líria porto
palavras vagas escorregadias
melhor deixassem o papel sem nada
ele próprio a se fazer destino
sem o amontoado
de bobagens
*
terça-feira, 22 de abril de 2008
labuta
líria porto
coar nuvem co'a peneira
encharcar inteira a terra
pra depois secar o barro
viver não é um folguedo
às vezes dá um cansaço
o dia-a-dia tem peso
*
coar nuvem co'a peneira
encharcar inteira a terra
pra depois secar o barro
viver não é um folguedo
às vezes dá um cansaço
o dia-a-dia tem peso
*
vazamento
líria porto
existe um furo percebo
por onde nos desfazemos
perdemos nossa energia
esse orifício é o medo
medo da morte da vida
das dores cismas tristezas
das incertezas velhice
dos sofrimentos
das perdas
*
existe um furo percebo
por onde nos desfazemos
perdemos nossa energia
esse orifício é o medo
medo da morte da vida
das dores cismas tristezas
das incertezas velhice
dos sofrimentos
das perdas
*
na fila
líria porto
igual a lagarta em cima da folha
a moça deitada na beira do poço
o sol a banhava envolvia-lhe o corpo
a água esperasse tocasse-a depois
*
igual a lagarta em cima da folha
a moça deitada na beira do poço
o sol a banhava envolvia-lhe o corpo
a água esperasse tocasse-a depois
*
arrogância
líria porto
seu orgulho sua pose
em nada vão lhe ajudar
o nariz sempre empinado
impede-o de olhar abaixo
onde se encontram buracos
armadilhas vãos
e fossos
quem tem o rei na barriga
sabe a fezes e lombrigas
seja rico ou indigente
feito de lata ou de ouro
e a morte –– a tal fulana
esta não poupa ninguém
*
seu orgulho sua pose
em nada vão lhe ajudar
o nariz sempre empinado
impede-o de olhar abaixo
onde se encontram buracos
armadilhas vãos
e fossos
quem tem o rei na barriga
sabe a fezes e lombrigas
seja rico ou indigente
feito de lata ou de ouro
e a morte –– a tal fulana
esta não poupa ninguém
*
ao tom da pele
líria porto
o meu verso ganha cor
cheiro bom sabor tempero
toda vez que um forasteiro
abre as portas do meu corpo
e deixo que ele entre
depois quando vai embora
o versinho se descora
fica assim
tolo
sem jeito
*
o meu verso ganha cor
cheiro bom sabor tempero
toda vez que um forasteiro
abre as portas do meu corpo
e deixo que ele entre
depois quando vai embora
o versinho se descora
fica assim
tolo
sem jeito
*
de_terminado
líria porto
engoliu pus e coágulo
fecharam-se-lhe as narinas
a febre vinha voltava
cansou-o viver sem sentido
então a grande guinada
um lâmina na artéria
*
engoliu pus e coágulo
fecharam-se-lhe as narinas
a febre vinha voltava
cansou-o viver sem sentido
então a grande guinada
um lâmina na artéria
*
espaço ermo
líria porto
sentiu o amor arder sem endereço
procurou astros príncipes mendigos
não houve correspondência
desistiu evaporou-se
sumiu lentamente
seu nome?
poema
*
sentiu o amor arder sem endereço
procurou astros príncipes mendigos
não houve correspondência
desistiu evaporou-se
sumiu lentamente
seu nome?
poema
*
repescagem
líria porto
vida estranha
mudou de cima pra baixo
ou seriam os meus olhos
o jeito meu cabisbaixo?
filhos partem amores somem
as cores perdem seus tons
vermelhos ficam marrons
os azuis acinzentados
ainda bem à manhã
restou-me o canto
do pássaro
frio aumenta lua míngua
navegar tristeza é sina
não há saída
coragem
*
vida estranha
mudou de cima pra baixo
ou seriam os meus olhos
o jeito meu cabisbaixo?
