líria porto
no fundo no fundo
todo furo quer ser
preenchido
*
segunda-feira, 31 de maio de 2010
resta_bele_cimento
líria porto
sarou sem remédio
levou algum tempo
porém ficou bem
não usou ninguém
e nem machucou
inocentes
*
sarou sem remédio
levou algum tempo
porém ficou bem
não usou ninguém
e nem machucou
inocentes
*
domingo, 30 de maio de 2010
pudores
líria porto
se um dia eu te chegar ao coração
conseguires entender meus sentimentos
perceberes que em meu engatinhar
as pedras também sangram-me os joelhos
se tocares levemente os meus versos
e eles te aquecerem mãos e pés
se meus olhos te inundarem
pode ser que tenhamos outra chance
que consigas abrandar
minha nudez
*
se um dia eu te chegar ao coração
conseguires entender meus sentimentos
perceberes que em meu engatinhar
as pedras também sangram-me os joelhos
se tocares levemente os meus versos
e eles te aquecerem mãos e pés
se meus olhos te inundarem
pode ser que tenhamos outra chance
que consigas abrandar
minha nudez
*
vinagre
líria porto
amassou-me o coração co'os pés
pisou-o e repisou-o sucessivas vezes
coou-lhe o sumo mas não mo bebeu
envelheço num tonel
*
amassou-me o coração co'os pés
pisou-o e repisou-o sucessivas vezes
coou-lhe o sumo mas não mo bebeu
envelheço num tonel
*
sábado, 29 de maio de 2010
neblina
líria porto
jamais vira tal árvore
as galhas as folhas as flores
:
fica a pensar houve tempo
em que só olhava
as sombras
*
jamais vira tal árvore
as galhas as folhas as flores
:
fica a pensar houve tempo
em que só olhava
as sombras
*
bis_tu_ris
líria porto
não sei se veio primeiro
o desamor ou a dúvida
fosse o que fosse
doeu pra burro
fez-se preciso intervir
:
procedimento
cirúrgico
*
não sei se veio primeiro
o desamor ou a dúvida
fosse o que fosse
doeu pra burro
fez-se preciso intervir
:
procedimento
cirúrgico
*
sexta-feira, 28 de maio de 2010
sol_teira
líria porto
todo mês a lua míngua
aborta brilho
mesmo quando cresce
faz de tudo e não consegue
parir estrelas
*
todo mês a lua míngua
aborta brilho
mesmo quando cresce
faz de tudo e não consegue
parir estrelas
*
(publicado no livro asa de passarinho - ed. lê) - desejo
líria porto
teimam em voar
tremulam as pétalas
flores são borboletas
amarradas pelas pernas
*
teimam em voar
tremulam as pétalas
flores são borboletas
amarradas pelas pernas
*
quinta-feira, 27 de maio de 2010
incógnito
líria porto
caminho dias a fio
sem ninguém saber quem sou
uma vez canto assobio
outra vez finjo de doido
voo como um passarinho
coisa boa é ser anônimo
ninguém vem bulir comigo
isso sim – sou o meu dono
*
caminho dias a fio
sem ninguém saber quem sou
uma vez canto assobio
outra vez finjo de doido
voo como um passarinho
coisa boa é ser anônimo
ninguém vem bulir comigo
isso sim – sou o meu dono
*
quarta-feira, 26 de maio de 2010
na realidade
líria porto
abracadabra
bracadabra
racadabra
acadabra
cadabra
adabra
dabra
abra
bra
ra
a
abracadabra
abracadabr
abracadab
abracada
abracad
abraca
abrac
abra
abr
ab
a
(não tem mágica)
*
em vão
líria porto
o moço boca de beijo
pele morena
bigodes
aposto que nem se lembra
do quanto gosto que venha
ao portãozinho da frente
para um dedinho de prosa
adeus flor de miosótis
flor de açucena de abóbora
chegaram a noite o vento
a chuva fina
a tristeza
a moita virou touceira
ficou escuro
e agora?
