segunda-feira, 30 de abril de 2012

barquinho

líria porto

o vento zune
galopa como um cavalo
um raio chispa
balança o corpo da árvore
a tempestade caminha
vem vindo com passos largos
eu corro pra minha casa
cubro a cabeça os ouvidos
espero amansar a chuva
para brincar na enxurrada

*

domingo, 29 de abril de 2012

clave de dó

líria porto

em cada canto ou solfejo
ainda assim erro o tom
e desafino

*

resgate

líria porto

nós que fomos um do outro
voltamos a ser livres

agora quando nos vemos
sem cobranças – só desejo

(algemas matam o amor)

*

ruminante

líria porto

qual olho de camelo –– penso
pela noite sem estrelas
meia lua masca
nuvens

*

sábado, 28 de abril de 2012

con_sentimento

líria porto

aquele que nos maltrata
é com nossa permissão

se não impusermos um basta
em breve beijaremos mãos e pés
do carrasco

*

sexta-feira, 27 de abril de 2012

fugaz

líria porto

o impossível para prender um amor
e o maldito escapou-lhe entre os dedos

o amor é líquido é gás
volátil volúvel

imprevisível

*

o vento

líria porto

esbofeteia-me é um bruto
e quanto mais chuta as portas
mais abro as janelas

*

ultimato

líria porto

por toda parte
perto do porto
por ti pergunto
tu não te importas
(ou nem percebes)
então te peço
à minha porta
vai permanece
antes que percas
a importância
pois vou partir
e quando parto
é sem dor

*

quinta-feira, 26 de abril de 2012

gula

líria porto

janta dorme
acorda com fome
levanta come
:
come e dorme

*

crítica

líria porto

o muro pichado desmoronou
:
de muro a entulho
que dó

*

abuso

líria porto

um galo me acorda
fura o meu sono com agudos
rolo do seu canto pra beirada
pulo da cama e cutuco
o sol

é madrugada

*

mandinga

líria porto

apaga o apego
apazigua o espírito
desafoga a mágoa
a ruga se extingue
:
água-benta
pinga?

*

quarta-feira, 25 de abril de 2012

risco

líria porto

tudo o que quero e roço
às vezes não posso ou temo
então eu me atrevo fecho os olhos
e pulo na escuridão

*

trêmulos

líria porto

abril se abre
(des_maio)
:
desmalham-se os dias
outono outono

eu por um frio

*

help me

líria porto

a chuva caiu
molhou minha asa
e eu que não vivo sem voo
sou peixe e me afogo
no ar

*

cai não cai

líria porto

arrulho algazarra
são periquitinhos verdes
nas grimpas das árvores

*

branca

líria porto

com suas pétalas e perfume
mamãe dançava valsa

(espinhos eu nem percebia
eles não me tocavam)

*

bom dia

líria porto

quem dorme até tarde quem fecha as janelas
não sabe o que perde em cores e sons
:
há sempre uma orquestra e uma aquarela
no show das manhãs

*

segunda-feira, 23 de abril de 2012

hematoma

líria porto

a lua mui macha
e o solferino a dormir
no horizonte

*

sinopse

líria porto

não sou o que pensas
nem sou o que penso
sou o que estou
e a_penas

*

domingo, 22 de abril de 2012

indução

líria porto

tira esse cheiro perfume de puta ordena-lhe o pai
e a menina mal saída dos cueiros decide
é isso o que vou ser a vida inteira

(e não teve dúvida)

*

sexta-feira, 20 de abril de 2012

fora de tempo

líria porto

as nuvens roncavam alto
vestiam capa cinzenta
ouviu-se então um estalo
abriu-se o abril por dentro
caiu uma trabuzana
a poça fez-se tamanha
agora não há quem possa
sair da lama

*

quarta-feira, 18 de abril de 2012

aos reis

líria porto

nem incenso nem mirra
quero é comida no prato
também sou filho de deus
carrego a cruz
dos pecados

*

terça-feira, 17 de abril de 2012

arrasta-pé

líria porto

dançar um xaxado
com bafo-cheiroso
é bom divertido
mas é que o estrupício
só chega atrasado
e isso me obriga
a ir com outro gajo
pois cá no sertão
se dás uma tábua
recusas função
acabas rasgado
no bucho

*

segunda-feira, 16 de abril de 2012

iracema

líria porto

atarracada baixinha
na ala de crônicos do hospício
pediu para ver minhas filhas

aprontei-as como princesas
entramos no antro dos malucos
:
vamos dar choque nelas?

(bonita é a loucura
o resto é caraminguá)

*

feitor

líria porto

sem respostas o corpo reage 
tem vertigens dores cãibras
mostra quem comanda

(ou dás
ou desces)

*

domingo, 15 de abril de 2012

dádivas

líria porto

tudo que é meu ou já foi
um dia me pertenceu??

