas
*
sábado, 24 de outubro de 2009
faminta
líria porto
eu disfarço tergiverso
finjo que ela nem existe
a tristeza me persegue
pede água pede alpiste
*
eu disfarço tergiverso
finjo que ela nem existe
a tristeza me persegue
pede água pede alpiste
*
sexta-feira, 23 de outubro de 2009
almodóvar
líria porto
outubro outubra-a
e sempre de (as)salto
vestido encarnado
sapatos vermelhos
:
a rosa que dança
aberta no asfalto
tem cheiro de carne
tem jeito de chaga
tem sangue no tango
tem nome de cármen
*
outubro outubra-a
e sempre de (as)salto
vestido encarnado
sapatos vermelhos
:
a rosa que dança
aberta no asfalto
tem cheiro de carne
tem jeito de chaga
tem sangue no tango
tem nome de cármen
*
quinta-feira, 22 de outubro de 2009
a reza do povo
líria porto
o pão nosso de cada dia
sovado por estes braços fatigados
não nos seja subtraído por ninguém
menos ainda pelos donos do mundo
manipuladores da dor
e da miséria
:
amemo-nos
*
o pão nosso de cada dia
sovado por estes braços fatigados
não nos seja subtraído por ninguém
menos ainda pelos donos do mundo
manipuladores da dor
e da miséria
:
amemo-nos
*
troviscos
líria porto
a vida segue a galope
em verdade o tempo venta
e neste piscar de olhos
já tenho mais de setenta
o meu espelho envelhece
depressa fica embaçado
daqui a pouco me esquece
veste pijama listrado
viver é tão de repente
a morte – eterno mistério
em noites de lua plena
não fico triste nem sério
quem quiser dançar comigo
tomar lugar nesta roda
coloque piercing no umbigo
ou cabelos cor-de-rosa
(sujei minhas mãos na terra
entendo os ranços da vida
exceto judiação
miséria fome e injustiça)
*
a vida segue a galope
em verdade o tempo venta
e neste piscar de olhos
já tenho mais de setenta
o meu espelho envelhece
depressa fica embaçado
daqui a pouco me esquece
veste pijama listrado
viver é tão de repente
a morte – eterno mistério
em noites de lua plena
não fico triste nem sério
quem quiser dançar comigo
tomar lugar nesta roda
coloque piercing no umbigo
ou cabelos cor-de-rosa
(sujei minhas mãos na terra
entendo os ranços da vida
exceto judiação
miséria fome e injustiça)
*
quarta-feira, 21 de outubro de 2009
t. salomão
líria porto
eu tinha uma parceira
a turca
com ela eu tomava chuva
pisava nas enxurradas
voltávamos do colégio juntas
íamos ao cinema - ríamos
e chorávamos
tereza morreu e eu
sinto saudades
de mim
*
eu tinha uma parceira
a turca
com ela eu tomava chuva
pisava nas enxurradas
voltávamos do colégio juntas
íamos ao cinema - ríamos
e chorávamos
tereza morreu e eu
sinto saudades
de mim
*
brejo alegre
líria porto
o vento varria tudo
só ficava no lugar
quem tinha força raiz
aqueles que resistiam
às agruras do cerrado
ao ferrão dos pernilongos
à mortal monotonia
às vezes sinto saudade
retorno por alguns dias
depois volto para casa
coração a borbulhar
a transbordar boa água
agonias descampados
pessoas inesquecíveis
*
o vento varria tudo
só ficava no lugar
quem tinha força raiz
aqueles que resistiam
às agruras do cerrado
ao ferrão dos pernilongos
à mortal monotonia
às vezes sinto saudade
retorno por alguns dias
depois volto para casa
coração a borbulhar
a transbordar boa água
agonias descampados
pessoas inesquecíveis
*
des_maio
líria porto
desmalha-se
vive\morre um pouco
floco de neve pétala
rio solto no despenhadeiro
poeira
brasa no borralho
(passarinho rompe o ovo
abre o olho pela primeira vez)
*
desmalha-se
vive\morre um pouco
floco de neve pétala
rio solto no despenhadeiro
poeira