*
o moço boca de beijo
pele morena
bigodes
aposto que nem se lembra
do quanto gosto que venha
ao portãozinho da frente
para um dedinho de prosa
adeus flor de miosótis
flor de açucena de abóbora
chegaram a noite o vento
a chuva fina
a tristeza
a moita virou touceira
ficou escuro
e agora?
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) na calada da noite
líria porto
adoro quando ele rouba
palavras da minha boca
*
adoro quando ele rouba
palavras da minha boca
*
pua
líria porto
queres saber não perguntes
respostas podem machucar
revelar minúcias
verdade é ponta de lança
*
queres saber não perguntes
respostas podem machucar
revelar minúcias
verdade é ponta de lança
*
segundo stevenson
líria porto
um homem é dois
ou mais
médico e monstro
anjo e demônio
bombom
sal
gado
*
um homem é dois
ou mais
médico e monstro
anjo e demônio
bombom
sal
gado
*
terça-feira, 25 de maio de 2010
marginal
líria porto
meu senhor eu não sou digna
de frequentar vosso paço
ponho-me nas cercanias
a espreitar vossos pares
os que registram em papiro
a vossa escrita impensável
meus versos trazem o estigma
a nódoa das concubinas
e vossa casta – tão fina
não pode ser conspurcada
(não mais do que já está)
*
meu senhor eu não sou digna
de frequentar vosso paço
ponho-me nas cercanias
a espreitar vossos pares
os que registram em papiro
a vossa escrita impensável
meus versos trazem o estigma
a nódoa das concubinas
e vossa casta – tão fina
não pode ser conspurcada
(não mais do que já está)
*
tramas
líria porto
deslizar pelos teus pelos
afagar teu dorso nu
pousar em teu aconchego
descansar em ti da minha fadiga
ser a mais amiga das amigas
a mais enamorada
a amada
pelos teus dedos
pelos meus apelos
o fio o laço
a teia
*
deslizar pelos teus pelos
afagar teu dorso nu
pousar em teu aconchego
descansar em ti da minha fadiga
ser a mais amiga das amigas
a mais enamorada
a amada
pelos teus dedos
pelos meus apelos
o fio o laço
a teia
*
depois
líria porto
é chegada a minha hora
nunca mais vou me sentir
um estranho no vinho
agora bebo vodka
*
é chegada a minha hora
nunca mais vou me sentir
um estranho no vinho
agora bebo vodka
*
segunda-feira, 24 de maio de 2010
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - pistas
líria porto
cada saudade um buraco
um oco
um vazio
um furo
emmenthal meu caro watson
:
coração é isso
um queijo suíço
*
cada saudade um buraco
um oco
um vazio
um furo
emmenthal meu caro watson
:
coração é isso
um queijo suíço
*
segundo seu geraldo
líria porto
o mundo é dois
três é santíssima trindade
sem pecado não tem salvação
*
o mundo é dois
três é santíssima trindade
sem pecado não tem salvação
*
desen/canto
líria porto
passarinho tão quieto
troca as penas fica mudo
no inverno neste frio
o inferno é ficar nu(lo)
*
passarinho tão quieto
troca as penas fica mudo
no inverno neste frio
o inferno é ficar nu(lo)
*
domingo, 23 de maio de 2010
louca
líria porto
tivesse equilíbrio
comprava sombrinha
e andava no arame
sequer exibe brilho
nem é uma estrela
de roliúde
fosse então poeta
fizesse versos rimas
usasse redondilhas
pouca para tantos
para mim doida
de pérola
*
tivesse equilíbrio
comprava sombrinha
e andava no arame
sequer exibe brilho
nem é uma estrela
de roliúde
fosse então poeta
fizesse versos rimas
usasse redondilhas
pouca para tantos
para mim doida
de pérola
*
sábado, 22 de maio de 2010
barroco e velha piá
líria porto
seu pauzinho penetrava-lhe entre as coxas
ia e vinha em movimento –– ela rodava os quadris