*

insone

líria porto

dorme menina dorme
converso comigo mesma
o corpo mantém-se indócil
a brincar de pique-esconde
com minha alma travessa

*

sábado, 14 de abril de 2012

constatação

líria porto

toda vez que volto atrás
piso na sombra

*

diagnóstico

líria porto

prego tem cefaleia
labirintite quem tem
é o parafuso

*

voos

líria porto

ser feliz é básico
primeira necessidade

não é fácil nem difícil
demanda um tanto de audácia

de colocar dinamite
naquilo que nos oprime

e exercitar nossas asas

*

sexta-feira, 13 de abril de 2012

passeio


líria porto

pelo buraco da fechadura
víamos o mundo
então arrombei a porta
e chamei francisco

o menino veio
andava meio bambo
era divertido
nós enveredados
por tantos caminhos

avó e neto
nossa brincadeira
proferida

*

re_visão

líria porto

sem tinta nos cabelos
esmalte pintura na cara
assim é que eu reformo
a minha fachada

e vou morrer nuinha
como vim ao mundo

*

ascensão

líria porto

enterraram-lhe a alma
o corpo se evapora
sobe todos os degraus
da imaginação

*

trajetória

líria porto

na pele o mapa –– os risos submersos
a terra arada as corredeiras os precipícios
as precipitações

*

(peguei o sol no pulo) de coque

líria porto

na primavera
primaveras-me
no outono
outono-me

fiquei velho
resgatei a meninice
a alma virou verão
o corpo inverna

bebo da água
e do vinho

*

quinta-feira, 12 de abril de 2012

massacre

líria porto

uma avalanche e tu lá
como um verme sob a pata
do elefante

*

transbordamento

líria porto

eu tenho um rio nas veias
o mar é meu coração e amar é a maré
cheia

*

quarta-feira, 11 de abril de 2012

chuvisquero

líria porto

simples como nós em pingos d'água
caminhos escorregadios sob pés
descalços

*

gota

líria porto

sobre o céu de min(as)
nuvens cinzentas e um raio
a espetar-me o pé como
um espinho

rio para trans_bordar
                             a dor

*

pontaria

líria porto

o olho  pupila dilatada
qual cano de revólver

(e tu na mira)

*

vulnerabilidade

líria porto

mais que a morte
intimida-me o calcanhar
de aquiles

*

terça-feira, 10 de abril de 2012

condimentos

líria porto

lágrimas salgadas
o amargo da boca
humor azedo

se deu errado
falhou no tempero
melhor apimentá-la
:
a vida é agridoce

*

segunda-feira, 9 de abril de 2012

tiro

líria porto

a dor que atravessa a alma e nada resolve
é igual a bala do revólver - mata

*

domingo, 8 de abril de 2012

trêmula

líria porto

o mar batia na pedra
o vento frio

teu agasalho em meus ombros
o teu afago de homem

voltei pra casa - partiste
meu cobertor é tão triste

não tem orelhas

*

sábado, 7 de abril de 2012

barreira

líria porto

desde que um ciumento engaiolou meus olhos
tento perceber quem chega pelo cheiro

isso tem efeito diabólico - eu sinto vontade
de pular a cerca

*

sexta-feira, 6 de abril de 2012

infernal

líria porto

cobertas pela neve asas desfolhadas
pesadas como pecados
:
anjos não voam no inverno

*

compromisso

líria porto

se eu pudesse - quisesses
teríamos ido mais fundo
e o mundo seria outro
pelo menos para nós
que nos olhamos nos olhos
por um tempo transitório
e único

*

alfinetada

líria porto

uma dor da gota subtraiu-lhe o prazer
da carne  viver é ou não é
uma metáfora?

*

leitura


líria porto

para bom entendedor pingo é pingo
para mal entendedor palavra
é hieróglifo

*

terça-feira, 3 de abril de 2012

perdição

líria porto

no outono
as árvores perdem as folhas
os anjos perdem as penas
o vento perde o rumo
eu perco a cabeça
o prumo

todos – sem exceção – perdidos pelo
c r e p ú s c u l o 

*

segunda-feira, 2 de abril de 2012

inverno


líria porto

a neve pousa em meus ombros
descolore-me os cabelos

penetra pelos meus poros
esfria o calor de dentro

neblina há  sobre os olhos
eu vejo tudo cinzento

a vida é breve
ela é breve

uma lufada de vento

*

dedicatória

nus descampados (im)puros
fiamos o plenilúnio

(líria porto)



*















quem tem pena de passarinho
é passarinho

(líria porto)

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