brasa no borralho
(passarinho rompe o ovo
abre o olho pela primeira vez)
*
terça-feira, 20 de outubro de 2009
segunda-feira, 19 de outubro de 2009
escape
líria porto
é bom brincar de passarinho
abrir os braços a fingir – sou livre
fechar os olhos e planar no sonho
pensar num ninho ao voltar
pra casa
*
é bom brincar de passarinho
abrir os braços a fingir – sou livre
fechar os olhos e planar no sonho
pensar num ninho ao voltar
pra casa
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) lamentações
líria porto
chorei todos os rios mares oceanos
todas as lágrimas das viúvas todas as chuvas
molhei todas as toalhas lenços lençóis
e fronhas
:
chorei as pitangas
*
chorei todos os rios mares oceanos
todas as lágrimas das viúvas todas as chuvas
molhei todas as toalhas lenços lençóis
e fronhas
:
chorei as pitangas
*
domingo, 18 de outubro de 2009
longe
líria porto
quanto mais batia a clara
quanto mais batia a gema
quanto mais crescia o ovo
tanto mais eu me lembrava
de como gostas de bolo
coloquei manteiga açúcar
misturava com a colher
eu ficava com saudade
deu vontade de te ver
de voar onde estivesses
o fermento a farinha
o leite o sentimento
a essência do teu jeito
o gosto bom do teu beijo
eu te queria por perto
esqueci de um detalhe
olha só que distração
ao invés de assar o bolo
congelei foi a saudade
a lágrima a distância
o choro
*
quanto mais batia a clara
quanto mais batia a gema
quanto mais crescia o ovo
tanto mais eu me lembrava
de como gostas de bolo
coloquei manteiga açúcar
misturava com a colher
eu ficava com saudade
deu vontade de te ver
de voar onde estivesses
o fermento a farinha
o leite o sentimento
a essência do teu jeito
o gosto bom do teu beijo
eu te queria por perto
esqueci de um detalhe
olha só que distração
ao invés de assar o bolo
congelei foi a saudade
a lágrima a distância
o choro
*
aqui jaz
líria porto
um dia o moreno vai voltar
e quando regressar será mui tarde
haverá em minha lápide o epitáfio
bebeu taça de ausência
e de saudade
*
um dia o moreno vai voltar
e quando regressar será mui tarde
haverá em minha lápide o epitáfio
bebeu taça de ausência
e de saudade
*
clandestino
líria porto
vou aí onde tu vives
andar pela tua rua
ver a lua que tu vês
o teu mar a tua praia
conhecer cada nervura
entranhada nos caminhos
depois volto para casa
e de ti que me esqueceste
saberei cada detalhe
cada pedaço fatia
que por desamor descaso
trataste de me esconder
*
vou aí onde tu vives
andar pela tua rua
ver a lua que tu vês
o teu mar a tua praia
conhecer cada nervura
entranhada nos caminhos
depois volto para casa
e de ti que me esqueceste
saberei cada detalhe
cada pedaço fatia
que por desamor descaso
trataste de me esconder
*
sábado, 17 de outubro de 2009
pomo-de-adão
líria porto
a folha de parreira
as vergonhas de eva
pecado é comer maçã
com gosto de isopor
*
a folha de parreira
as vergonhas de eva
pecado é comer maçã
com gosto de isopor
*
quinta-feira, 15 de outubro de 2009
ascensão
líria porto
as alegrias postiças
jamais se sentira gente
foi só dor e sujeição
e o filho do patrão
pôs-lhe um filho na barriga
(o menino não vingou)
ela nasceu no sertão
naquela sede de tudo
coração esfarinhado
o chão era pai e mãe
e a terra seca sem viço
sua cama seu colchão
seu corpo virou moeda
moído na mão de todos
fosse qual fosse o macho
os direitos sobre ela
trocavam-na por qualquer troco
partiam sem despedidas
nessa sorte sem fortuna
o seu corpo definhou
virou pele sobre ossos
nem freguês e nem comida