anjo e velha contorciam-se ele e ela
céu adentro
:
e entravam em parafuso
*
seu pauzinho penetrava-lhe entre as coxas
ia e vinha em movimento –– ela rodava os quadris
anjo e velha contorciam-se ele e ela
céu adentro
:
e entravam em parafuso
*
sexta-feira, 21 de maio de 2010
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) dissimulação
líria porto
no tanto da boca
espanto
no quanto do olho
pranto
no canto de tudo
marulho
e no intanto
rio
*
no tanto da boca
espanto
no quanto do olho
pranto
no canto de tudo
marulho
e no intanto
rio
*
ex_tinto
líria porto
um deus ou uma estátua
sem sangue vontade ânimo
erupção
infeliz com o homem
como pedra
: cinza
*
um deus ou uma estátua
sem sangue vontade ânimo
erupção
infeliz com o homem
como pedra
: cinza
*
quinta-feira, 20 de maio de 2010
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) fluidos
líria porto
tornei-me assim liquefeita
quando daquela feita
despi-me de nãos e sins
de mim então me perdi
nessa vontade inconclusa
acumulada no rim
ficou a mágoa comigo
fincada dentro do umbigo
quase criava raiz
minha tristeza de chuva
esta amargura profusa
tem olhos túmidos
sou tal e qual o dilúvio
derramo transbordo enxurro
corto os pulsos
*
tornei-me assim liquefeita
quando daquela feita
despi-me de nãos e sins
de mim então me perdi
nessa vontade inconclusa
acumulada no rim
ficou a mágoa comigo
fincada dentro do umbigo
quase criava raiz
minha tristeza de chuva
esta amargura profusa
tem olhos túmidos
sou tal e qual o dilúvio
derramo transbordo enxurro
corto os pulsos
*
tentativas
líria porto
vou escrever nas paredes
no corredor na varanda
nos espelhos lá do quarto
falar de todas as mágoas
entaladas reprimidas
com letras bem desenhadas
para que não duvides
:
jamais por raiva
vou escrever nas paredes
no corredor na varanda
nos espelhos lá do quarto
falar de todas as mágoas
entaladas reprimidas
com letras bem desenhadas
para que não duvides
:
jamais por raiva
revide
mas pela necessidade
de retomar o diálogo
colocar pingos
nos is
mas pela necessidade
de retomar o diálogo
colocar pingos
nos is
*
pancada
líria porto
levou um murro na boca
chutes ao pé do ouvido
sentiu estalar-lhe um osso
o olho perdeu o brilho
quis chorar não tinha lágrima
quis morrer não tinha vida
*
levou um murro na boca
chutes ao pé do ouvido
sentiu estalar-lhe um osso
o olho perdeu o brilho
quis chorar não tinha lágrima
quis morrer não tinha vida
*
quarta-feira, 19 de maio de 2010
definho
líria porto
ao revirar-me no avesso
escrever com mão canhota
de um mal ainda padeço
sinto saudades da outra
da que fui tão corajosa
a enfrentar tudo e todos
sem jamais temer a vida
e muito menos a morte
*
ao revirar-me no avesso
escrever com mão canhota
de um mal ainda padeço
sinto saudades da outra
da que fui tão corajosa
a enfrentar tudo e todos
sem jamais temer a vida
e muito menos a morte
*
simplesmente
líria porto
di_lapidar o poema
tirar-lhe as letras palavras
deixá-lo nu poesia
e mais nada
*
di_lapidar o poema
tirar-lhe as letras palavras
deixá-lo nu poesia
e mais nada
*
ladainha
líria porto
faço verso rastejante
igual cobra no papel
faço verso flutuante
passarinho lá no céu
faço verso comprimido
fechado dentro do frasco
faço verso assim ridículo
acostumado ao fiasco
faço verso bem florido
nascido em pleno setembro
faço verso esquecido
o jeito dele nem lembro
faço verso galopante
como visita de amante
faço verso des'tamanho
coração de minha mãe
faço verso
faço verso
faço ver
*
faço verso rastejante
igual cobra no papel
