o esmeril come o ferro
o ferro –– macho –– resiste
chega a soltar faísca
e geme
:
fica afiado o espeto
perfeito para o churrasco
a queima da carna
a brasa
a pressa do rio
vontade de (a)mar
seguir aos tropeços
livrar-se das margens
vagar noutras plagas
de sal lambuzar-se
sumir de si mesmo
deixar-se beber
naufragar
minha cabana de taipa
não tem tranca não ter cerca
tão somente a vira-lata
(ótima companhia)
e eu
a mansão do magnata
tem muralha tem guarita
câmeras de segurança
quatro pitbuls
dois buldogues
carros blindados
motoristas
guarda armado até os dentes
e gente trêmula
o corpo –– qual gaiola –– trancafia
toda a nossa dor e sofrimento
só o pensamento voa livre
e não há polícia nem juízes
que o condenem ao cárcere
ao exílio
:
nosso pensamento é quem governa
nosso pensamento é quem preside
o son(h)o vem de pantufas
passa ferrolho nas pálpebras
caminha olhos adentro
percorre nossos lugares
de montanhas tão disformes
repletas de espinheiros
:
o córrego
(massa cinzenta)
e o dialeto
(criptografado)
enfrento o medo olho-o no fundo do olho até lhe faço careta : chego a tremer a sentir as pernas bambas mas fico firme não deixo que me domine que me esmague a cabeça