desgostou-se de tal fado
foi ser feliz lá em cima
agora maria brilha
o seu espelho é a lua
o travesseiro uma nuvem
ficou linda como nunca
a estrela mais bonita
das que enfeitam a noite
*
as alegrias postiças
jamais se sentira gente
foi só dor e sujeição
e o filho do patrão
pôs-lhe um filho na barriga
(o menino não vingou)
ela nasceu no sertão
naquela sede de tudo
coração esfarinhado
o chão era pai e mãe
e a terra seca sem viço
sua cama seu colchão
seu corpo virou moeda
moído na mão de todos
fosse qual fosse o macho
os direitos sobre ela
trocavam-na por qualquer troco
partiam sem despedidas
nessa sorte sem fortuna
o seu corpo definhou
virou pele sobre ossos
nem freguês e nem comida
desgostou-se de tal fado
foi ser feliz lá em cima
agora maria brilha
o seu espelho é a lua
o travesseiro uma nuvem
ficou linda como nunca
a estrela mais bonita
das que enfeitam a noite
*
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
propriedade
líria porto
na casa onde moro
sou peixe dentro do aquário
nado peito borboleta
mergulho flutuo divirto-me
afundo choro trabalho
nada aqui é proibido
eu sonho e tenho o mar
o atlântico o pacífico
um lago imenso tranquilo
um rio de águas claras
uma bacia uma bica
tanto faz
a casa é minas
*
na casa onde moro
sou peixe dentro do aquário
nado peito borboleta
mergulho flutuo divirto-me
afundo choro trabalho
nada aqui é proibido
eu sonho e tenho o mar
o atlântico o pacífico
um lago imenso tranquilo
um rio de águas claras
uma bacia uma bica
tanto faz
a casa é minas
*
estrelado
líria porto
numa panela de pedra
manteiga alho cebola
deixar dourar só um pouco
pôr a medida de arroz
o dobro d'água fervente
temperar com sal a gosto
quando secar – que delícia
comer purinho com ovo
*
numa panela de pedra
manteiga alho cebola
deixar dourar só um pouco
pôr a medida de arroz
o dobro d'água fervente
temperar com sal a gosto
quando secar – que delícia
comer purinho com ovo
*
fogaréu
líria porto
há um verso intermitente
está sempre à tocaia
no espelho vejo-o avesso
nuvem negra me atrapalha
sem espada sem nobreza
submeto-me à cangalha
ele empurra o travesseiro
abro os olhos mui calada
ele deita no meu peito
quer rasgar minha mortalha
eu tão pálida tão sem jeito
ele abusa de um atalho
e se instala no meu ventre
(sê poeta não te entraves
nem te escondas do crepúsculo
os vermelhos ficam grávidos)
*
há um verso intermitente
está sempre à tocaia
no espelho vejo-o avesso
nuvem negra me atrapalha
sem espada sem nobreza
submeto-me à cangalha
ele empurra o travesseiro
abro os olhos mui calada
ele deita no meu peito
quer rasgar minha mortalha
eu tão pálida tão sem jeito
ele abusa de um atalho
e se instala no meu ventre
(sê poeta não te entraves
nem te escondas do crepúsculo
os vermelhos ficam grávidos)
*
não vou te esquecer
líria porto
quando eu me for daqui
um lugar que desconheço
e ficar a sete palmos
onde os vermes têm fome
for largada numa vala
a minha carne sem dono
quando eu me for daqui
a vagar pelos escuros
e deixar os meus afetos
meus apegos meus amores
esses versos sem destino
farão a ponte
*
quando eu me for daqui
um lugar que desconheço
e ficar a sete palmos
onde os vermes têm fome
for largada numa vala
a minha carne sem dono
quando eu me for daqui
a vagar pelos escuros
e deixar os meus afetos
meus apegos meus amores
esses versos sem destino
farão a ponte
*
terça-feira, 13 de outubro de 2009
cabuloso
líria porto
talvez eu seja esteja sempre tenha sido ou me torne