faço verso flutuante
passarinho lá no céu
faço verso comprimido
fechado dentro do frasco
faço verso assim ridículo
acostumado ao fiasco
faço verso bem florido
nascido em pleno setembro
faço verso esquecido
o jeito dele nem lembro
faço verso galopante
como visita de amante
faço verso des'tamanho
coração de minha mãe
faço verso
faço verso
faço ver
*
sur_presa
líria porto
fecho os olhos abro a cortina
sinto a claridade sinto o cheiro
escuto o trinar dos passarinhos
e quando a manhã me abraça inteira
permito que imagens se aproximem
um sentido por vez
*
fecho os olhos abro a cortina
sinto a claridade sinto o cheiro
escuto o trinar dos passarinhos
e quando a manhã me abraça inteira
permito que imagens se aproximem
um sentido por vez
*
terça-feira, 18 de maio de 2010
abissal
líria porto
entre o vazio e o nada
havia a sua morada
buraco desse tamanho
numa noite mui largada
chorou um mundão de lágrimas
as águas do oceano
*
entre o vazio e o nada
havia a sua morada
buraco desse tamanho
numa noite mui largada
chorou um mundão de lágrimas
as águas do oceano
*
majoritários
líria porto
helvécio tem um palácio
acácio tinha um negócio
e lúcio o precipício
no início não foi fácil
fomos todos para o hospício
mas depois ficamos só_cios
*
helvécio tem um palácio
acácio tinha um negócio
e lúcio o precipício
no início não foi fácil
fomos todos para o hospício
mas depois ficamos só_cios
*
amar é fogo
líria porto
recados cartas bilhetes
eu risquei um pau de fósforo
e as palavras viraram
fumaça
*
recados cartas bilhetes
eu risquei um pau de fósforo
e as palavras viraram
fumaça
*
(publicado em cadela prateada - ed. penalux) - sílfide
líria porto
dentro das quatro paredes
inventava ser feliz
escancarava a janela
abria as asas em leque
flutuava
ia a paris
*
dentro das quatro paredes
inventava ser feliz
escancarava a janela
abria as asas em leque
flutuava
ia a paris
*
segunda-feira, 17 de maio de 2010
um ano
sofrimentos
líria porto
dias de dor
o tempo se alonga noite adentro
:
desejar morrer é compreensível
mas não morremos
*
dias de dor
o tempo se alonga noite adentro
:
desejar morrer é compreensível
mas não morremos
*
domingo, 16 de maio de 2010
dominante
líria porto
bastante
antes depois durante
de um tanto sufocante
transbordante
a fazer cada instante
pesar como elefante
*
bastante
antes depois durante
de um tanto sufocante
transbordante
a fazer cada instante
pesar como elefante
*
sábado, 15 de maio de 2010
desvario
líria porto
paixões arrebatam-nos
assemelhamo-nos aos terremotos
aluviões cataclismos martírios
delírios
tudo a um só tempo
*
paixões arrebatam-nos
assemelhamo-nos aos terremotos
aluviões cataclismos martírios
delírios
tudo a um só tempo
*
sexta-feira, 14 de maio de 2010
mato é mato
líria porto
passarim bicou o grilo o seu verde o seu cri-cri
pobre grilo coitadinho nunca mais a luz
do sol
*
passarim bicou o grilo o seu verde o seu cri-cri
pobre grilo coitadinho nunca mais a luz
do sol
*
quinta-feira, 13 de maio de 2010
(publicado no livro asa de passarinho - ed. lê) - pulmão
líria porto
doutor
acho que engoli um passarinho
pois quando respiro meu peito assobia
improvável impossível
deve ser pneumonia
fala trinta e três trinta e três
trinta e três
:
fiuuuuuuuuuu
*
doutor
acho que engoli um passarinho
pois quando respiro meu peito assobia
improvável impossível
deve ser pneumonia
fala trinta e três trinta e três
trinta e três
:
fiuuuuuuuuuu
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) confessionário
