banhei seu corpo
troquei-lhe as fraldas
e ao vê-lo engravatado
do lado desses doutores
seguro o riso
:
ele tem coceiras
cócegas
pequenas pintas na bunda
pavor de barata e aranha
e medo do escuro
quem nascer no ano da minha morte vai ter uma sorte e um azar
sorte por ocupar o lugar que deixo e me dá muito prazer
e azar em não partilhar comigo o ar que respira
este defeito nos olhos as bordas ficam difusas
confundo o real com o sonho e quando observo o mundo
vejo bolas de cristal – faço adivinhações
:
tenho lembranças futuras
mas nada sei do que fui
o sol veio de um lado a lua veio de outro e lá no meio do céu os dois se esbarram e brigam ela branca ele amarelo logo no primeiro encontro : foi um pandemônio
diz-me
espera
e quando eu me volto
ela
incrédula
fala-me quase
sem fôlego
:
bom te saber por perto
é triste o destino das pedras
passamos séculos e séculos
sem que se cumpram
as promessas
as pessoas que ele amava
não eram lá essas coisas
mas quando escolheu a mim
que me havia em grande conta
vesti-me da carapuça
tratei de ser mais modesta
conquanto tão pequenina
nada soubesse da vida
discernia o que era belo
muito mais que as outras primas
a mãe previa –– a menina
não se conforma com pouco
escolhe cor cheiro
brilho
:
feita mulher
é artista