daquelas pessoas a ouvirem as pedras antes de atirá-las
pense em rimas estridentes a implorarem esmola nos semáforos
debaixo de tempestade ou chuva de granizo
(numa sacola de plástico)
e fale fale fale ou não diga nada feche-me em silêncios
dê quatro ou sete estalos estéreis histéricos agressivos adjetivados
fique mudo ou gago
ninguém me compreende –– sinto dor nevrálgica
e não dor de dente
daquelas pessoas a ouvirem as pedras antes de atirá-las
pense em rimas estridentes a implorarem esmola nos semáforos
debaixo de tempestade ou chuva de granizo
(numa sacola de plástico)
e fale fale fale ou não diga nada feche-me em silêncios
dê quatro ou sete estalos estéreis histéricos agressivos adjetivados
fique mudo ou gago
ninguém me compreende –– sinto dor nevrálgica
e não dor de dente
*
das mãos de cora
líria porto
versos de milho
agora nos alimentam
nós
poetas sem rima
exilados da terra
vidas de cimento
*
versos de milho
agora nos alimentam
nós
poetas sem rima
exilados da terra
vidas de cimento
*
editora lê - ausculta
líria porto
quando vieres meu bem
insiste na campainha
o tempo esse moleque
pôs tampão nos meus ouvidos
não meças minha emoção
pelo tamanho dos versos
quando sinto - sinto muito
as palavras me emudecem
*
quando vieres meu bem
insiste na campainha
o tempo esse moleque
pôs tampão nos meus ouvidos
não meças minha emoção
pelo tamanho dos versos
quando sinto - sinto muito
as palavras me emudecem
*
segunda-feira, 12 de outubro de 2009
in_descartáveis
líria porto
dentre nossas tralhas
muitas lembranças
:
nenhuma te sirva de mortalha
nem se assemelhe à esperança
*
dentre nossas tralhas
muitas lembranças
:
nenhuma te sirva de mortalha
nem se assemelhe à esperança
*
insosso
líria porto
dia de segunda
embora feriado
sem gosto de sábado
sem cheiro de domingo
dia sorumbático
*
dia de segunda
embora feriado
sem gosto de sábado
sem cheiro de domingo
dia sorumbático
*
casanova
líria porto
um sofá para jandira
de couro macio
cheiro de cio
um querer bem
um sofá de canto
para o acalanto
o chamego
o quebranto
(a cor não importa
o outro era branco)
um sofá para jandira
descansar da lida
relembrar os amores
esquecer agonias
(ser feliz)
um sofá para jandira
sentar-se aos domingos
cochilar e sonhar
com delícias
um sofá de nuvem
algodão ou pluma
um sofá de balanço
um colo
(de braços fortes)
*
um sofá para jandira
de couro macio
cheiro de cio
um querer bem
um sofá de canto
para o acalanto
o chamego
o quebranto
(a cor não importa
o outro era branco)
um sofá para jandira
descansar da lida
relembrar os amores
esquecer agonias
(ser feliz)
um sofá para jandira
sentar-se aos domingos
cochilar e sonhar
com delícias
um sofá de nuvem
algodão ou pluma
um sofá de balanço
um colo
(de braços fortes)
*
arrimo
líria porto
fico a esperar prazenteiro
maria vem todo dia
traseiro fenomenal
meu fundo de garantia
essa mulher maravilha
leva-me em sua canoa
abastece minhas pilhas
faz-me a vida muito boa
navego nas suas ondas
no céu da boca o delírio
minha alegria se alonga
maria é o ar que respiro
sou marinheiro de sorte
maria é minha guarita
a morte vem e me abate
maria me ressuscita
*
fico a esperar prazenteiro
maria vem todo dia
traseiro fenomenal
meu fundo de garantia
essa mulher maravilha
leva-me em sua canoa
abastece minhas pilhas
faz-me a vida muito boa
navego nas suas ondas
no céu da boca o delírio
minha alegria se alonga
maria é o ar que respiro
sou marinheiro de sorte
maria é minha guarita
a morte vem e me abate