líria porto
doutor
a dor que sinto
uma chaga em cada poro
abre o coração minha senhora
sou todo ouvidos
*
doutor
a dor que sinto
uma chaga em cada poro
abre o coração minha senhora
sou todo ouvidos
*
quarta-feira, 12 de maio de 2010
(r)evolução dos bichos
líria porto
trocaram ternos gravatas
por batas de algodão
deixaram crescer os pelos
esses profetas modernos
que levavam nas mochilas
paz e amor
*
trocaram ternos gravatas
por batas de algodão
deixaram crescer os pelos
esses profetas modernos
que levavam nas mochilas
paz e amor
*
terça-feira, 11 de maio de 2010
o visitante (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
já o inverno me rodeia
tece sua teia branca
finca estaca lá na porta
entra por baixo das telhas
reclama lenha coberta
arranha-me a pele
eu quieta no meu canto
ele insiste pede leite
uma dose de conhaque
chá de cravo de canela
chocolate sopa quente
agasalho meias vela
o inverno veio cedo
com seus braços magricelas
respiração ofegante
pouco cabelo
misérias
*
le visiteur
déjà l´hiver m´entoure
tisse sa toile blanche
fiche pieu à la porte
se glisse sous les tuiles
réclame bois, couvre-lit
érafle ma peau
moi paisible dans mon coin
il insiste pour du lait
une gorgée de cognac
du thé d´oeillet, de cannelle
du chocolat, bouillon chaud
fourrures, bougies, bas de laine
l´hiver est venu de bonne heure
avec ses bras maigrelets
au souffle haletant
peu de cheveux
des misères
líria porto
(tradução para o francês de ademar ribeiro)
já o inverno me rodeia
tece sua teia branca
finca estaca lá na porta
entra por baixo das telhas
reclama lenha coberta
arranha-me a pele
eu quieta no meu canto
ele insiste pede leite
uma dose de conhaque
chá de cravo de canela
chocolate sopa quente
agasalho meias vela
o inverno veio cedo
com seus braços magricelas
respiração ofegante
pouco cabelo
misérias
*
le visiteur
déjà l´hiver m´entoure
tisse sa toile blanche
fiche pieu à la porte
se glisse sous les tuiles
réclame bois, couvre-lit
érafle ma peau
moi paisible dans mon coin
il insiste pour du lait
une gorgée de cognac
du thé d´oeillet, de cannelle
du chocolat, bouillon chaud
fourrures, bougies, bas de laine
l´hiver est venu de bonne heure
avec ses bras maigrelets
au souffle haletant
peu de cheveux
des misères
líria porto
(tradução para o francês de ademar ribeiro)
até certo ponto
líria porto
o tempo me deixou redonda
sem ponta sem quina sem atrito
e ninguém mais se machuca
:
a não ser que pise em mim
(daí eu empurro)
*
o tempo me deixou redonda
sem ponta sem quina sem atrito
e ninguém mais se machuca
:
a não ser que pise em mim
(daí eu empurro)
*
carnívora
líria porto
farejar teu ombro o pescoço
roçar-me nos teus bigodes
embrenhar-me pela tua boca
perder-me
e nunca nunca mais
abrir os olhos
*
farejar teu ombro o pescoço
roçar-me nos teus bigodes
embrenhar-me pela tua boca
perder-me
e nunca nunca mais
abrir os olhos
*
segunda-feira, 10 de maio de 2010
(publicado no livro garimpo - editora lê) - traumas
líria porto
quantos fatos
decorrentes
das correntes
da memória
são imbróglios
são algemas
que nos prendem
a nós próprios
que nos tornam
tão imóveis
e inativos
quanto as rochas
*
quantos fatos
decorrentes
das correntes
da memória
são imbróglios
são algemas
que nos prendem
a nós próprios
que nos tornam
tão imóveis
e inativos
quanto as rochas
*
domingo, 9 de maio de 2010
ascendência
líria porto
a vida nada me pede
pelo contrário ordena-me
: dá-me ou desce
à vida obedeço
e prossigo
e envelheço
*
a vida nada me pede