filhos partem amores somem
as cores perdem seus tons
vermelhos ficam marrons
os azuis acinzentados
ainda bem à manhã
restou-me o canto
do pássaro
frio aumenta lua míngua
navegar tristeza é sina
não há saída
coragem
*
segunda-feira, 21 de abril de 2008
flagrante (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
o grilo quieto no teto
parece grilado com algum pensamento
parado no meio do pulo
não vou estragar-lhe a sesta
só mato em legítima defesa
*
o grilo quieto no teto
parece grilado com algum pensamento
parado no meio do pulo
não vou estragar-lhe a sesta
só mato em legítima defesa
*
fantástico
líria porto
leio deitada e o sono
leva-me ao inimaginável
sonho com mundos mágicos
seres alados
príncipes cascatas delícias
e nas ondas do absurdo
ultrapasso tudo
cubro-me com lençóis d'água
*
leio deitada e o sono
leva-me ao inimaginável
sonho com mundos mágicos
seres alados
príncipes cascatas delícias
e nas ondas do absurdo
ultrapasso tudo
cubro-me com lençóis d'água
*
a implacável
líria porto
mais ágeis que os pássaros ou o vento
pensamentos transportam-nos
fabricam deuses demônios asas
só não conseguem driblar
a indigitada dos tempos
*
mais ágeis que os pássaros ou o vento
pensamentos transportam-nos
fabricam deuses demônios asas
só não conseguem driblar
a indigitada dos tempos
*
revisão
líria porto
seguro com firmeza as rédeas do coração
retiro-lhe as reticências – imponho um ponto final
ao amor que agoniza
*
seguro com firmeza as rédeas do coração
retiro-lhe as reticências – imponho um ponto final
ao amor que agoniza
*
domingo, 20 de abril de 2008
minhas rimas
líria porto
não têm rumo
não se arrimam
não se arrumam
não se arredam
não se arriscam
não se arranjam
não se arrulham
não se arrepiam
mas se arrastam
arruinam-me
*
não têm rumo
não se arrimam
não se arrumam
não se arredam
não se arriscam
não se arranjam
não se arrulham
não se arrepiam
mas se arrastam
arruinam-me
*
vergonha
líria porto
escondo a timidez barulho
arrulho embrulho entulho
encalho falho empalho
atrapalho-me
e tenho um filho azul
*
escondo a timidez barulho
arrulho embrulho entulho
encalho falho empalho
atrapalho-me
e tenho um filho azul
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) líder
líria porto
peito pra frente
bunda pra trás
e o batalhão
peito pra frente
bunda pra trás
e o batalhão
atrás
*
*
plenitude
líria porto
gosto de um tanto muito tão demais tão sem cabimento
tal como um gatilho a disparar intenso extenso imenso
completamente
*
gosto de um tanto muito tão demais tão sem cabimento
tal como um gatilho a disparar intenso extenso imenso
completamente
*
lazuli
líria porto
não olhou não viu
o anil do céu abril
parece o criador
fez amor e o azul
surgiu
*
não olhou não viu
o anil do céu abril
parece o criador
fez amor e o azul
surgiu
*
sábado, 19 de abril de 2008
mirante
líria porto
soltei o corpo no mato
destravei o pensamento
pude voar ver as coisas
a montanha a terra o vento
as nuvens o verde as sementes
as flores as galhas tenras
e a ausência de gente
devolveu-me a paz
agradeci ao bom espírito
à mão invisível que me guiou
além da civilização
*
soltei o corpo no mato
destravei o pensamento
pude voar ver as coisas
a montanha a terra o vento
as nuvens o verde as sementes
as flores as galhas tenras
e a ausência de gente
devolveu-me a paz
agradeci ao bom espírito
à mão invisível que me guiou
além da civilização
*
ultimatum
líria porto
nem mas nem meio mais
menos ainda aliás
sequer desculpas poréns
ou encerramos o caso
não sem tempo
ao acaso
outros virão
nulos somenos
sem rumo
nenhuns
chegarão apesar de ti
*
nem mas nem meio mais
menos ainda aliás
sequer desculpas poréns
ou encerramos o caso
não sem tempo
ao acaso
outros virão
nulos somenos
sem rumo
nenhuns
chegarão apesar de ti
*
coleira apertada
líria porto
plantou vento - colheu nada
nem passatempo
no banco de trás igual vira-lata
sem ração e sem torrão
nem rosnava
*
plantou vento - colheu nada
nem passatempo