maria me ressuscita
*
domingo, 11 de outubro de 2009
batente
líria porto
sente o seu cheiro
abraça-a por trás
encaixe perfeito
beija-lhe as costas
morde sua nuca
bole nos mamilos
o relógio desperta
fala afobada
:
sossega marido
é segunda-feira
*
sente o seu cheiro
abraça-a por trás
encaixe perfeito
beija-lhe as costas
morde sua nuca
bole nos mamilos
o relógio desperta
fala afobada
:
sossega marido
é segunda-feira
*
sábado, 10 de outubro de 2009
solteirona
líria porto
rezava pedia implorava
ia à missa todo dia
às novenas
prometia batia o pé
santo antônio fazia-se
de surdo
*
rezava pedia implorava
ia à missa todo dia
às novenas
prometia batia o pé
santo antônio fazia-se
de surdo
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) das cicatrizes seculares
líria porto
um dia — pequeno — partiste eu fiquei
restou-se-me a culpa estrago sem jeito
saí pelas ruas de olhos sem ver
prendessem-me matassem-me
arrancassem-me os seios
(chorei como a chuva do mês de dezembro)
virei enxurrada poça d’água represa
secou-se-me o leite a vida ruiu
um raio partiu minha alma o espelho
morri reencarnei e ainda padeço
são mil estilhaços com teus olhos dentro
*
um dia — pequeno — partiste eu fiquei
restou-se-me a culpa estrago sem jeito
saí pelas ruas de olhos sem ver
prendessem-me matassem-me
arrancassem-me os seios
(chorei como a chuva do mês de dezembro)
virei enxurrada poça d’água represa
secou-se-me o leite a vida ruiu
um raio partiu minha alma o espelho
morri reencarnei e ainda padeço
são mil estilhaços com teus olhos dentro
*
sexta-feira, 9 de outubro de 2009
ressentimento
líria porto
era traído
e traía
um tiro dentro do ouvido
uma coroa de flores
e os seguintes dizeres
:
a quem amo/odeio
*
era traído
e traía
um tiro dentro do ouvido
uma coroa de flores
e os seguintes dizeres
:
a quem amo/odeio
*
quinta-feira, 8 de outubro de 2009
o fio da meada é cor de prata (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
o tempo passarava e o canto do galo
rasgava como um dardo as madrugadas
amanhã era hoje num instante
embora nos olhássemos
e jamais fôssemos grandes
a vida pássara
traz-nos cabelos brancos
o galo canta
não sei se agora
ou ontem
*
o tempo passarava e o canto do galo
rasgava como um dardo as madrugadas
amanhã era hoje num instante
embora nos olhássemos
e jamais fôssemos grandes
a vida pássara
traz-nos cabelos brancos
o galo canta
não sei se agora
ou ontem
*
o seminarista
líria porto
afunda-se no decote
margeia seus mamilos
escorre pelas bordas
desvia-se até o quadril
desce-lhe pelas coxas
retorna a seu umbigo
enquanto a prima dorme
cheirosa como flor
biquíni de bolinhas
(virgem por um triz)
margeia seus mamilos
escorre pelas bordas
desvia-se até o quadril
desce-lhe pelas coxas
retorna a seu umbigo
enquanto a prima dorme
cheirosa como flor
biquíni de bolinhas
(virgem por um triz)
*
socorro
líria porto
azuis se machucam
ficam quase roxos
caem e desmaiam
como hematomas
chamo a enfermeira
vem roberta silva
faz-lhes boca a boca
eles se aproveitam
:
beijo de língua
*
azuis se machucam
ficam quase roxos
caem e desmaiam
como hematomas
chamo a enfermeira
vem roberta silva
faz-lhes boca a boca
eles se aproveitam
:
beijo de língua
*
quarta-feira, 7 de outubro de 2009
devastação
líria porto
em belo horizonte
a fé não (re)moveu a montanha
fê-lo a mbr s/a
(minerações brasileiras reunidas
sociedade anônima)
*
em belo horizonte
a fé não (re)moveu a montanha
fê-lo a mbr s/a
(minerações brasileiras reunidas