pelo contrário ordena-me
: dá-me ou desce
à vida obedeço
e prossigo
e envelheço
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) herança
líria porto
meus velhos chinelos
macios como as mãos de minha mãe
tinham sumido
ontem achei os meus chinelos
no corpo tanto conforto passos seguros
na alma
a certeza dos chinelos velhos
*
meus velhos chinelos
macios como as mãos de minha mãe
tinham sumido
ontem achei os meus chinelos
no corpo tanto conforto passos seguros
na alma
a certeza dos chinelos velhos
*
não chores meu bem
líria porto
na pontinha dos pés
tão igual a bailarina
menininha estende o braço
tenta alcançar a lua
e fura o dedo na
estrela
*
na pontinha dos pés
tão igual a bailarina
menininha estende o braço
tenta alcançar a lua
e fura o dedo na
estrela
*
triângulo
líria porto
fez um xale de tricô
como se tecesse versos
um afago para os ombros
no inverno - afetos
*
fez um xale de tricô
como se tecesse versos
um afago para os ombros
no inverno - afetos
*
sábado, 8 de maio de 2010
(para o livro sem pecado não tem salvação) folhetim
líria porto
eu quis mamãe colorida
cabeleira platinada
nas charretes tão bonita
quanto a zape ou a jussara
tivesse ela ancas largas
blusa leve com decote
requebrasse igual sarita
fosse o foco dos olhares
pobre mãe –– sempre discreta
vestidos bege ou cinza
não tinha saias rodadas
e nem joelhos à vista
meus ocos sonhos vadios
eram bocas de batom
queria ser como as putas
faltou-me capacidade
cabeleira platinada
nas charretes tão bonita
quanto a zape ou a jussara
tivesse ela ancas largas
blusa leve com decote
requebrasse igual sarita
fosse o foco dos olhares
pobre mãe –– sempre discreta
vestidos bege ou cinza
não tinha saias rodadas
e nem joelhos à vista
meus ocos sonhos vadios
eram bocas de batom
queria ser como as putas
faltou-me capacidade
*
um dia não vai funcionar
líria porto
todo ano
em janeiro
quando penso
minha morte
será neste
cruzo os dedos
e espero
dezembro
*
todo ano
em janeiro
quando penso
minha morte
será neste
cruzo os dedos
e espero
dezembro
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) casadoira
líria porto
ainda que velha
caindo os pedaços
eu vou para a grécia
catar os meus cacos
e nua na praia
radiante de azul
de casas caiadas
eu vou mergulhar
num rochedo
de braços
morenos
e quebrar
muitos pratos
*
ainda que velha
caindo os pedaços
eu vou para a grécia
catar os meus cacos
e nua na praia
radiante de azul
de casas caiadas
eu vou mergulhar
num rochedo
de braços
morenos
e quebrar
muitos pratos
*
sexta-feira, 7 de maio de 2010
os olhos da coruja
líria porto
se pudessem proteger as crias
livrá-las das dores dos perigos
mães carregam o coração nas mãos
é sempre um susto
*
se pudessem proteger as crias
livrá-las das dores dos perigos
mães carregam o coração nas mãos
é sempre um susto
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) de transformar o sofrimento
líria porto
no inverno era pior
doíam-lhe os dedos os joelhos
as costas os braços as pernas
os pés
e quando lhe perguntávamos
como te sentes mãe
respondia-nos
:
no maior romantismo
*
no inverno era pior
doíam-lhe os dedos os joelhos
as costas os braços as pernas
os pés
e quando lhe perguntávamos
como te sentes mãe
respondia-nos
:
no maior romantismo
*
(publicado no livro olho nu - ed. patuá) tolerância
líria porto
quebrávamos castanhas nozes avelãs
nas junções das portas e das janelas
maria varria varria varria
mamãe acalmava-a
:
sossega maria deixa os meninos
hoje é natal
*
quebrávamos castanhas nozes avelãs