no banco de trás igual vira-lata
sem ração e sem torrão
nem rosnava
*
desatenções
líria porto
coloca água no fogo
separa e lava os feijões
os feios deixa-os de lado
os murchos os carunchados
bate os bifes amassa o alho
corta a cebola em rodelas
frita o torresmo as batatas
refoga arroz faz farofa
enquanto espera trabalha
prepara a mesa pra todos
:
não te demores seu moço
se se cansar faz tua mala
*
coloca água no fogo
separa e lava os feijões
os feios deixa-os de lado
os murchos os carunchados
bate os bifes amassa o alho
corta a cebola em rodelas
frita o torresmo as batatas
refoga arroz faz farofa
enquanto espera trabalha
prepara a mesa pra todos
:
não te demores seu moço
se se cansar faz tua mala
*
apagão
líria porto
não lhe deixou lembrança
fiapo cisco poeira sombra traço
risco nada
era o que havia a ser feito
pelos beijos que lhe negara
pelas grosserias proferidas
pelas noites mal dormidas
pela intensidade do bocejo
*
não lhe deixou lembrança
fiapo cisco poeira sombra traço
risco nada
era o que havia a ser feito
pelos beijos que lhe negara
pelas grosserias proferidas
pelas noites mal dormidas
pela intensidade do bocejo
*
segunda-feira, 14 de abril de 2008
sábado, 12 de abril de 2008
perfídia
líria porto
olhos de vidro
chocalho no rabo
língua bipartida
chega-nos de través
com muito veneno
igual cascavel
(o couro - cuidado
precisa ser grosso
imune às víboras)
*
olhos de vidro
chocalho no rabo
língua bipartida
chega-nos de través
com muito veneno
igual cascavel
(o couro - cuidado
precisa ser grosso
imune às víboras)
*
sexta-feira, 11 de abril de 2008
os amores de lúcio
líria porto
a água treme arrepia-se
é toda ela emoção
a pedra mantém-se firme
bem agarrada à montanha
a água desce desliza
a pedra cuida ampara-a
águas maria luiza
pedras maria eduarda
*
a água treme arrepia-se
é toda ela emoção
a pedra mantém-se firme
bem agarrada à montanha
a água desce desliza
a pedra cuida ampara-a
águas maria luiza
pedras maria eduarda
*
conclusão
líria porto
tal como a corda ruiu
sem que ninguém percebesse
por desamor ou descuido
rompeu-se o elo entre eles
ficaram sem se falar
um no quarto um no sofá
até que à porta da casa
a tabuleta – aluga-se
*
tal como a corda ruiu
sem que ninguém percebesse
por desamor ou descuido
rompeu-se o elo entre eles
ficaram sem se falar
um no quarto um no sofá
até que à porta da casa
a tabuleta – aluga-se
*
debaixo do tapete
líria porto
não gostas quando me queijo
luscofusco-me tu não vês
se agente não vale transporte
então – para quê?
*
não gostas quando me queijo
luscofusco-me tu não vês
se agente não vale transporte
então – para quê?
*
mosqueteira
líria porto
decidi ser feliz
escrevi em toda parte
eu por mim hoje e sempre
quem me quiser então venha
quem não quiser siga em frente
e nem sinta culpa
estou
mais que nunca
sob minha responsabilidade
*
decidi ser feliz
escrevi em toda parte
eu por mim hoje e sempre
quem me quiser então venha
quem não quiser siga em frente
e nem sinta culpa
estou
mais que nunca
sob minha responsabilidade
*
retalhos
líria porto
procuro-te entre as pessoas
encontro-te ora numa ora noutra
(um sorriso um olhar um dar de ombros)
apavora-me perder tuas migalhas
*
procuro-te entre as pessoas
encontro-te ora numa ora noutra
(um sorriso um olhar um dar de ombros)
apavora-me perder tuas migalhas
*
comandante
líria porto
não crês em deus e nem eu
no entanto –– fidel –– protejam-te o céu
e as estrelas
*
não crês em deus e nem eu
no entanto –– fidel –– protejam-te o céu
e as estrelas
*
vovô
líria porto
bigodes cabelos brancos
mãos postas cara inocente
posava na fotografia
como um deus brincalhão
*
bigodes cabelos brancos
mãos postas cara inocente
posava na fotografia
como um deus brincalhão
*
adolescente
líria porto
aquele amor panfletário
bem-humorado gozoso
foi perdendo a alegria
ficando desanimado
não quero não podes não vais
fez muxoxo cena birra
e por coisas pequeninas
transformou-se em sacrifício