sociedade anônima)
*
campos altos
líria porto
colina após colina
o horizonte se desdobra
e onde pensamos que termina
ainda há minas
:
incontáveis
colina após colina
o horizonte se desdobra
e onde pensamos que termina
ainda há minas
:
incontáveis
*
terça-feira, 6 de outubro de 2009
passe livre (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
quando a foice do destino
ceifar de mim as estrelas
vai me encontrar precavida
não sou de arrastar sandálias
quando a foice do destino
ceifar de mim as estrelas
vai me encontrar precavida
não sou de arrastar sandálias
:
já vivi suficiente
das cangalhas me livrei
aprendi a bater asas
a circular sem fronteiras
*
já vivi suficiente
das cangalhas me livrei
aprendi a bater asas
a circular sem fronteiras
*
invisibilidade
líria porto
esta dor que quando olhas
não compreendes por quê
não é de fratura exposta
é de amor sem resposta
a solidão ninguém vê
*
esta dor que quando olhas
não compreendes por quê
não é de fratura exposta
é de amor sem resposta
a solidão ninguém vê
*
segunda-feira, 5 de outubro de 2009
gradil
líria porto
na gaiola um passarinho
mavioso sabiá –– pobrezito triste sina
ter asas de não voar
*
na gaiola um passarinho
mavioso sabiá –– pobrezito triste sina
ter asas de não voar
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) providência
líria porto
antes que a luz me apague
visto teu olho nu
*
antes que a luz me apague
visto teu olho nu
*
remorso
líria porto
mar revolto
ondas de tristeza e dor
mescladas de vazios solenes
(deixa-me chorar o choro inteiro)
*
mar revolto
ondas de tristeza e dor
mescladas de vazios solenes
(deixa-me chorar o choro inteiro)
*
(publicado no livro asa de passarinho - ed. lê) - façanha
líria porto
tinha três anos não mais
fez um buraco n’areia
e num balde pequenino
buscava água do mar
(trabalhou horas a fio)
quando viu a maré cheia
deu um sorriso e gritou
mamãe mamãe corre aqui
trazi o mar para a praia
*
tinha três anos não mais
fez um buraco n’areia
e num balde pequenino
buscava água do mar
(trabalhou horas a fio)
quando viu a maré cheia
deu um sorriso e gritou
mamãe mamãe corre aqui
trazi o mar para a praia
*
a todo vapor
líria porto
passageiros como as nuvens
deixem-nos chover
trovejar mudar de forma
derreter ante o azul
evaporar
viver é névoa
*
passageiros como as nuvens
deixem-nos chover
trovejar mudar de forma
derreter ante o azul
evaporar
viver é névoa
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) quando o amor se esfuma
líria porto
de tanto tecer possibilidades
tive l.e.r. (lesão por esforço repetitivo)
e quase fiquei triste
ainda não desisti
embora a dor persista
*
de tanto tecer possibilidades
tive l.e.r. (lesão por esforço repetitivo)
e quase fiquei triste
ainda não desisti
embora a dor persista
*
domingo, 4 de outubro de 2009
(publicado no livro asa de passarinho - ed. lê) - arte
líria porto
existe um ipê amarelo
floresce na minha serra
antes da chuva ele explode
nada vi assim tão belo
eu acho – o menino deus
esteve a brincar com ovo
sujou os dedos de gema
e limpou a mão nas flores
*
existe um ipê amarelo
floresce na minha serra
antes da chuva ele explode
nada vi assim tão belo
eu acho – o menino deus
esteve a brincar com ovo
sujou os dedos de gema
e limpou a mão nas flores
*
in_experiência
líria porto
eu plantei uma roseira
quando ela floresceu
sangrou-me os dedos
(ou rosas são perigosas
ou não sei lidar com elas)
*
eu plantei uma roseira
quando ela floresceu
sangrou-me os dedos