nas junções das portas e das janelas
maria varria varria varria
mamãe acalmava-a
:
sossega maria deixa os meninos
hoje é natal
*
revertério
líria porto
para espantá-lo
precisou rasgar o verbo
pesar nas tintas
deu-se o contrário
: o amor é cego
e surdo e tolo
e egoísta
*
para espantá-lo
precisou rasgar o verbo
pesar nas tintas
deu-se o contrário
: o amor é cego
e surdo e tolo
e egoísta
*
po_mar
líria porto
lavrar a terra
semear nela umas letras
deixar crescerem as palavras
florescerem os versos
se alguns frutificarem
devem amadurecer
e que a polpa do poema
alimente almas
*
lavrar a terra
semear nela umas letras
deixar crescerem as palavras
florescerem os versos
se alguns frutificarem
devem amadurecer
e que a polpa do poema
alimente almas
*
quinta-feira, 6 de maio de 2010
paparazzi
líria porto
no rastro da estrela
um resto de luz
um rosto sem rugas
um riso um rato
um parasita
*
no rastro da estrela
um resto de luz
um rosto sem rugas
um riso um rato
um parasita
*
latifúndio itabirano
líria porto
pu_los ao peito
abracei-os beijei-os
senti-os à emoção – os três tomos
(obra completa de drummond)
pu_los ao peito
abracei-os beijei-os
senti-os à emoção – os três tomos
(obra completa de drummond)
bem assim
ao rés da pele
felicidade é o caminho entre as pedras
o olhar pluvioso
os re_versos pendurados nas paredes
das retinas
fustigados
*
ao rés da pele
felicidade é o caminho entre as pedras
o olhar pluvioso
os re_versos pendurados nas paredes
das retinas
fustigados
*
quarta-feira, 5 de maio de 2010
calma
líria porto
nenhuma outr'hora nenhuma aurora
foi lavanda tão lilás
tão derramada
a lua caminhava de pantufas
*
nenhuma outr'hora nenhuma aurora
foi lavanda tão lilás
tão derramada
a lua caminhava de pantufas
*
pecadores
líria porto
seu jeito ardoroso
inquieto arruaceiro
a banhar meu corpo
molhar-me o pescoço
cabelos ombros dorso
glúteos coxas pés
não sobra um pedaço
depois meu regaço
recolhe seu sonho
seu adormecer
*
seu jeito ardoroso
inquieto arruaceiro
a banhar meu corpo
molhar-me o pescoço
cabelos ombros dorso
glúteos coxas pés
não sobra um pedaço
depois meu regaço
recolhe seu sonho
seu adormecer
*
madre
líria porto
a vida nada lhe deve
recebeu o seu quinhão
teve sol força sementes
pode plantar e (a)colher
*
a vida nada lhe deve
recebeu o seu quinhão
teve sol força sementes
pode plantar e (a)colher
*
terça-feira, 4 de maio de 2010
na semente mora a floresta
líria porto
velha árvore
assisto à minha sombra
a conversa animada das filhas
e o revoar entre as galhas
de maria luiza - minha
maritaquinha
*
velha árvore
assisto à minha sombra
a conversa animada das filhas
e o revoar entre as galhas
de maria luiza - minha
maritaquinha
*
não choro seu corpo
líria porto
fabiano nasceu morto
que sina desse menino
nem bem podia ter asas
já era anjo
subiu ligeiro pro céu
voou do ventre da mãe
foi tomar conta do espaço
olhar de lá por nós outros
*
fabiano nasceu morto
que sina desse menino
nem bem podia ter asas
já era anjo
subiu ligeiro pro céu
voou do ventre da mãe
foi tomar conta do espaço
olhar de lá por nós outros
*
segunda-feira, 3 de maio de 2010
in_continente
líria porto
os rios saídos dos olhos
são rios sem peixes
nascidos no amar
amor meu amor não me deixes
sem ti sou areia e o vento
é voraz
o sal da saudade é amargo
é um fardo de morte morrida
ou matada
*
os rios saídos dos olhos
são rios sem peixes
nascidos no amar
amor meu amor não me deixes
sem ti sou areia e o vento
é voraz
o sal da saudade é amargo