eu desisti desististe
arranjei um namorado
partiste não mais te vi
nunca mais tive notícia
*
aquele amor panfletário
bem-humorado gozoso
foi perdendo a alegria
ficando desanimado
não quero não podes não vais
fez muxoxo cena birra
e por coisas pequeninas
transformou-se em sacrifício
eu desisti desististe
arranjei um namorado
partiste não mais te vi
nunca mais tive notícia
*
papelão
líria porto
manobra suas carências
tal como deus poderoso
ela ali – em seu regaço
entrega-se de alma e corpo
toma posse toma conta
suga-lhe o caldo o sabor
e ela vira bagaço
e ele some no mundo
*
tal como deus poderoso
ela ali – em seu regaço
entrega-se de alma e corpo
toma posse toma conta
suga-lhe o caldo o sabor
e ela vira bagaço
e ele some no mundo
*
quinta-feira, 10 de abril de 2008
folie
líria porto
o sol dormia
sonhava com as estrelas
a lua cheia e grávida
chamou o sol às falas
*
o sol dormia
sonhava com as estrelas
a lua cheia e grávida
chamou o sol às falas
*
passarinhando
líria porto
ando vôo
no pensamento
nas asas do vento
sonho
do beiral da alma
ao colo do moço
coração à boca
cúmplices
*
ando vôo
no pensamento
nas asas do vento
sonho
do beiral da alma
ao colo do moço
coração à boca
cúmplices
*
quarta-feira, 9 de abril de 2008
desnorteio
líria porto
cabeça transtornada
ideias obtusas
falo descalabros
rabisco garatujas
qual um marujo
em primeira
viagem
*
cabeça transtornada
ideias obtusas
falo descalabros
rabisco garatujas
qual um marujo
em primeira
viagem
*
maria bonita
líria porto
acendia lampião
sabia da sua força
e mesmo que tropeçasse
não levava tombos
caminhava
a soprar feridas a sonhar
seus sonhos
*
acendia lampião
sabia da sua força
e mesmo que tropeçasse
não levava tombos
caminhava
a soprar feridas a sonhar
seus sonhos
*
flor da pele
líria porto
a palma da minha mão parece seda da china
azar o teu não tocá-la deixá-la roçar o teu corpo
nas noites findas
*
a palma da minha mão parece seda da china
azar o teu não tocá-la deixá-la roçar o teu corpo
nas noites findas
*
terça-feira, 8 de abril de 2008
nostalgia
líria porto
ao me haver triste
sem razão determinada
fico a pensar em minh'alma
tão cheia de cicatrizes
em quantas foram as feridas
lá de longe doutras vidas
quem as fez
como sangraram
dá-me então um tal vazio
igual se as águas de um rio
em plena enchente
secassem
*
ao me haver triste
sem razão determinada
fico a pensar em minh'alma
tão cheia de cicatrizes
em quantas foram as feridas
lá de longe doutras vidas
quem as fez
como sangraram
dá-me então um tal vazio
igual se as águas de um rio
em plena enchente
secassem
*
mau-tempo
líria porto
madrugada carrancuda
não quis acender o sol
manchou o arrebol de cinza
fez cara brava ranzinza
mandou-o dormir de volta
*
madrugada carrancuda
não quis acender o sol
manchou o arrebol de cinza
fez cara brava ranzinza
mandou-o dormir de volta
*
lusco-fusco
líria porto
as madrugadas os crepúsculos
a beleza entranhada na penumbra
os filhos mestiços da noite e do dia
são lindos
*
as madrugadas os crepúsculos
a beleza entranhada na penumbra
os filhos mestiços da noite e do dia
são lindos
*
a prole
líria porto
empurradoa de mau jeito
uns brutamontes machões
grudada à nossa saia
dependentes e frágeis
:
os nossos filhos e filhas
melhor deixá-los crescer
respeitar-lhes as tendências
as vontades os talentos
(e amá-los)
*
empurradoa de mau jeito
uns brutamontes machões
grudada à nossa saia
dependentes e frágeis
:
os nossos filhos e filhas
melhor deixá-los crescer
respeitar-lhes as tendências
as vontades os talentos
(e amá-los)
*
sexta-feira, 4 de abril de 2008
quinta-feira, 3 de abril de 2008
ofensa
líria porto
jamais diga a verdade aos vaidosos
mesmo que insistam – eles preferem bajulação e lisonja
à sinceridade dos amigos
*
jamais diga a verdade aos vaidosos
mesmo que insistam – eles preferem bajulação e lisonja
à sinceridade dos amigos
*
terça-feira, 1 de abril de 2008
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