(ou rosas são perigosas
ou não sei lidar com elas)
*
sábado, 3 de outubro de 2009
meia volta
líria porto
nuvem escura vento forte
a carroça do leiteiro com capota
maricota –– bota a saia na cabeça
lá vem chuva
*
nuvem escura vento forte
a carroça do leiteiro com capota
maricota –– bota a saia na cabeça
lá vem chuva
*
sexta-feira, 2 de outubro de 2009
babel
líria porto
letras embaralhadas perfilam-se
não entendo patavina
poliglotas trogloditas cientistas eruditos
dei nós na ponta da língua
*
letras embaralhadas perfilam-se
não entendo patavina
poliglotas trogloditas cientistas eruditos
dei nós na ponta da língua
*
(publicado no livro garimpo - editora lê) - especulação
líria porto
viver é capricho
ou é nada disso
quem pode saber
se as pedras não dizem
os lagos cochilam
os montes se calam
e os homens não prestam
atenção
*
viver é capricho
ou é nada disso
quem pode saber
se as pedras não dizem
os lagos cochilam
os montes se calam
e os homens não prestam
atenção
*
evidências
líria porto
falar de amor a quem amamos é tão óbvio
que até nos descuidamos
esquecemo-nos de perfumar os dias óbvios
oferecer as flores óbvias dizer o óbvio eu te amo
e fica tudo assim tão óbvio que amar
parece desamor
*
falar de amor a quem amamos é tão óbvio
que até nos descuidamos
esquecemo-nos de perfumar os dias óbvios
oferecer as flores óbvias dizer o óbvio eu te amo
e fica tudo assim tão óbvio que amar
parece desamor
*
dormentes
líria porto
o corpo quieto estirado na cama
a alma vagueia por mundos e sonhos
e vai à espanha toureia o toureiro
e vai onde estejas te beija te beija
igual passarinho por céus e distâncias
conhece oceanos navios outros ares
corsários paragens reinados rebanhos
a alma é liberta o corpo é escravo
e peca e cansa padece envelhece
enquanto a alma prossegue encantada
*
o corpo quieto estirado na cama
a alma vagueia por mundos e sonhos
e vai à espanha toureia o toureiro
e vai onde estejas te beija te beija
igual passarinho por céus e distâncias
conhece oceanos navios outros ares
corsários paragens reinados rebanhos
a alma é liberta o corpo é escravo
e peca e cansa padece envelhece
enquanto a alma prossegue encantada
*
quinta-feira, 1 de outubro de 2009
mistura fina
líria porto
minha mão branca em tua cara preta
tua mão preta em minha cara branca
desancam quaisquer preconceitos
meu peito encaixado no teu
teu corpo por cima do meu
as pernas embaralhadas
café com leite
*
minha mão branca em tua cara preta
tua mão preta em minha cara branca
desancam quaisquer preconceitos
meu peito encaixado no teu
teu corpo por cima do meu
as pernas embaralhadas
café com leite
*
bandoleiras (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
maritacas maritacam
voam em bando
bicam verdes amarelos
e no meio da algazarra
roubam caquinhos do céu
para enfeitar as asas
*
a terrinha
líria porto
a saudade apertou
peguei a gaita a matula
e piquei a mula
fui pra brejo alegre
*
a saudade apertou
peguei a gaita a matula
e piquei a mula
fui pra brejo alegre
*
rebordosa
líria porto
levei do teu corpo a sede que tinhas
sem água boca amarga investigo
fui justo comigo?
*
levei do teu corpo a sede que tinhas
sem água boca amarga investigo
fui justo comigo?
*
rabo de fogão
líria porto
ora pelas lágrimas
*
ora pelas lágrimas
ora pela fumaça
ora pelas lentes sujas
os olhos se embaçam
a vista se turva
ora pelas lentes sujas
os olhos se embaçam
a vista se turva
*
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