é um fardo de morte morrida
ou matada
*
domingo, 2 de maio de 2010
pré-munição (quem tem pena de passarinho - ed. periópolis)
líria porto
recanto do galo
eu falo eu falo
o rifle apontado
gargalo da noite
um galo outro galo
e outro e outro
colar de disparos
na boca de fumo
acordo assustada
a lua apagada
coitada coitada
vai pôr pé na estrada
a vida é uma sorte
e a morte não sabe
por onde caminha
*
recanto do galo
eu falo eu falo
o rifle apontado
gargalo da noite
um galo outro galo
e outro e outro
colar de disparos
na boca de fumo
acordo assustada
a lua apagada
coitada coitada
vai pôr pé na estrada
a vida é uma sorte
e a morte não sabe
por onde caminha
*
sobrevivente
líria porto
a poesia voltou
espia-me por uma fresta
o céu está azul
o sol redondo
a vida dá o tom
mãos à máxima
*
a poesia voltou
espia-me por uma fresta
o céu está azul
o sol redondo
a vida dá o tom
mãos à máxima
*
Assinar:
Postagens (Atom)
tanto mar
- affonso romano de santanna
- alice ruiz
- balaio porreta - moacy cirne
- cosmunicando
- doce de lira
- escritoras suicídas
- flávio corrêa de mello
- germina literatura
- josé saramago
- jura em cy bemol
- metamorfraseando
- namibiano - angola
- nina rizzi
- notas capitais
- olivrão - aroeira
- per tempus / mara faturi
- putas resolutas
- ragi moana
- rômulo romério
- saciedade dos poetas vivos - líria porto
- sede em frente ao mar
- toca da serpente - líria porto
dedicatória
nus descampados (im)puros
fiamos o plenilúnio
(líria porto)
*
fiamos o plenilúnio
(líria porto)
*
quem tem pena de passarinho
é passarinho
(líria porto)
Arquivo do blog
-
▼
2010
(858)
-
▼
maio
(86)
- incompletude
- resta_bele_cimento
- pudores
- cicuta-me
- vinagre
- neblina
- bis_tu_ris
- sol_teira
- (publicado no livro asa de passarinho - ed. lê) - ...
- incógnito
- bom pra cachorro
- momentos
- na realidade
- aguda
- em vão
- (publicado no livro olho nu - ed. patuá) na calada...
- pua
- segundo stevenson
- ilações
- marginal
- tramas
- depois
- (publicado em cadela prateada - ed. penalux) - pistas
- de fazer dó e ré
- reflexão
- segundo seu geraldo
- desen/canto
- louca
- barroco e velha piá
- (publicado no livro olho nu - ed. patuá) dissimulação
- ex_tinto
- (publicado no livro olho nu - ed. patuá) fluidos
- tentativas
- pancada
- vaga/bunda
- definho
- simplesmente
- ladainha
- sur_presa
- abissal
- nuança
- majoritários
- amar é fogo
- marés d'alma
- (publicado em cadela prateada - ed. penalux) - síl...
- um ano
- sofrimentos
- dominante
- desvario
- mato é mato
- (publicado no livro asa de passarinho - ed. lê) - ...
- (publicado no livro olho nu - ed. patuá) confessio...
- arquivo
- (r)evolução dos bichos
- o visitante (quem tem pena de passarinho - ed. per...
- até certo ponto
- carnívora
- (publicado no livro garimpo - editora lê) - traumas
- sem fronteiras
- ascendência
- (publicado no livro olho nu - ed. patuá) herança
- não chores meu bem
- triângulo
- (para o livro sem pecado não tem salvação) folhetim
- um dia não vai funcionar
- (publicado no livro olho nu - ed. patuá) casadoira
- os olhos da coruja
- (publicado no livro olho nu - ed. patuá) de transf...
- (publicado no livro olho nu - ed. patuá) tolerância
- revertério
- po_mar
- coletânea
- urubu
- assobio
- andorinha
- paparazzi
- latifúndio itabirano
- calma
- pecadores
- madre
- na semente mora a floresta
- não choro seu corpo
- adolescentes
- in_continente
- pré-munição (quem tem pena de passarinho - ed. per...
- sobrevivente
-
▼
maio
(86)